Com a oficialização de que o governo português venderá os Correios até dezembro, o país avança para a quarta privatização de grande escala desde 2011, seguindo as exigências da troika (FMI, Banco Central Europeu e Comissão Europeia), que emprestaram a Portugal 78 bilhões de euros (230 bilhões de reais).
O objetivo do governo é equilibrar as contas públicas, e para isso as estatais ou as empresas onde o Estado é o principal acionista servem de alavancas para as arrecadações. O Executivo considera decisiva a venda dos Correios (CTT pelas suas siglas) para reduzir o déficit em 1,6 ponto percentual este ano e, assim, atingir a meta de 5,5% do PIB. Já foram vendidas empresas nas áreas de energia, gestão de aeroportos e saúde. Ainda estão na mira a companhia aérea TAP e as seguradoras do banco Caixa Geral de Depósitos – o maior do país –, entre outras.
A oposição de esquerda e sindicatos têm criticado duramente o governo de centro-direita por deixar setores estratégicos em mãos estrangeiras. Arménio Carlos, secretário-geral da CGTP, a maior central sindical portuguesa, classificou de “crime contra a economia” a privatização dos Correios. Os sindicalistas alertam para o risco de mais desemprego num país com a terceira maior taxa da União Europeia (16,4%). Esse receio cresceu ainda mais depois da declaração do ministro da economia, Antonio Pires de Lima, que disse não poder “assegurar que não haja demissões”.
Geografia das privatizações
O maior negócio do Estado português até o momento foi a gestora de aeroportos ANA. O grupo francês Vinci a comprou por 3 bilhões de euros (9 bilhões de reais) e hoje controla 23 aeroportos em França, Camboja e Portugal.
Porém, é a China que tem se colocado como principal ator no mercado das privatizações. A estatal State Grid adquiriu 25% da transportadora energética portuguesa REN por 400 milhões de euros (1,2 bilhões de reais). A segunda maior fatia (15%) ficou com os árabes Oman Oil Company.
Em dezembro de 2011, a também chinesa Three Gorges transformou-se na maior acionista da EDP, empresa do setor energético com posição consolidada na Península Ibérica e crescente presença no Brasil, especialmente no setor das renováveis. O negócio foi fechado em 2,7 bilhões de euros (8 bilhões de reais). As brasileiras Eletrobrás e a Cemig concorreram por uma fatia da empresa, mas perderam a disputa.
Os brasileiros também não se saíram bem na corrida pela compra da TAP. À época, o favorito era o dono da Avianca, o brasileiro-colombiano Germán Efromovich, que ofereceu 1,5 bilhão de euros (4,5 bilhões de reais). Contudo, em meio à falta de garantias bancárias, a proposta foi recusada e o processo de venda, adiado.
Por enquanto somente a operadora brasileira de saúde Amil foi bem-sucedida. O grupo comprou a rede portuguesa de hospitais HPP Saúde por 85 milhões de euros (251 milhões de reais) em março deste ano. Porém, ela não figura entre as gigantes estatais. Agora, a nova aposta do Brasil é os Correios, avaliado em 600 milhões de euros (1,8 bilhões de reais). O vice-presidente Michel Temer afirmou durante visita na semana passada que os Correios do Brasil seguem interessados no negócio. Foi a segunda viagem de Temer a Portugal em um ano para tratar de temas ligados à privatização.
Mudança de planos
As recentes mudanças no modelo de venda dos Correios tomaram os interessados de surpresa, pois dificultam a aquisição de uma posição majoritária na empresa. O governo decidiu colocar 70% do CTT na Bolsa, reservando uma parte a pequenos investidores e outra a investidores institucionais, além de 5% destinados por lei aos trabalhadores da companhia. Os restantes 30% devem ser vendidos a médio prazo, ainda não se sabe por meio de qual modelo.
O método de venda a vários acionistas foi utilizado com sucesso pelo Reino Unido, que na semana passada colocou 52% do capital da Royal Mail na Bolsa e conquistou 700 mil pequenos investidores. Em Portugal, o modelo desapontou grupos empresariais. Alguns especialistas apontam a mudança como uma estratégia do governo para valorizar a empresa na Bolsa e, assim, vender os restantes 30% por um preço mais elevado.
O processo de privatizações em Portugal é uma exigência expressa no memorando assinado entre o Estado português e os credores da troika em maio de 2011. Mas o enxugamento do Estado não para na venda de estatais. O governo do primeiro-ministro Passos Coelho ainda planeja mais cortes na despesa pública, depois das medidas já em voga de aumento de impostos, redução em salários, aposentadorias e postos de trabalho. Ainda esta semana os detalhes do Orçamento de 2014 serão apresentados ao Parlamento.
Fonte: Opera Mundi
Texto: Marana Borges
Data original da publicação: 14/10/2013