Diante das previsões generalizadas de déficit após a pandemia de Covid-19 e o desastre global anunciado pela paralisia econômica decorrente do confinamento, as respostas nacionais díspares dos países a um problema global podem ser um empecilho para a economia mundial, como explicou à RFI Carlos Quenan, diretor do Instituto das Américas de Paris.
“Estamos dirigindo um carro sem amortecedores”
“Assim como existem desigualdades em tempos de paz diante da globalização e da distribuição da riqueza, em tempos de crise essas desigualdades continuarão a existir na tentativa de encontrar respostas para esse déficit”, disse Carlos Quenan, professor do IHEAL (Instituto de Altos Estudos da América Latina, Universidade Paris II, e vice-presidente do Instituto das Américas de Paris), acrescentando que “apenas a China e a Índia são capazes de um crescimento positivo este ano”.
No entanto, o professor destaca que “os países europeus ou os Estados Unidos têm mais recursos do que os países emergentes”, mas “após as crises anteriores (2007, 2008 e 2009) eles foram enfraquecidos por políticas monetárias frouxas e taxas de juros não convencionais, além de injeções de liquidez na economia”. Portanto, “as margens de manobra são reduzidas e somos confrontados com a impossibilidade de responder a essa crise. Estamos dirigindo com um carro sem amortecedores num caminho cheio de buracos”, afirmou.
Cataclismo econômico para todos
Após as medidas contra a pandemia e de proteção à saúde pública, a demanda e a oferta foram paralisadas com números aterradores, sem precedentes para todos os países. Espera-se uma retirada de 5% a 12% do Produto Interno Bruto (PIB) na zona do euro em 2020, de acordo com o Banco Central Europeu (BCE), que lançou um programa de emergência sem prazo para terminar. Na mesma área, o PIB não para de cair e a taxa de desemprego aumentou para 7,4%.
Na França, Espanha e Itália, onde o PIB caiu 5,8%, 5,2% e 4,7%, respectivamente, no primeiro trimestre, é anunciado um “choque econômico”. Na Alemanha, a taxa de desemprego atingiu níveis recordes. O Japão desbloqueou um orçamento de mais de € 220 bilhões. Nos Estados Unidos, em uma semana havia 3,8 milhões de novos desempregados.
América Latina experimentará uma crise semelhante a 1930 ou à Primeira Guerra Mundial
Para Carlos Quenan, na América Latina a situação é preocupante: “uma queda de quase 6% do PIB é esperada ao longo deste ano e será a retração mais importante da história, inclusive um pouco mais forte que a crise de 1914, devido à Primeira Guerra Mundial e à crise financeira de 1930, após o crash da Bolsa de Nova York.
A região experimentará “uma situação de forte declínio econômico, com margens muito fracas”. Assim, os trabalhadores informais, que representam uma grande força de trabalho na América Latina e no resto do mundo, serão os mais afetados pela crise.
Mais da metade dos trabalhadores do mundo perderão seus recursos
Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), mais da metade dos 3,3 bilhões de trabalhadores no mundo correm o risco de perder seus meios de subsistência durante este segundo trimestre devido à pandemia viral.
A entidade revelou números preocupantes e pediu solidariedade diante do possível desaparecimento de pequenas estruturas e à pauperização dos trabalhadores devido à falta de ajuda e proteção. O secretário-geral da OIT, Guy Ryder, declarou que “um impacto econômico em termos de pobreza deve ser esperado”.
Isso atingiria mais de 1,6 bilhão de pessoas (as mais vulneráveis no mercado de trabalho) em todo o mundo que poderiam perder seu ganha-pão. Em apenas um mês, no início da crise do coronavírus, os ganhos dos trabalhadores informais caíram 60%. Isso significa um colapso de 81% na África e no continente americano, 2,1% na região Ásia-Pacífico e 70% na Europa e Ásia Central.
Guy Ryder destacou que “por trás desses números há famílias e sofrimento humano”, e “é necessário que a comunidade internacional mostre solidariedade com eles”.
Segundo a OIT, os setores mais afetados serão serviços, indústria, hotéis, vendas de imóveis, pequenas empresas comerciais, entre outros, uma vez que os trabalhadores informais realizam seu trabalho sem proteção social, sem contratos, sem saúde ou proteção ao emprego.
Entrevistado pelo RFI, Jorge Mujica, membro do sindicato UAW (United Automobile Workers) e representante de trabalhadores indocumentados, o ARIS Chicago Worker Center, afirma que esta crise econômica é um terremoto para os trabalhadores informais “e ainda mais para aqueles que não têm documentos”, que diminuem seus recursos, além de serem obrigados a trabalhar em condições sanitárias inseguras, para não acabarem definitivamente com sua renda.
Fonte: RFi
Texto: Natalia Olivares
Data original da publicação: 01/05/2020