O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria na segunda-feira (22/11) para entender que não há vedação eleitoral quanto à implementação da Renda Básica de Cidadania em 2022, ano de eleições. A Corte também ressaltou que o pagamento do benefício não prejudica o teto de gastos, mas que os valores devem observar o previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A discussão ocorreu no Mandado de Injunção (MI) 7300.
No entanto, o Supremo não detalha como a Renda Básica de Cidadania deve ser instituída, nem como os valores a serem recebidos pela camada de pobreza extrema no Brasil. Nove dos dez ministros já acompanharam o relator, ministro Gilmar Mendes, que rejeitou os embargos interpostos tanto pela União quanto por Alexandre da Silva Portuguez, representado pela Defensoria Pública da União.
Acompanharam Gilmar os ministros Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Luiz Fux, Roberto Barroso e Rosa Weber.
O julgamento está em plenário virtual até às 23h59, até lá, algum ministro pode pedir destaque para o plenário físico, e o julgamento dos embargos pode ser reiniciado.
Relação com o Auxílio Brasil
Com esse resultado, especialistas consultados pelo JOTA não descartam a possibilidade do governo federal aproveitar essa determinação do Supremo para ampliar o valor do Auxílio Brasil sem esbarrar nas limitações da lei eleitoral, que impediria o aumento desse tipo de gasto a partir de 1º de janeiro de 2022.
Todavia, vale lembrar que o julgamento do STF, de abril de 2021, decidiu que o governo federal foi omisso em relação à regulamentação da Lei 10.835/2004, que institui a Renda Básica de Cidadania e, a decisão não tem a ver com os programas sociais vigentes. Porém, a decisão também não exclui a possibilidade da renda básica ser instituída via programas de transferência social já existentes.
Embargos
Em abril de 2021, o Supremo entendeu pela omissão do Poder Executivo Federal em fixar o valor do benefício instituído pela Lei 10.835/2004, que criou a Renda Básica de Cidadania. A União embargou a decisão afirmando que o acórdão estava omisso em relação ao artigo 73, § 10, da Lei de Eleições (Lei 9.504/1997) e que a implementação da Renda Básica poderia esbarrar no teto de gastos. Assim, ao cumprir a decisão judicial, o presidente Jair Bolsonaro poderia ser enquadrado no crime de responsabilidade.
O relator, ministro Gilmar Mendes, refutou a omissão do acórdão e afirmou que a Constituição considera como “crime de responsabilidade o descumprimento de decisões judiciais, apresentando-se como verdadeiro contrassenso a interpretação que levaria à impossibilidade de o Poder Judiciário proferir decisões com consequências econômicas, em ano eleitoral, com a finalidade de cumprir os mandamentos da própria Constituição Federal”.
Assim, para o relator, não há vedação eleitoral em implementar a Renda Básica de cidadania por se tratar de estrito cumprimento de decisão judicial que impõe o alargamento de valores, de continuidade e/ou fusão de programas sociais já estabelecidos em leis, além de restar, evidentemente, ausente o abuso de poder político e/ou econômico.
“No caso em apreço, a colmatação da omissão inconstitucional determinada pelo Poder Judiciário, longe de se enquadrar em oportunismo eleitoreiro ou em promoção de uma eventual candidatura, apenas concretiza um dos objetivos da República Federativa do Brasil, previsto no art. 3º, inciso III, que é ‘erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais’”, escreveu em seu voto.
Quanto ao teto de gastos, o ministro sustentou que as consequências fiscais da decisão foram detidamente analisadas no acórdão embargado, tendo inclusive prevalecido o voto divergente que incorporou razões de ordem econômico-financeira orçamentárias apresentadas pela União.
“Desse modo, o disposto no art. 107 do ADCT não pode, nesse momento processual, ser utilizado como escudo para o descumprimento de decisões judiciais, circunstância que, inclusive, foi considerada no voto condutor do acórdão recorrido, o qual, ao divergir do relator, determinou que o valor do benefício deveria ser fixado pelo Poder Executivo, ‘no exercício fiscal seguinte ao da conclusão do julgamento do mérito (2022)’, concedendo um prazo para que os governantes pudessem se organizar’”, afirmou.
Já a DPU embargou a decisão sob o argumento que os parâmetros atualmente empregados na definição do conceito de vulnerabilidade socioeconômica (pobreza e pobreza extrema previstos no Decreto 5.209/2004) estariam defasados, por não mais espelharem a realidade socioeconômica brasileira. O relator lembrou que o acórdão reconhece a proteção insuficiente quanto ao combate à pobreza e à extrema pobreza, no entanto, é preciso levar em consideração a reserva do possível.
Fonte: Jota
Texto: Flávia Maia
Data original da publicação: 22/11/2021