Conflitos coletivos de trabalho: implicações institucionais e evidências empíricas sobre a greve dos bombeiros militares do Estado do Rio de Janeiro

Sayonara Grillo Coutinho Leonardo da Silva
Thiago Patrício Gondim

Fonte: Revista da Faculdade Mineira de Direito, Belo Horizonte, v. 20, n. 39, out./abr. 2017.

Resumo: A greve pode ser considerada um modo de exteriorização de conflitos laborais, sendo utilizada como instrumento de protesto, denúncia e pressão. Como fato social é recebida pelo direito por meio de processos de absorção em fatos jurídicos, sob diferenciadas perspectivas, tais como de criminalização, de proibição, de reconhecimento, de garantia ou promoção. No Brasil, embora a Constituição acolha a greve como direito, não se reconhece tal direito aos membros das forças armadas e funcionários públicos classificados como militares. Não obstante, como as greves de bombeiros e policiais tem sido recorrentes no Brasil, o artigo reflete sobre os modos pelos quais os conflitos coletivos de trabalhadores subtraídos dos direitos de greve e de sindicalização se manifestam, como são construídos e denominados pelos próprios integrantes, quais formas associativas e atores coletivos surgem para representá-los e que formas de luta são desenvolvidas. Para tanto, examina o movimento paredista dos bombeiros militares do Estado do Rio de Janeiro, ocorrido em 2011, cujas reivindicações principais giravam em torno de melhores condições laborais e de remuneração, com ênfase nas dinâmicas institucionais e respostas dadas pelo sistema jurídico brasileiro, a partir de uma perspectiva interdisciplinar e análise de fontes primárias e secundárias, em especial de documentos produzidos pelas associações de bombeiros e instâncias administrativas, legislativas e judiciais.

Sumário: 1. Introdução | 2. Greve e Direito | 2.1. A greve como fenômeno social e seus modelos normativos | 2.2. A regulação normativa sob a ótica da proibição: a greve dos bombeiros militares no sistema jurídico brasileiro | 3. Conflitos coletivos de trabalho para além do Direito do Trabalho: o estudo de caso do “movimento” dos bombeiros do Estado do Rio de Janeiro | 4. Reflexões sobre os limites e as formas institucionais de equacionamento do conflito | 5. Observações finais | 6. Referências | 6.1 Referências bibliográficas | 6.2 Fontes primárias (documentos, sites, processos, leis etc.)

1. Introdução

A greve pode ser considerada uma forma de exteriorização dos conflitos coletivos de trabalho, ao lado de inúmeros outros mecanismos de pressão, laboral e política. Como fenômeno social, a greve é recebida pelo sistema jurídico por meio de diferenciados processos de absorção dos conflitos, que os juristas tendem a classificar como modelos normativos de regulação, transformando-a em fato jurídico por meio de diferenciadas perspectivas de criminalização, de proibição, de reconhecimento, de garantia ou promoção.

Em sistemas jurídicos que criminalizam a greve, os fenômenos coletivos de luta por melhores condições de trabalho podem ser recebidos de modo dissonante, sendo concebidos de forma diversa pelos atores sociais e institucionais em conflito. A polissemia conceitual se traduz em uma disputa de sentidos, definidora dos caminhos adotados pelas instituições e pelos protagonistas para legitimá-los ou deslegitima-los. No Brasil, diante da vedação constitucional à deflagração de greves por todos os integrantes de categorias definidas como militares, as paralisações realizadas por bombeiros militares, controladores de voo e policiais têm sido denominadas pelos participantes, como “movimento”, e/ou como “motins” pelas autoridades administrativas e de justiça militar, em enquadramento conceitual que orienta o modo de equacionamento dos conflitos pelo Estado.

O objetivo deste artigo é estudar o movimento dos bombeiros militares do Rio de Janeiro e suas implicações institucionais. Busca compreender os diversos modos de institucionalização dos conflitos coletivos e mecanismos de equacionamento utilizados quando os tradicionais modos de absorção pela via do direito coletivo do trabalho (judicialização pela via dos dissídios coletivos ou ações civis públicas) estão indisponíveis para trabalhadores que não tem reconhecidos os direitos de greve e de liberdade sindical. Em especial se volta para a análise de um caso específico, a greve ocorrida em 2011, que culminou com a ocupação da sede do corpo de bombeiros na cidade do Rio de Janeiro e reflete sobre os modos pelos quais os conflitos coletivos de trabalhadores subtraídos dos direitos de greve e de sindicalização se manifestam, como são construídos e denominados pelos próprios integrantes, quais formas associativas e atores coletivos surgem para representá-los e que formas de luta são desenvolvidas.

Para tanto, a partir da sociologia do direito e do direito do trabalho, examina o caso-referência, por meio da análise de fontes primárias e secundárias relacionadas a esse movimento, selecionadas dentre as notícias publicadas na mídia e em sítios eletrônicos associados aos bombeiros, entrevistas semiestruturadas com participantes do movimento paredista, levantamento de dados junto à Associação dos Bombeiros Militares do Estado do Rio de Janeiro (ABMERJ), documentos referentes às ações penais militares n.º 0171449-38.2011.8.19.0001, n.º 0177337-85.2011.8.19.0001 e n.º 0177395-88.2011.8.19.0001 e as leis de anistia administrativa n.º 5.997/2011 e n.º 6.499/2013 e de anistia criminal n.º 12.191/2010, n.º 12.505/2011 e n.º 12.848/2013.

Clique aqui para continuar a leitura deste artigo no sita da Revista Mineira de Direito

Sayonara Grillo Coutinho Leonardo da Silva é doutora e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.

Thiago Patrício Gondim é mestrando pela Universidade Federal do Rio de Janeiro Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *