Segregação ocupacional no mercado de trabalho segundo cor e nível de escolaridade no Brasil contemporâneo

Rosana Ribeiro
Guilherme Silva Araújo

Fonte: Nova Economia: Revista do Departamento de Ciências Econômicas da UFMG, Belo Horizonte, v. 26, n. 1, p. 147-177, 2016.

Resumo: O propósito deste artigo é analisar a segregação ocupacional segundo cor e nível de escolaridade no período de 2002 a 2012. A segregação ocupacional é mensurada por meio dos índices. Esses índices revelam maior segregação ocupacional entre brancas ou negras do que entre negros ou brancos, apesar de que esse diferencial se reduziu no intervalo temporal. Contudo, os patamares de segregação ocupacional entre brancos ou negros que têm 15 anos ou mais de estudo se elevaram, ao passo que, entre negras ou brancas, se reduziram. Vale ressaltar que a maioria das pessoas que exerce cargo de dirigentes são homens. Ou seja, esse resultado é no mínimo preocupante. Ademais, o patamar de segregação ocupacional entre pessoas do sexo masculino – brancos ou negros com maior nível de escolaridade – não se reduz, embora a proporção de homens negros mais escolarizados se elevou. A adoção de ações afirmativas no mercado de trabalho brasileiro, bem como a melhora da qualidade da educação, poderia contribuir para mitigar essa segregação ocupacional.

Sumário: 1 Introdução | 2 Discriminação ou segregação no mercado de trabalho: ponderações teóricas | 3 Literatura internacional e nacional sobre segregação no mercado de trabalho | 4 Índices de segregação ocupacional | 4.1 Índice de Dissimilaridade de Duncan & Duncan (D) | 4.2 Índice de Dissimilaridade Padronizado pelo Tamanho (Ds) | 4.3 Índice de segregação Karmel-MacLachlan (KM) | 5 Segregação ocupacional segundo cor no mercado de trabalho brasileiro, no período 2002 a 2012 | 5.1 Segregação ocupacional entre homens e mulheres segundo cor e faixas de anos de estudo | 5.2 Índice D estimado para homens segundo cor e faixas de anos de estudo | 5.3 Índice Ds estimado para homens segundo cor e faixas de anos de estudo | 5.4 Índice KM estimado para homens segundo cor e faixas de anos de estudo | 5.5 Índice D estimado para mulheres segundo cor e faixas de anos de estudo | 5.6 Índice Ds estimado para mulheres segundo cor e faixa de anos de estudo | 5.7 Índice KM estimado para mulheres segundo cor e faixas de anos de estudo | 6 Notas conclusivas | Referências

1 Introdução

O termo “segregação” no mercado de trabalho significa uma assimetria na contratação de trabalhadores pelas empresas, baseada em certas características, como sexo, cor, nacionalidade e qualificação profissional (Bahia et al., 2009). Consequentemente, isso induz a uma tendência de concentração dos trabalhadores em segmentos distintos, tendendo à formação de setores e guetos ocupacionais.

Em geral, os estudos nessa temática se concentram na análise da segregação por grupos ocupacionais (dirigentes, técnicos de nível médio, etc.). O título ocupacional se mostra um bom indicador do status socioeconômico dos trabalhadores; no entanto, outras informações, como nível de renda e de escolaridade, são igualmente importantes para apreensão desse status. Alguns estudiosos consideram tais variáveis em suas pesquisas acerca das desigualdades existentes entre os trabalhadores brasileiros (Silva, 2003; Ribeiro, 2003). Neste artigo, optamos pelo estudo da segregação ocupacional segundo sexo, cor e nível de escolaridade. O recorte temporal abarca o período de 2002 a 2012. A opção por esse intervalo se deve aos limites de comparação temporal das informações obtidas com base nos microdados da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios (PNAD)/Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), visto que, no ano de 2002, novo esquema classificatório para os títulos ocupacionais foi adotado. Outro motivo para a escolha desse recorte temporal se deve aos riscos que estudos que buscam mensurar a segregação ocupacional segundo a cor experimentam, caso considerem extenso período. Isso porque na PNAD a identificação da cor dos indivíduos se baseia na autodeclaração, a qual se altera no tempo, sobretudo se considerarmos que os movimentos sociais atuaram no passado recente no intuito de despertar a tomada de consciência por parte da população sobre seus valores.

Vale observar que utilizamos os novos pesos estimados pelo IBGE para pessoas que compõem a amostra da PNAD valendo-nos dos resultados do Censo Demográfico de 2010. As estimativas dos índices de segregação ocupacional se concentram em assalariados com carteira de trabalho assinada com mais de 23 anos, e que trabalham acima de 39 horas semanais. A diversidade do processo de seleção entre trabalhadores incluídos na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) e aqueles que se inserem no regime estatutário é o principal motivo para nos concentrarmos nos assalariados com carteira de trabalho. A partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, o acesso ao posto de trabalho no regime de estatutário se realiza via concurso público, enquanto no setor privado o processo de seleção é inteiramente distinto. Obviamente, as pessoas aptas aos concursos públicos evidenciam a existência de uma pré-seleção; no entanto, nossa meta neste artigo é analisar a segregação ocupacional entre os assalariados com carteira de trabalho no passado recente.

A segregação ocupacional pode ser definida como a maior presença de brancos ou negros em distintos grupos ocupacionais. Essa distribuição pode se alterar no tempo, porém uma elevada proporção de trabalhadores de cor diferente permanece concentrada em distintos grupos ocupacionais. Muitas vezes, nota-se que a segregação ocupacional impõe uma concentração de indivíduos, em razão de sua cor, em grupos ocupacionais de baixos rendimentos (Oliveira, 1997; Araújo; Ribeiro, 2002). Por outro lado, estudamos a segregação no mercado de trabalho também segundo grupos de anos de estudo, na medida em que o nível de escolaridade estabelece limites para a inserção dos trabalhadores em certos grupos ocupacionais, como o de dirigentes, que exigem determinado patamar mínimo de conhecimento formal. A qualificação da força de trabalho envolve vários componentes, como o conhecimento formal (escolaridade), o conhecimento adquirido no local de trabalho (experiência), os hábitos e as atitudes. Deste modo, o nível de escolaridade dos trabalhadores é somente uma proxy da qualificação.

Este estudo também se concentra na população branca e negra (pretos e pardos). Em relação à renda, a população preta e parda se assemelha, e, assim, optamos por juntá-los tal como em vários estudos (King, 2009).

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Rosana Ribeiro é professora associada do Instituto de Economia da Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, MG.

Guilherme Silva Araújo é economista do Dieese/SP, São Paulo, SP.

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