Roberto Leher e Amanda Moreira da Silva
Resumo: Este artigo examina o trabalho docente no ensino superior privado-mercantil, com destaque para o ensino a distância (EaD) e para a intensificação e expropriação do trabalho dos professores. A análise aborda o impacto da plataformização e do controle algorítmico sobre a organização do trabalho docente, revelando mecanismos de intensificação, precarização e gamificação, em um contexto de capitalismo dependente e financeirizado. Em especial, apresenta dados sobre a expansão do EaD, mostrando que o crescimento de matrículas não foi acompanhado pelo aumento de professores, resultando em relações desproporcionais entre o número de estudantes e docentes, sobretudo nas grandes corporações educacionais. Do exposto, conclui-se que há a necessidade de lutas que tenham como objeto combater a mercantilização radical da educação, o fim da massificação do EaD e que inclua o regime de dedicação exclusiva como padrão para os docentes.
Sumário: Introdução | Tempo de trabalho, tempo a serviço da exploração, tempo como luta de classes na Educação | Relação entre a plataformização e a financeirização na educação superior privada-mercantil | Aspectos da realidade do trabalho intensificado na EaD | Considerações finais
Introdução
O artigo examina o trabalho docente no Ensino Superior privado-mercantil, destacando o trabalho nos cursos a distância, ensino digital e ensino virtual, todos eles profundamente afetados pela intensificação e pela expropriação do trabalho. Atuam no Ensino Superior 328 mil docentes que atendem aproximadamente dez milhões de estudantes, sendo 79,3% nas instituições privadas. Entretanto, a rede pública, com apenas 20,7% das matrículas, possui 54% dos docentes em atividade no Ensino Superior, conforme o Censo do Ensino Superior de 2023 (Brasil, 2024). Em virtude das singularidades da forma de intensificação do tempo de trabalho na educação mercantilizada e financeirizada, notadamente na modalidade de cursos a distância, o tema é crucial para o debate político da redução da jornada de trabalho.
Em virtude da escala da intensificação do tempo de exploração do trabalho nas corporações educacionais, a luta pelo fim da jornada 6X1 e a discussão relativa ao tempo de trabalho assumem importância fulcral. Conhecer e explicar a exacerbação da jornada laboral no setor da Educação Superior privada-mercantil permite aprofundar a discussão sobre a jornada de trabalho, especialmente no contexto da plataformização e da financeirização da educação, tema que abrange, a rigor, toda a Educação. Este segmento de trabalhadores passa a vivenciar jornadas reais de trabalho jamais vistas na educação.
No caso do Ensino Superior, especialmente o privado-mercantil, os processos de exploração incidem diretamente sobre as condições de controle do tempo pelo trabalhador. A remuneração docente não se dá apenas pelos contratos de trabalho, mas, também, como em outras categorias, por meio de tarefas realizadas, no caso, aulas, correções de estudos, orientações, elaboração de materiais pedagógicos para uso (e incorporação sub-remunerada) nos sistemas de ensino e nas plataformas de trabalho das corporações. Desse modo, a consigna “existe vida após o trabalho” que orienta as lutas pelo fim da escala 6 x 1 não pode deixar de abarcar o labor de uma das categorias mais exploradas e que possuem as jornadas mais intensificadas, como a dos docentes das instituições privadas mercantis, especialmente aqueles que atuam na EaD. Como em milhões de outros trabalhadores, o tempo de trabalho não é expresso e regulado apenas na forma de jornada diária e semanal de trabalho.
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Roberto Leher é professor titular da Faculdade de Educação e do Programa de Pós-graduação em Educação da UFRJ. Doutor em Educação pela USP (1998). Professor colaborador da Escola Nacional Florestan Fernandes/SP, pesquisador do CNPq e Cientista de Nosso Estado (FAPERJ). Foi reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (julho de 2015 a julho de 2019). ORCID: http://orcid.org/0000-0002-5063-8753.
Amanda Moreira da Silva é professora da UERJ. Doutora em Educação (UFRJ). Pós-doutorado em Sociologia do Trabalho (Unicamp). Líder do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Trabalho, Educação e Sociedade (Neptes-Uerj). Atualmente presidente da Associação dos Docentes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Asduerj). ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9416-0619.
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