Pesquisa internacional revela opinião social sobre importância dos direitos trabalhistas.
Clemente Ganz Lúcio
Fonte: Poder360
Data original da publicação: 07/08/2021
A pandemia do novo coronavírus teve impacto profundo na vida dos trabalhadores, com desemprego, inatividade, perda de renda, precarização, entre outras mazelas que atingiram milhões em todo o planeta. Muitos continuaram trabalhando no setor da saúde e nas atividades essenciais, colocando em risco sua vida e de seus familiares.
Criaram-se ou expandiram atividades econômicas, como os entregadores, e com elas postos de trabalho precários e inseguros. O uso da tecnologia de comunicação se difundiu e o home office e o teletrabalho se espalharam. Esses fenômenos intensificaram os movimentos antes em curso de mudanças no sistema produtivo e ampliaram as transformações no mundo do trabalho. Quase 5 milhões morreram!
A proteção laboral, social, previdenciária e sindical, gravemente atacada e delapidada nos últimos anos pelo movimento neoliberal de desregulação do trabalho, também foi atingida. Se mecanismos de proteção de renda e emprego foram implantados em países, inclusive no Brasil, ao mesmo tempo iniciativas para ampliar a desregulação e desproteção continuaram sendo promovidas. Muitas mortes teriam sido evitadas se a proteção estivesse no centro das políticas públicas e da ação dos governos.
A CSI (Confederação Sindical Internacional) – maior confederação sindical mundial, presente em mais de 150 países – realizou, em junho deste ano, uma pesquisa em 10 países – Austrália, Brasil, Estados Unidos, França, Grã Bretanha, Índia, Indonésia, Itália, Japão e México –, entrevistando mais de 12 mil trabalhadores sobre sua opinião e visão em relação à importância de 7 direitos trabalhistas e sindicais na realidade e vida pós pandemia da covid-19, comparando com a situação anterior à crise sanitária (eis a íntegra do estudo).
Para 73% dos entrevistados, os direitos trabalhistas e sindicais sempre foram importantes ou agora são ainda mais importantes. Na visão agregada dos entrevistados nos 10 países, a importância desses direitos segue a seguinte ordem: acessibilidade aos cuidados de saúde (82%); direito a um salário mínimo digno (79%); licença médica paga (78%); seguro desemprego (77%); direito à negociação coletiva para conquistar condições laborais e salários mais justos (74%); direito de filiação sindical (64%); direito de greve (56%). Esses resultados são semelhantes no recorte por gênero e por idade.
O Brasil aparece sempre entre os 3 países que deram maior ênfase às respostas que indicam ser mais importante ou continuar sendo importante cada um dos direitos pesquisados.
Alguns apontamentos para possíveis interpretações sobre os resultados para o Brasil:
Os brasileiros são os que mais destacaram a importância do salário mínimo (89%). É provável reconhecimento do impacto que teve a política de valorização do salário mínimo que promoveu um aumento real de mais de 70%. De outro lado, a constatação de como é baixa a base salarial no Brasil e de quanto o incremento do salário mínimo atua sua elevação e na proteção das renda do trabalho não assalariado.
Também foi no Brasil que o seguro desemprego mais se destacou (90%). De um lado, porque diante do desemprego altíssimo e de longa duração, o problema adquire caráter de urgência; de outro, a existência do seguro desemprego demonstra a sua importância para a proteção. As medidas de proteção dos empregos e salários durante a pandemia indicaram a relevância de um programa permanente de proteção dos empregos.
O Brasil foi o 2º país que mais destacou a licença médica paga (87%), mais uma vez confirmando a pertinência dessa política para os trabalhadores enfrentarem os problemas com proteção da vida, da saúde, da renda e dos empregos.
Para 87% dos brasileiros, o direito de greve sempre foi ou é mais importante agora, colocando o país como o 2º que mais valoriza esse direito. Uma evidência da disposição presente entre os trabalhadores para a mobilização e para a luta sindical que busca melhores condições de salário e de trabalho, proteção social, previdenciária e trabalhista.
O direito de filiar-se a um sindicato é destacado por 64% dos brasileiros. Um indicativo claro de espaço para o trabalho de base de sindicalização, de mobilização e de organização para as lutas por melhorias trabalhistas, assim como reconhecimento do papel que os sindicatos desempenham na proteção dos trabalhadores. Ainda assim, 29% não consideram esse direito importante, opinião que precisa ser analisada e enfrentada pelo sindicalismo.
Para 82% dos respondentes brasileiros, o direito de negociação sempre foi ou é ainda mais importante. Isso coloca em destaque o papel dos sindicatos, na atribuição de representar, organizar e mobilizar a classe trabalhadora para conquistar com lutas e negociação os direitos que distribuem o resultado do trabalho de todos por meio dos salários, das condições de trabalho e da proteção laboral, social e previdenciária.
A acessibilidade aos cuidados de saúde é destacada por 64% dos respondentes brasileiros. De um lado, destaca-se o papel do SUS (Sistema Único de Saúde) na proteção de saúde. De outro, os 29% que afirmam não ser importante esse direito podem estar associados àqueles que têm planos de saúde privados, direito que é comprado por quem pode pagar.
Há nessa pesquisa insumos valiosos que devem incentivar o movimento sindical a conduzir sua reestruturação para ampliar a representação, agregar força e promover unidade. De outro, indicam à sociedade a compreensão do papel central que cumprem as entidades sindicais. Por fim, está destacado o papel das políticas públicas universais de proteção e promoção laboral e social, assim como se destaca uma agenda de futuro na qual o Estado cumpre papel estratégico.
Clemente Ganz Lúcio é sociólogo e professor universitário. Foi diretor técnico do Dieese e membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social.