Parlamentares, ministros, artistas e militantes de direitos humanos acompanharam, na quinta-feira (05/06), no Plenário do Senado, a sessão do Congresso destinada à promulgação da Emenda Constitucional (EC) 81, que prevê a expropriação de locais onde for constatado trabalho escravo. Originária da chamada PEC do Trabalho Escravo, aprovada em 2012 pela Câmara dos Deputados, a proposta levou mais de uma década para ser votada nas duas Casas.
O texto muda o artigo 243 da Constituição, que previa a expropriação de terras nas quais fossem encontradas culturas ilegais de plantas psicotrópicas e sua destinação ao assentamento de colonos. Com a alteração, abre-se a possibilidade de imóveis urbanos ou rurais onde se verifique trabalho escravo serem destinados à reforma agrária ou a programas de habitação popular, sem indenização ao proprietário.
Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), existem 20 milhões de pessoas no mundo submetidas ao trabalho forçado, a maioria na América Latina.
Em 1957, o Brasil ratificou a Convenção 29 da OIT, que pede a extinção da mão de obra forçada. E em dezembro de 2003, o Congresso aprovou alteração no Código Penal (Decreto-Lei 2.848/40) para melhor caracterizar a submissão de alguém à condição análoga ao trabalho escravo. Pela lei, a prática é punida pela reclusão de dois a oito anos e multa, além da pena correspondente à violência praticada.
Punição mais severa
“As medidas coercitivas não foram suficientes e a legislação praticamente não foi aplicada. Por tudo isso, o Congresso estabeleceu medida mais drásticas, com a PEC do Trabalho Escravo”, avaliou o presidente do Senado, Renan Calheiros. “A esperança é que a emenda possa, se não eliminar, reduzir drasticamente a prática da escravidão”, acrescentou.
A deputada Benedita da Silva (PT-RJ) concordou: “O grande impacto começa na punição mais severa.”
Apesar da concordância de diferentes setores, a PEC do Trabalho Escravo enfrentou um longo caminho. Desde a apresentação de uma primeira proposta sobre o tema, em 1995 (PEC 232/95, arquivada), a matéria esbarrava na resistência de alguns setores da bancada da agropecuária. Para viabilizar a aprovação, começou-se a construir um acordo na Câmara e no Senado há cerca de dois anos, quando se concordou que a definição de trabalho escravo para a expropriação seria regulamentada por uma lei posterior.
Regulamentação
Pela PEC aprovada, a definição de trabalho escravo, porém, ainda dependerá de regulamentação, uma vez que foi aceita subemenda que incluiu a expressão “na forma da lei” no texto. Uma proposta de regulamentação (PLS 432/13), que tem o senador Romero Jucá (PMDB-RR) como relator, já aguarda votação em uma comissão mista formada por senadores e deputados.
O PLS define a forma como será classificado e punido o responsável pelo trabalho escravo e os procedimentos que decorrerão da emenda constitucional. O texto também diferencia o mero descumprimento da legislação trabalhista do trabalho escravo.
Condições degradantes
O diretor da ONG Repórter Brasil, Leonardo Sakamoto, se mobiliza há anos em denunciar casos de trabalho escravo no País. Ele comemorou a promulgação da emenda constitucional nesta quinta, mas, em entrevista ao Programa Com a Palavra, da Rádio Câmara, alertou que a luta continua para que a definição de trabalho escravo considere entre as práticas condenáveis a jornada exaustiva e as condições degradantes de trabalho.
“Esse projeto [PLS 432/13] está querendo que o confisco de terras só se dê por servidão por dívida e cerceamento de liberdade. Então, é um retrocesso enorme no direito dos trabalhadores”, sustentou. “Se essa regulamentação for aprovada, a PEC provavelmente não vai valer para trabalho escravo em canteiro de obras, oficina de costura, canaviais e tantos outros setores em que a condição degradante de trabalho e jornada exaustiva são prementes”, completou Sakamoto.
Para Romero Jucá, no entanto, os conceitos de jornada exaustiva e trabalho degradante são abertos e subjetivos e, por isso, não seria recomendável incluí-los na lei.
O texto de Jucá ainda não tem consenso e uma nova reunião para tratar do assunto está marcada para a próxima terça-feira (10/06). Se aprovado pela comissão mista, o projeto dependerá ainda do aval dos Plenários da Câmara e do Senado.
Fonte: Agência Câmara
Texto: Ana Raquel Macedo
Data original da publicação: 05/06/2014