Redução da  Jornada de Trabalho e o Fim da Escala 6×1: Desafios e Estratégias Sindicais no Brasil Contemporâneo

Ulisses Borges de Resende e Rafael Ávila Borges de Resende

Resumo: O artigo analisa o tempo de trabalho como dimensão simbólica,  política e jurídica, superando a visão organizacional. Com base em Marx  (2018), Negt (2025), Bourdieu (1998) e Nussbaum (2025), e em dados da  OIT e Eurofound, discute a jornada como direito social ligado à dignidade,  saúde e cidadania. Examina a PEC nº 8/2025, que propõe reduzir a jornada  sem corte salarial e extinguir o regime 6×1, à luz do contexto legislativo e  de experiências internacionais (França, Islândia, Reino Unido e Portugal).  Conclui, a partir de análise histórica e jurídica, que redistribuir o tempo,  quando pactuado coletivamente e protegido por lei, é política estratégica  para fortalecer a democracia e promover desenvolvimento justo.

Sumário: Introdução | O tempo de trabalho como campo simbólico, estratégico e sindical | Estratégias sindicais contemporâneas: reapropriação política  do tempo de trabalho | A Dimensão Jurídico-Sindical nas Relações de Trabalho | Obstáculos Legislativos e Estratégias Sindicais na Tramitação  da PEC 8/2025 | Considerações finais

Introdução

O tempo de trabalho, longe de ser um simples parâmetro técnico de  organização produtiva, constitui um campo de disputa simbólica, política e jurídica que atravessa a história do trabalho moderno. Da Revolução Industrial  às atuais discussões sobre inteligência artificial e automação, a definição das  jornadas, ritmos e pausas revela-se não apenas como um arranjo econômico,  mas como um artefato civilizatório – expressão de valores, prioridades sociais  e concepções de dignidade humana. Desde Marx, que qualificou a limitação  da jornada como uma “barreira social” contra a apropriação ilimitada da vida  pelo capital, até as teorias contemporâneas de Negt, Bourdieu e Nussbaum,  a regulação do tempo emerge como um eixo estruturante para a efetivação  de direitos sociais e para a própria qualidade da democracia. 

No Brasil, essa disputa temporal adquire contornos particulares. A luta  sindical, responsável por conquistas históricas como as oito horas diárias e  o descanso semanal remunerado, consolidou-se no arcabouço jurídico nacional por meio da CLT e da Constituição Federal de 1988, dialogando com  convenções internacionais da Organização Internacional do Trabalho (OIT).  Entretanto, nas últimas décadas, a precarização estrutural, o avanço de regimes extenuantes (como o 6×1) e a intensificação do trabalho em setores de  serviços e comércio têm erodido esses marcos, recolocando o debate sobre o  tempo no centro da agenda sindical. 

Nesse contexto, a Proposta de Emenda Constitucional nº 8/2025, apresentada por meio do Movimento Vida Além do Trabalho – VAT em meio a um  movimento de recuperação de políticas públicas voltadas ao trabalho após  um período de retrocesso trabalhista (iniciado com a Reforma Trabalhista de  2017) irrompe como um marco potencial, ao propor a redução da jornada sem corte salarial e a superação de escalas exaustivas, resgatando o tempo  protegido como direito social e como condição para o desenvolvimento humano. Mais que uma alteração normativa, trata-se de uma disputa paradigmática: a quem pertence o tempo que excede as necessidades estritas da produção? Qual o papel do Estado, das empresas e dos sindicatos na definição e  na proteção desse tempo? 

Este artigo parte da premissa de que redistribuir o tempo é tão estratégico e civilizatório quanto redistribuir renda. Ao articular fundamentos teóricos, evidências empíricas e análise jurídico-sindical, busca demonstrar que a  redução da jornada, quando concebida como política pública e pactuada coletivamente, não representa um entrave à competitividade econômica, mas um  vetor de saúde, cidadania e fortalecimento democrático. Ao final, pretende-se  evidenciar que a disputa pelo tempo, no Século XXI, é também disputa pela  forma e pela substância da própria vida social.

 

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Ulisses Borges de Resende é advogado sindical. Mestre e Doutor em Sociologia pela UnB. Professor e Pesquisador do Programa de Mestrado em Direitos Sociais e Processos Reivindicatórios do  Centro Universitário IESB 


Rafael Ávila Borges de Resende é advogado na área de Direitos Sociais e Direito do Trabalho. Mestrando em Direitos Sociais


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