Lisiane Ribas Cruz
Fonte: Aedos: Revista do Corpo Discente do PPG-História da UFRGS, Porto Alegre, v. 7, n. 17, p. 303-321, dez. 2015.
Resumo: O presente artigo propõe-se a investigar trabalho exercido por crianças no cotidiano urbano da cidade de Porto Alegre-RS, entre os anos de 1889 até 1927, período da Primeira República e pós-abolição da escravatura. O objetivo é analisar o desenvolvimento do trabalho de crianças através de anúncios, correspondências do Fundo de Polícia, e legislação vigente da época. Dentro de uma análise micro analítica, buscamos compreender a abordagem que os periódicos dedicavam as funções solicitadas para as crianças, às condições de trabalho e as relações sociais da época.
Apresentam-se resultados através desse artigo sobre análise de anúncios de jornais e correspondências do Fundo de Polícia que, ao mesmo tempo, dialogam com as referências documentais oriundas de outros pesquisadores, possibilitando identificar aspectos do trabalho infantil, atividade costumeira tão presente nas ruas de Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, entre o período de 1889 até 1927. Essa pesquisa tem por objetivo a identificação e análise de características presentes nos anúncios como o tipo de trabalho e a remuneração, cor de pele e gênero exigido pelos empregadores e qual tipo de abordagem utilizada nos anúncios direcionados às crianças. Também é feita uma análise sobre denúncias de abusos cometidos por patrões, dos tratamentos dados aos “menores” pelo Patronato Agrícola Senador Pinheiro Machado e pela legislação vigente na época.
A pesquisa desse artigo utilizou como fontes a serem analisadas, alguns dos jornais de maior circulação na região de Porto Alegre, entre eles o Jornal do Comércio, Correio do Povo, Le Petit Jornal, Gazeta do Comércio e Gazeta da Tarde. Os jornais que circulavam na capital gaúcha nesse período de 1889 até 1927 mostravam uma gama de anúncios destinados a crianças aprendizes, nos quais ofereciam diversos tipos de funções. Nesses exemplares estão registrados a idade, sexo e muitas vezes a cor de pele desejada para determinadas funções.
Alguns historiadores direcionaram suas pesquisas para temas relacionados com a infância, podemos exemplificar com a obra aclamada de Philippe Ariés, História Social da Criança e da Família (1973), que trouxe grande contribuição para a historiografia brasileira. Destacamos também a historiadora Mary Del Priore que foi organizadora do livro História das crianças no Brasil (2000). Através desses trabalhos, além de outros, observamos a importância do trabalho de acadêmicos que se debruçaram em pesquisas sobre a criança e a ligação com a perspectiva do abandono, da prostituição e da mendicância. Entre os vários pesquisadores que serviram de referência para a presente pesquisa, e que atuam na região do Rio Grande do Sul, citamos os trabalhos de Aidê Campelo Dill (2005), José Carlos da Silva Cardoso (2013), Sandra Jatahy Pesavento (2002) e Charles Monteiro (2007), esses trabalharam com a infância e com a Primeira República e, por ora, a história da cidade de Porto Alegre.
No Brasil, poucos trabalhos foram publicados até a década de 1970, tendo como fonte os periódicos. A terceira geração da Escola dos Annales contribuiu com a historiografia possibilitando novos olhares sobre o tema, primeiramente na França e, posteriormente, tornando-se presente em outros países. Podemos, através de Luca, citando Jacques Le Goff e Pierre Nora, afirmar a importância de explorar os novos caminhos agregados à historiografia.
Obra coletiva e diversificada, pretende, no entanto, ilustrar e promover um novo tipo de história […]. A novidade parece-nos estar ligada a três processos: novos problemas colocam em causa a própria história; novas abordagens modificam, enriquecem, subvertem os setores tradicionais da história; novos objetos, enfim, aparecem no campo epistemológico da história. (LUCA, 2008, p. 113)
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Lisiane Ribas Cruz é mestranda em História na Universidade do Vale do Rio dos Sinos.