Apesar da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que na semana passada decidiu pela proibição total do uso de amianto no país, o Ministério Público do Trabalho (MPT) quer garantir reparação dos prejuízos causados pela fibra. “Ainda que o amianto tenha sido banido do país, o rastro de morte e de sofrimento deixado ao longo de décadas – uma vez que a indústria do amianto se instalou no país na década de 1940 – permanece, já que os sintomas podem aparecer até 30 anos depois da exposição ao material”, diz o MPT.
Quatro ações foram ajuizadas, no Rio de Janeiro, Bahia, São Paulo e Paraná. “O objetivo agora é que as indenizações por dano moral coletivo postuladas nessas ações sejam destinadas, dentre outras hipóteses de reparação dos danos coletivos, ao diagnóstico das doenças relacionadas ao amianto, de forma a capacitar o Sistema Único de Saúde (SUS) para receber os trabalhadores e monitorar a saúde dos expostos à fibra”, afirma o procurador do Trabalho Luciano Leivas.
Segundo ele, isso já começou a acontecer, com a reversão de mais de R$ 1 milhão de multa por descumprimento de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), firmado pela fabricante Eternit, por não emitir Comunicações de Acidente de Trabalho. “Não comunicar à Previdência Social os agravos à saúde dos trabalhadores demonstra claramente a realidade da ocultação proposital da doença, o que dificultava o dimensionamento do passivo socioambiental”, afirma o procurador. O dinheiro foi utilizado na aquisição de equipamento para o Hospital das Clínicas de São Paulo, para diagnóstico do câncer motivado por exposição ao amianto e outras doenças relacionadas.
De acordo com o MPT, ex-trabalhadores expostos ao amianto contam que as empresas chegaram a firmar acordos com aqueles que estavam doentes, o que incluía até mesmo um benefício que eles chamavam de “kit-caixão”. Segundo o procurador, “isso significa que nos estágios avançados das doenças a empresa arcava com as despesas de cilindro de oxigênio e, eventualmente, do próprio funeral”.
Em Osasco, na região metropolitana de São Paulo foram mais de 10.700 expostos ao longo de 40 anos, dos quais menos de 10% foram ou são acompanhados pela Fundacentro, órgão de pesquisas vinculado ao Ministério do Trabalho. Segundo o procurador, como resultado desse monitoramento, foram encontrados 292 adoecidos e confirmados mais de 90 óbitos relacionados. Entre 1980 e 2010, de acordo com o sistema de informação de mortalidade do SUS, foram identificados mais de 3.700 óbitos por mesotelioma no Brasil. “Esse tipo de câncer traz a impressão digital do amianto, pois somente pode ser provocado pela fibra”, diz Leivas.
Além disso, a Eternit é dona da única mina no Brasil, a Minaçu, em Goiás, além de cinco unidades industriais, que também serão objeto de atuação do MPT para verificar o cumprimento da decisão de proibição do uso amianto.
Antes da decisão do STF, o MPT convocou as empresas que trabalharam com amianto para fazer com que elas buscassem a substituição do material por fibras alternativas, até para manter os empregos e preservar a atividade econômica, sem riscos aos trabalhadores. “A grande maioria das empresas assumiu o compromisso de substituir o amianto por fibras alternativas. No entanto, a empresa líder de mercado e dona da mina de amianto, por capricho econômico, manteve a produção poluidora uma vez que o amianto era mais lucrativo”, lamenta.
A mais recente ação foi movida na Bahia e pede R$ 225 milhões de indenização devido a violações à saúde de funcionários da empresa no município de Simões Filho. A ação de São Paulo tem recurso dirigido ao Tribunal Superior do Trabalho (TST), aguardando julgamento. Em primeira instância obteve condenação em R$ 100 milhões, porém a decisão foi derrubada pelo Tribunal Regional da 2ª Região, em São Paulo (TRT2). Já a do MPT no Paraná pede 85 milhões de dano moral coletivo, além da substituição imediata por fibras alternativas na fabricação de produtos como telhas e caixas d’água.
Como um dos precursores do programa nacional de banimento do amianto do MPT, o procurador Luciano Leivas presenciou e comemorou o desfecho inédito e surpreendente do julgamento das ações sobre o tema no STF. “O julgamento foi absolutamente histórico e marca uma nova percepção da Corte Suprema em relação ao controle de constitucionalidade de leis que permitem o uso de agentes químicos nocivos, ao determinar que todas as autoridades, do Poder Judiciário e da administração pública no Brasil são obrigadas a reconhecer que não há mais permissão para uso do cancerígeno amianto no Brasil.”
Fonte: Rede Brasil Atual, com MPT
Data original da publicação: 04/12/2017