Igualdade salarial para mulheres e homens: especialistas avaliam que luta está só começando

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Ilustração: Freepik

por Laura Glüer

1º Relatório Nacional de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios, divulgado recentemente pelos ministérios do Trabalho e Emprego (MTE) e das Mulheres, aponta dados nacionais da remuneração média e salários para mulheres e homens, além das realidades por raça/cor e grandes grupos ocupacionais em cada um dos estados brasileiros. 

A principal realidade que esse relatório evidencia é a discrepância ainda existente entre homens e mulheres no mundo do trabalho. E o ano de 2024 será decisivo para a luta contra a desigualdade salarial entre homens e mulheres.

No Brasil, conforme o relatório, as mulheres ganham 19,4% a menos que os homens, sendo que a diferença pode ter variações maiores, conforme o grande grupo ocupacional. Em cargos de dirigentes e gerentes, por exemplo, a diferença chega a 25,2%. 

No recorte por raça/cor, as mulheres negras, além de estarem em menor número no mercado de trabalho (2.987.559 vínculos, 16,9% do total), são as que têm renda mais desigual. Enquanto a remuneração média da mulher negra é de R$ 3.040,89, correspondendo a 68% da média, a dos homens não-negros é de R$ 5.718,40 — 27,9% superior à média.

As empresas ainda terão desafios importantes a superar no tema da igualdade salarial. Apenas 32,6% das empresas têm políticas de incentivo à contratação de mulheres. Este índice é ainda menor quando se consideram grupos específicos de mulheres: negras (26,4%); mulheres com deficiência (23,3%); LBTQIAP+ (20,6%); mulheres chefes de família (22,4%); mulheres vítimas de violência (5,4%). Em relação às mulheres em funções de liderança, somente 38,3% declararam que adotam políticas para promoção de mulheres a cargos de direção e gerência.

Segundo Marilane Oliveira Teixeira, economista, professora e pesquisadora do Cesit/Unicamp e uma das consultoras do Grupo de Trabalho Interministerial que contribuiu na elaboração do relatório, a absoluta maioria das empresas oferece rendimentos menores para as mulheres, o que demonstra um nível de segregação enorme. “Precisamos vencer muitas barreiras, dar acesso para as mulheres às políticas públicas, para que possam encontrar trabalho mais adequado à sua qualificação. Muitas vezes elas vão para o trabalho informal e precário por conta de cuidar da família e outras responsabilidades”, afirma.

Para Lúcia Garcia, pesquisadora do mercado de trabalho e professora da Escola de Ciências do Trabalho do DIEESE, há muito a se conquistar em relação à transparência. “Conseguimos obter um panorama das iniciativas empresariais para minimizar as diferenças de oportunidade em âmbito regional, mas ainda temos a expectativa de um quadro mais pormenorizado, em que possamos avançar para além dos grandes percentuais. Por outro lado, sabemos que as empresas apelaram ao Supremo para evitar a apresentação de suas folhas de pagamento, demonstrando que realmente a Lei da Igualdade chegou ao ponto-chave da situação”, pondera.

A desigualdade salarial entre homens e mulheres é historicamente marcada pela ocupação de diferentes funções – homens desempenhando atividades ligadas à produção de valor e mulheres ligadas às do aparato da reprodução social – educação, saúde, serviços sociais e cuidados.

“Quando mulheres e homens atuam no mesmo campo de atividades, com a mesma natureza de execução, requisitos cognitivos e competências equânimes, podemos ver que as diferenças salariais persistem. Esta permanência se relaciona, principalmente, às dificuldades de progressão nas carreiras profissionais enfrentadas pelas mulheres, que raramente chegam aos cargos de chefia e topo das organizações”, observa Lúcia.

A interdição na trajetória profissional das mulheres nas corporações, em geral, se relaciona ao papel que as mulheres cumprem fora do dito ambiente laboral, dedicando horas ao trabalho não pago de cuidados e aos afazeres domésticos, e aos assédios no ambiente de trabalho, muitas vezes relacionados a esta progressão.

Assim, além da equidade estritamente salarial, no campo da regulação, Lúcia recomenda que o Brasil se torne signatário da Convenção 156, do compartilhamento das responsabilidades familiares, assim como da Convenção 190, que visa a adoção de práticas de erradicação de violência e assédio relacionadas ao gênero no local de trabalho.

Como fazer a lei virar realidade

As duas especialistas entrevistadas pelo DMT em Debate avaliam que a Lei da Igualdade Salarial é um grande triunfo, fruto de uma longa jornada de reivindicação das mulheres.

O acompanhamento do Grupo Interministerial pela representação das Centrais Sindicais constata a existência de uma postura firme do Governo Federal para que a Lei 14.611/23 se efetive. “Isto nos fornece um contexto promissor, mas insuficiente, pois já estamos acompanhando a oposição empresarial. Para evitar recuos, ou que esta conquista se esvazie, é necessário que a sociedade abrace a Lei, o que passa, essencialmente, pela mobilização das trabalhadoras”, avalia Lúcia Garcia.

Marilane Oliveira Teixeira afirma que há uma adesão importante de pelo menos de uma parte das empresas para a implementação de uma política de igualdade salarial, inclusive com algumas manifestações públicas a favor, como no caso do grupo Gessy Lever.

“A Lei da Igualdade de Salários abriu uma janela de oportunidades muito importante e em breve o Ministério das Mulheres vai anunciar um plano nacional de igualdade salarial e um grupo de trabalho permanente”, complementa Marilane.

    Fontes:

    https://www.gov.br/mulheres/pt-br/central-de-conteudos/noticias/2024/marco/mulheres-recebem-19-4-a-menos-que-os-homens-aponta-1o-relatorio-de-transparencia-salarial

    Resumo do 1º Relatório Nacional de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios. https://docs.google.com/presentation/d/1Fzz5Jm8iM2LvCMGVjlhwHWlaiYiDuoO7/edit#slide=id.p1

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