Tempo de urgência e estratégias preventivas de saúde dos trabalhadores

Leo Vinicius Maia Liberato

Fonte: Revista de Ciências Sociais: Política & Trabalho, João Pessoa, n. 45, jul./dez. 2016.

Resumo: O objetivo principal deste artigo é problematizar estratégias comunicativas de prevenção à saúde dos trabalhadores que se baseiam em uma racionalidade econômica da prevenção. A hipótese defendida é de que tais estratégias, a despeito de quaisquer outros motivos, tendem a ser ineficazes diante de um quadro de dissonância temporal, isto é, no qual o regime de urgência da atividade de trabalho impede a projeção temporal da saúde dos trabalhadores. Essa problematização é realizada com base na experiência do autor como bancário e cipeiro, e na literatura que versa sobre a nova temporalidade do mundo contemporâneo – marcada pela urgência, imediatismo e curtoprazismo –, que domina também as atividades econômicas. Por fim, conclui-se que, diante dessa nova temporalidade de urgência normalizada, torna-se ainda mais pertinente a adoção da perspectiva e do conceito de saúde ligados ao poder de agir dos trabalhadores, em detrimento do conceito de saúde como ausência de doença.

Sumário: Introdução | Urgência na atividade bancária | Uma nova temporalidade | A dupla fuga trabalho-capital | Hegemonia do valor acionário e curtoprazismo | Regime de urgência | Conceitos de urgência | Aspectos negativos e positivos da urgência no trabalho | Urgência como forma de controle e poder | Regime de urgência e práticas de prevenção | Desafios à saúde do trabalhador em tempos de urgência | Referências

Introdução

A questão que procurarmos desenvolver é a da possibilidade de conciliar saúde e objetivos econômicos quando a atividade tem como horizonte o próprio presente, quando a eficiência econômica é medida em curto prazo e quando os benefícios econômicos advindos de práticas coerentes com a manutenção da saúde dos trabalhadores só são percebidos no longo prazo. O trecho abaixo, extraído de um documento da Organização Mundial de Saúde, serve-nos como exemplo do que pretendemos questionar: uma estratégia comunicativa na qual converge o interesse econômico que dirige as empresas e a manutenção da saúde dos trabalhadores.

Vários dados demonstram que, a longo prazo, as empresas que promovem e protegem a saúde dos trabalhadores estão entre as mais bem-sucedidas e competitivas, e também desfrutam de melhores taxas de retenção de funcionários. Alguns fatores que os empregadores necessitam considerar são: a) Os custos de prevenção versus os custos resultantes de acidentes; b) Consequências financeiras das violações jurídicas de leis e normas de segurança e saúde no trabalho; c) Saúde dos trabalhadores como importante patrimônio da empresa. A adesão a esses princípios evita afastamentos e incapacidades para o trabalho, minimiza os custos com saúde e os custos associados com a alta rotatividade tais como treinamento, e aumenta a produtividade a longo prazo bem como a qualidade dos produtos e serviços (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 2010, p. 4, grifos nossos).

Nosso intuito não é contestar ou endossar que o investimento e o cuidado com a saúde e a segurança dos trabalhadores por parte da empresa reverta em benefícios econômicos e produtivos para ela. A questão a ser discutida é por que as estratégias comunicativas que visam conciliar resultados econômicos (“produtivos”) e a prevenção de agravos à saúde tendem a ser ineficazes contemporaneamente. Para articular uma resposta nos remeteremos às características temporais do econômico e do social que têm prevalecido desde algumas décadas.

Inicialmente, apresentaremos aspectos concernentes ao tema, a título de ilustração, a partir da experiência própria como trabalhador numa agência bancária. Em seguida, abordaremos nossa relação contemporânea com o tempo, buscando a gênese dessa relação no último grande ciclo de lutas dos trabalhadores e na financeirização e mundialização econômica. Essa nova relação com o tempo dá forma a uma normalização da urgência, que será conceituada por nós para, posteriormente, apontarmos, a partir da literatura que versa sobre o tema, como ela se institui como forma de controle e instrumento de poder. Por fim, procuraremos apontar que esse regime de urgência leva à necessidade de reforçar a visão e o conceito de saúde ligada ao poder de agir dos trabalhadores.

Clique aqui para continuar a leitura deste artigo no site da Revista de Ciências Sociais: Política & Trabalho

Leo Vinicius Maia Liberato tem doutorado em Sociologia Política pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), pós-doutorado no Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo (USP), Brasil.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *