Um dos últimos pilares de resistência à crise, o setor de serviços administrativos e complementares começou a demitir no fim de 2015 diante da escolha de empresas em reduzir a demanda por esse tipo de atividade. Sem escolha, o segmento – que inclui tarefas de limpeza, vigilância e telemarketing – está mandando para a fila do desemprego pessoas com menor qualificação e remuneração, que podem encontrar dificuldades para se recolocar no mercado de trabalho.
Além disso, como o setor é intensivo em mão de obra, o sinal de que a crise bateu à porta pode ainda reforçar o círculo vicioso já visto nos últimos meses. Quando essas pessoas são demitidas, elas passam a consumir e gastar menos, deprimindo ainda mais a atividade econômica e gerando mais desemprego.
Luis Carlos Avelino, de 40 anos, trabalhou por uma década no setor de vigilância. Após três anos de atuação como segurança em uma empresa do ramo de hotelaria em São Bernardo do Campo, no Grande ABC paulista, foi dispensado em outubro passado por “redução de custos”. “Depois de mim, mandaram outros embora. Sobrevivi porque recebi o seguro-desemprego e fiquei fazendo bicos. Agora, o seguro vai acabar. Estou entregando currículos.”
Morador da zona leste de São Paulo, Avelino se mostra esperançoso em encontrar trabalho na área com facilidade. Mas as empresas desse segmento não têm mostrado disponibilidade em contratar. Em janeiro, a Sondagem de Serviços da Fundação Getúlio Vargas (FGV) mostrou que 27% das empresas de serviços administrativos e complementares pretendem demitir nos próximos três meses. Além disso, 34,8% reclamam de demanda insuficiente.
“Os serviços como um todo foram os últimos a entrar em trajetória de declínio. Houve desaceleração quando a perda de renda começou a ser mais acentuada, e esse processo ocorreu mais rápido do que em outros setores justamente por conta dessa demora”, explica o economista Silvio Sales, consultor da FGV e coordenador da sondagem. “O problema é para o mercado de trabalho como um todo. Assim como o crescimento do setor de serviços se deu com admissão de pessoas, a desaceleração agora é demitindo trabalhadores”, acrescenta. “Estamos longe de uma recuperação no setor.”
A auxiliar de serviços gerais Ednéa da Silva de Oliveira, de 33 anos, passou um ano e quatro meses desempregada e entregou dezenas de currículos. Na semana passada, finalmente foi selecionada para uma vaga na zona sul do Rio. Antes disso, a moradora de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, aceitou bicos de vendedora por R$ 30, improvisou como manicure e pediu dinheiro emprestado à mãe para pagar o transporte até os locais de entrevista. “Quando me ligaram para dar a notícia, chorei e tudo”, afirma, ciente da sorte cada vez mais rara.
Desempenho
O setor de serviços administrativos e complementares (que inclui atividades de limpeza, vigilância, recepção, telemarketing, cobrança e auxiliar administrativa) mergulhou em uma trajetória negativa em julho do ano passado, quando o volume encolheu 2,8% em relação a igual mês de 2014. Desde então, o ritmo de queda só se intensificou, até atingir uma perda de 6,4% em novembro, segundo o mesmo tipo de comparação, aponta o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Como essas funções são consideradas mais “essenciais”, as empresas relutaram em demitir. Mas a falta de perspectiva de recuperação na economia acabou falando mais alto. No trimestre até outubro de 2015, 429 mil pessoas que trabalham nos setores de informação, comunicação, serviços administrativos e complementares foram dispensadas em relação a igual período de 2014, segundo os dados mais recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua.
A pesquisa sobre o mercado de trabalho do IBGE engloba mais segmentos do que apenas os administrativos e complementares, mas dá uma boa pista do movimento que também é percebido por agências de emprego. Na Vagas.com, as candidaturas para o posto de auxiliar/operacional avançaram 25% em 2015 ante o ano anterior. No entanto, a oferta de vagas para essas funções cresceu apenas 6% no período.
“A oferta de vagas foi desacelerando durante o ano. O primeiro trimestre de 2015 teve um bom volume de vagas divulgadas, mas no último trimestre houve uma queda bem forte”, explica Rafael Urbano, especialista em Inteligência de Negócios da Vagas.com. Em janeiro deste ano, o cenário piorou ainda mais. A procura aumentou 37% em relação a igual mês de 2015, mas a oferta de vagas nesse segmento despencou 50%.
“É um indicativo de que pode continuar nesse mesmo patamar (de piora) nos próximos meses”, avalia Urbano. O aperto no número de vagas deve preocupar quem está desempregado, já que as empresas vão tentar aproveitar esse momento para melhorar a qualidade. “Quem ficar parado, sem buscar alguma qualificação, pode ficar de fora”, diz o especialista da Vagas.com.
No Rio de Janeiro, a empresa de recursos humanos Simetria também percebeu um encolhimento nas vagas disponíveis no segmento de serviços administrativos e complementares. “Se uma empresa tem duas portarias, acaba cortando uma. Ou então diminui o serviço de limpeza. Então, elas dispensam e não veem necessidade de contratar, porque o mercado continua parado”, afirma a diretora Neusa Nascimento.
Fonte: Estado de Minas, com Agência Estado
Data original da publicação: 10/02/2016