Clemente Ganz Lúcio
Patrícia Lino Costa
Em meio a muitas adversidades enfrentadas no dia-a-dia, as mulheres vêm conquistando alguns avanços no mercado de trabalho. A situação ainda está muito longe da ideal, mas um estudo realizado pelo DIEESE, para marcar o Dia Internacional da Mulher, em 8 de março, mostra que seguimos em direção a um mercado de trabalho com maior equidade de gênero.
A base do estudo é a Pesquisa de Emprego e Desemprego, que o DIEESE realiza em conjunto com a Fundação Seade e outras entidades parceiras e apoio do Ministério do Trabalho e Emprego e Fundo de Amparo ao Trabalhador. De acordo com os números, a presença feminina na força de trabalho se estabilizou nos últimos anos e, de cada 100 mulheres, cerca de 50 estão no mercado de trabalho como ocupadas ou desempregadas na Região Metropolitana de São Paulo.
A taxa de desemprego da mulher é sistematicamente maior que a dos homens, mas, recentemente, a diferença vem diminuindo, o que indica a criação de mais postos de trabalhos para elas. Mesmo assim, as mulheres ainda correspondem a mais da metade do número de desempregados.
Todo o movimento de elevação do número de postos de trabalho com carteira de trabalho assinada, no período recente, beneficiou também as mulheres, pois houve crescimento do número de empregadas com proteção social. Contudo, quando ocupadas, elas encontram maior dificuldade de ascensão profissional, principalmente para chegar a cargos de chefia. E, em termos gerais, ganham menos do que os homens, apesar de possuir maior escolaridade.
É preciso ainda lembrar da dificuldade enfrentada pela mulher negra no mercado de trabalho. Ela acumula dupla discriminação: por sexo e raça. A grande maioria ainda está no emprego doméstico ou em setores sem proteção social, onde recebe menores salários e tem pouca chance de crescimento profissional. Para essas mulheres, deveria haver maior atenção por parte do poder público, com ações e políticas de incentivo e proteção redobradas.
O debate rumo à equidade de gênero precisa mudar de patamar. O movimento sindical e social tem demandado que a mulher ocupe espaços de poder, onde possa efetivamente ajudar a construir uma sociedade mais justa. Mais da metade da população brasileira é mulher, mas a presença feminina é baixíssima em cargos de representação política. Em 2014, cresceu o número de candidatas mulheres, mas, na Câmara dos Deputados, somente 9,9% dos parlamentares são do sexo feminino. No Senado, o percentual é 13,6%. Como resultado dessa baixíssima participação, a mulher e os problemas que ela enfrenta são sub-representados nas leis criadas.
Outra questão importante diz respeito à mudança de comportamento nas empresas. A presença feminina em cargos executivos e de chefia é muito pequena. Além disso, as trabalhadoras são mais suscetíveis ao assédio moral e sexual. A forma de mudar a percepção sobre o papel da mulher dentro dessas organizações é pela negociação coletiva. Os acordos negociados indicam uma grande melhora em termos de proteção à mulher que é mãe, mas ainda é preciso transformar as cláusulas de igualdade e equidade em ações efetivas dentro da empresa, para transformar o ambiente de trabalho. Para que isso aconteça, é preciso que haja a ampliação da participação das mulheres nas entidades sindicais, na elaboração das pautas e nas mesas de negociação.
Também não é admissível que continue a vigorar o pensamento que diz que a mão de obra feminina é mais cara porque a mulher engravida ou precisa cuidar dos filhos ou dos pais. É preciso intensificar ainda mais a discussão, já em pauta, sobre a necessidade de se compartilhar as responsabilidades familiares e, para isso, é preciso repensar os papéis socialmente atribuídos ao homem e a mulher. Enquanto o homem ocupado faz cerca de 9,8 horas semanais de serviços domésticos, a mulher ocupada faz 20,6 horas, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Pnad/IBGE). Por que a maior parte do trabalho doméstico precisa ser feita pela mulher?
Outra ponta dessa questão são as políticas públicas. Para promover a igualdade de condições de inserção da mulher no mercado de trabalho, as políticas públicas precisam universalizar o direito de acesso às creches, à educação infantil, básica e média, em tempo integral, assim como assegurar serviços que possam amparar as famílias nos cuidados com os idosos.
A verdadeira transformação só acontecerá quando as mulheres passarem a ocupar mais os espaços de formulação política, sindical e dentro das empresas; quando a educação incorporar a necessidade de disciplinas que ensinem as crianças a enxergar um mundo em que o papel de cuidar da família pertence aos adultos e não apenas à mulher; quando houver mudanças nas políticas públicas e; quando a discussão sobre a situação feminina deixar de ser feita entre mulheres, mas incluir também os homens.
Clemente Ganz Lúcio é sociólogo, diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES).
Patrícia Lino Costa é economista do DIEESE.