O novo texto aprovado pela Câmara Federal, em 14 de abril de 2020, mantém pontos críticos apontados pelo movimento sindical, fortemente negativos para os trabalhadores. Outros dispositivos do texto original da MP 905 foram rejeitados na votação pelos deputados, como reação à pressão das Centrais Sindicais. Abaixo, destacamos os principais temas negativos, mas lembramos que outros pontos que lesam os trabalhadores e trabalhadoras estão presentes no relatório. A proposta se configura como uma nova reforma trabalhista, realizada através de uma medida provisória, sem o debate tripartite necessário, conforme convenções internacionais do qual o Brasil é signatário.
1) Contribuição previdenciária dos beneficiários do seguro desemprego: apesar das alterações, a medida que penaliza os mais vulneráveis no mercado de trabalho foi mantida. No novo texto, a contribuição passa a ser opcional para o trabalhador, que deverá escolher contribuir ou não no momento do requerimento do benefício, não mais no momento da contratação ou em 90 dias da aprovação da MP como anteriormente. O novo texto manteve a alíquota de contribuição em 7,5%. Além de penalizar os trabalhadores com essa dedução, a arrecadação não pode ser considerada como recurso para cobrir a desoneração concedia aos empregados, uma vez que ela é recolhida aos cofres públicos para financiar benefícios previdenciários futuros do contribuinte.
2) Redução da remuneração indireta através da redução da multa rescisória de 40% para 20%: a MP e o relatório tratam esses valores como “tributos” ao supostamente “desonerar” o empregador. No entanto, esse percentual não é um tributo, é salário diferido no tempo. Essas medidas reduzem a remuneração efetiva do trabalhador e o desprotegem no período que seu contrato de trabalho termina.
3) Jornada dos bancários: garante a jornada de 6 horas diárias e 30 semanais exclusivamente para a função de caixa e fixa em 40% o valor mínimo da gratificação de função para os empregados que tiverem jornada diária de oito horas (para a 7ª e 8ª horas trabalhadas). Autoriza o trabalho aos sábados, domingos e feriados de forma permanente nas seguintes atividades: processo de automação bancária; teleatendimento; telemarketing; Serviço de Atendimento ao Consumidor – SAC e ouvidoria; serviços por canais digitais, incluídos o suporte a estes canais; áreas de tecnologia, segurança e administração patrimonial, atividades bancárias de caráter excepcional ou eventual e atividades bancárias em áreas de funcionamento diferenciado, como feiras, exposições, shopping centers, aeroportos e terminais de ônibus, trem e metrô.
4) Dupla visita: passa a ser obrigatória (artigo 627) nos primeiros 180 dias de vigência de novas leis, regulamentos ou instruções normativas; nos primeiros 180 dias de funcionamento de novos estabelecimentos; na fiscalização de micro e pequenas empresas, 2 2 pequenas cooperativas e estabelecimentos com até 20 trabalhadores (sem prazo); em caso de infrações leves; e em visitas de instrução previamente agendadas. Para que seja possível autuar uma infração, a segunda visita só poderá ser feita após 90 dias da primeira, e o critério de dupla visita se refere a cada item inspecionado. Caso essas condições não sejam cumpridas, o auto infracional será nulo (§4º). Entre as exceções à dupla visita (§2º), a MP listava itens como não registro em carteira, atraso de salário e de FGTS, reincidência e fraude, trabalho análogo ao escravo, entre outros. O relator incluiu nessa lista o descumprimento de interdição ou embargo e especificou que, acidente de trabalho fatal apurado por meio de procedimento fiscal de análise de acidente, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas às causas do acidente.
5) Fiscalização preventiva: o relator também manteve a inclusão do artigo 627-B na CLT, que trata de projetos especiais de fiscalização setorial para prevenção de acidentes de trabalho, doenças ocupacionais e irregularidades trabalhistas. Nessas ações, se for constatada irregularidade, não poderão ser emitidos autos de infração, muito embora as ações sejam motivadas por “irregularidades reiteradas ou elevados níveis de acidentalidade ou adoecimentos ocupacionais em determinado setor econômico ou região geográfica” (§1º). Isso dá margem à perda de efetividade na fiscalização mesmo em situações de conhecida incidência de acidentes e/ou contumaz violação de direitos já que essa visita é preventiva para os empregadores não receberem multas e não para prevenção e segurança dos trabalhadores.
6) O texto aprovado na Câmara amplia o escopo de contratação da carteira verde amarela: (1) eleva de 20% para 25% o percentual de trabalhadores que podem ser contratados pela modalidade de carteira verde e amarela (§ 1º do artigo 2º); (2) Inclui trabalhadores acima de 55 anos que estejam a mais de 12 meses desempregados; (3) manteve a exclusão do conceito de primeiro emprego os vínculos de menor aprendiz, contrato de experiência, trabalho intermitente e trabalho avulso); (4) autoriza a contratação do trabalhador do campo nessa modalidade, exceto no contrato de safra (parágrafo único do artigo 17); (5) permite também que haja mais de uma contratação consecutiva na modalidade carteira verde e amarela quando o contrato anterior não tiver ultrapassado seis meses de duração (§ 5º do artigo 2º). A referência para contratação adicional de trabalhadores na modalidade de CTVA, foi alterada, adotando-se o número médio de empregados no trimestre anterior, e não mais apenas a média de empregados entre janeiro e outubro de 2019. Com isto qualquer nova contratação após o período de crise poderá ser feito na modalidade CTVA, desde que com jovens ou adultos grisalhos conforme é requerido e até o limite de 25% do total de empregados.
7) Desoneração da folha de pagamento: o empregador é desonerado da contribuição para o Regime Geral de Previdência Social, da contribuição para o Sistema S (Sesi, Senai, Sesc, Senac, Senar, Senat, Sescoop e Sebrae) e da contribuição para o Incra. Ainda que a MP tenha imposto a contribuição previdenciária ao beneficiário do seguro-desemprego como medida compensatória, essa fonte não deveria ser considerada substituta da desoneração da folha, já que cria compromisso de despesas com benefícios futuros para o segurado. Ou seja, a falta de adequada compensação pela perda de arrecadação faz com 3 3 que o carteira verde e amarela resulte em renúncia fiscal expressiva, que onerará principalmente a Previdência Social.
8) Prêmios: na lei da PLR (Programa de Lucros e Resultados), a MP regulamenta as condições para pagamento de prêmios, sem incidência de encargos e tributos, desde que vinculados a desempenho e em no máximo quatro vezes por ano e uma vez por trimestre. A negociação da PLR passa a ser realizada através de comissão de negociação paritária, com representantes de patrões e de empregados, que uma vez composta, notificará o sindicato para que indique representante no prazo máximo de 7 dias, findo o qual a comissão poderá iniciar e concluir suas tratativas.
9) Negociado sobre jurisprudência: a reforma trabalhista adotou o princípio da prevalência do negociado sobre o legislado como norteador das relações de trabalho. O texto aprovado na Câmara aprofunda a aplicação desse princípio, alterando o artigo 8º da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) de modo que convenções e acordos prevaleçam também sobre súmulas e enunciados de jurisprudência dos Tribunais do Trabalho. Ou seja, o princípio do negociado sobre o legislado é colocado acima da própria interpretação das leis trabalhistas e da Justiça do Trabalho. Apesar de aprofundar esse mecanismo, o negociado livremente entre as partes não pode alterar as regras definidas pela MP para a contratação na modalidade carteira verde e amarela. Foram suprimidos alguns pontos relevantes para proteger os trabalhadores: a) No CTVA, a substituição do adicional de periculosidade por um seguro privado; b) No CTVA, a exigência de acordo coletivo ou convenção para a compensação de horas ao invés de por acordo individual; c) A redução da contribuição ao FGTS, que é mantida em 8%; d) A extensão irrestrita do trabalho aos domingos e feriado; e) A eliminação do registro profissional, que passa a ser atribuída aos conselhos profissionais e subsidiariamente ao Ministério da Economia.
Fonte: Dieese
Data original da publicação: 14/04/2020