13 de setembro de 1966: é criado o FGTS, substituindo estabilidade do emprego

Imposto pelo regime militar, fundo surgia como alternativa a normas trabalhistas de garantia.

Foto: Joédson Alves/Agência Brasil

Guilherme Daroit

Hoje criticado por empresários e pelo mercado financeiro pelo custo trabalhista e pela imobilização de recursos, o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) nascia, em 1966, como instrumento de flexibilização celebrado pelo capital. A novidade, afinal, surgia como alternativa a duas normas trabalhistas constantes da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que davam estabilidade no emprego após dez anos de vínculo e exigiam o pagamento de multa para dispensas imotivadas.

Alçados ao poder pelo golpe de 1964, os militares viam na criação do fundo um dos pilares das suas reformas econômicas de ajuste, denunciadas pela oposição como forma de atender aos desejos das empresas e de investidores estrangeiros. À época, a estabilidade decenal era vista como proibitiva pelos empregadores, que em grande parte dos casos dispensavam os trabalhadores antes que atingissem os dez anos no emprego – a estimativa é de que menos de 20% dos trabalhadores eram estáveis. Além disso, a multa para os dispensados de um salário por ano trabalhado era criticada como um custo trabalhista elevado demais.

Dessa forma, arquitetado pelo ministro do Planejamento da ditadura, Roberto Campos, o projeto do FGTS seria apresentado pelo general Castello Branco ao Congresso em agosto de 1966, período no qual o Legislativo ainda possuía voz. Rejeitada pela oposição e sem apoio inclusive entre parte dos deputados governistas, a proposta nunca seria aprovada, mesmo com uma grande campanha de defesa dos militares que dizia que o Fundo criaria a real estabilidade, evitando que carreiras fossem interrompidas antes dos dez anos de empresa. Uma votação até chegaria a ser realizada na Câmara, mas sem o quórum necessário, tornando-se inválida.

Anúncio da Ditadura defendendo criação do FGTS Fonte: Agência Senado

Sem o aval do Congresso, Castello Branco usaria, então, a sua força de ditador. Por meio de ferramenta criada no Ato Institucional nº. 2, que promulgava automaticamente projeto de lei do Planalto que passasse mais de um mês sem apreciação no Legislativo, o presidente sancionaria a Lei 5.107 em 13 de setembro, criando o FGTS. A nova norma dava o direito aos trabalhadores contratados a partir dali de optarem pelo novo regime de contratação, abrindo mão da estabilidade decenal em troca do depósito de 8% de seus vencimentos em conta no FGTS, valor que equivaleria assim, ao fim do ano, a um salário.

Embora permitisse a opção do empregado pela estabilidade decenal ou pelo FGTS, a oposição denunciaria que a lei faria com que, na prática, as empresas só contratassem quem aderisse às novas regras, vigentes a partir de 1º de janeiro do ano seguinte. De fato, apenas três anos depois, em 1970, já era cerca de 70% o contingente de empregados optantes pelo FGTS.

A alternativa só seria encerrada em 1988, com a Constituição Cidadã. No novo regramento, a estabilidade decenal era enfim abolida, transformando todos os empregados celetistas em optantes pelo FGTS a partir de então. No ano seguinte, seria criado também o Conselho Curador, que administra as decisões políticas do fundo, composto por uma comissão tripartite entre empresários, trabalhadores e governo, representados por confederações, centrais sindicais e ministérios.

Além do fim da estabilidade, a criação do fundo também tinha como objetivo financiar os programas de moradia. A gestão das contas ficaria a cargo do Banco Nacional de Habitação (BNH), que utilizaria os recursos para o financiamento da construção e da aquisição de residências. A compra da casa própria seria um dos únicos usos permitidos para os recursos, que, em geral, só seriam acessados pelo trabalhador no caso de dispensa ou de aposentadoria.

Ao longo dos anos, o FGTS se consolidaria tanto quanto garantia trabalhista quanto no papel de financiador dos negócios imobiliários. Até 1979, o fundo financiaria em torno de 1,5 milhão de residências. Em 1986, com a falência do BNH, a gestão do fundo seria transferida à Caixa Econômica Federal, que incorporaria o antigo banco. As contas dos trabalhadores, até então dispersas por dezenas de instituições financeiras, seriam finalmente centralizadas em 1990 na Caixa, que segue agente única do fundo até hoje. Apenas em 2024, foram 605 mil unidades habitacionais financiadas pelo FGTS.

Nos últimos anos, várias mudanças também afetariam o fundo. Em 2019, seria criado o saque-aniversário, permitindo que o saldo dos trabalhadores fosse retirado em partes anualmente para uso livre. Em 2024, o Supremo Tribunal Federal decidiria que a remuneração das contas, atualmente padronizada em 3% ao ano mais correção monetária, deveria pelo menos igualar a inflação, situação que já vinha acontecendo desde 2016, primeira vez em que parte do lucro do fundo seria repartido com os trabalhadores.

Guilherme Daroit é jornalista e bacharel em Ciências Econômicas, formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Atualmente, é diretor do Sindicato dos Bancários de Porto Alegre e Região

 

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