Os paradoxos e os efeitos da comunicação empreendida nos meios digitais são o tema de análise da oitava edição do Democracia Direitos Fundamentais.
Os textos estão disponíveis neste link: https://direitosfundamentais.org.br/editorial-democracia-e-antidemocracia-nas-redes/
Também é possível acompanhar as lives com os autores na TV DDF, canal da publicação no Youtube (inscreva-se): https://youtube.com/c/TVDDF.
Live de lançamento neste link: https://www.youtube.com/watch?v=0eBGmmEiuHU
As reflexões sobre o tema desta edição
Ao mesmo tempo que os novos dispositivos tecnológicos e as estruturas de conexão podem permitir a promoção do esclarecimento e os relacionamentos necessários para qualificar a democracia, a tomada de decisão e a disputa em torno de direitos e do bem comum, as práticas observadas demonstram que as redes são acionadas para obscurecer o diálogo, ocultar, dissimular. Essa nova realidade tecnológica, ética e estética não necessariamente vem garantindo os ganhos imaginados. A ideia de simetria, de transparência, de pluralidade, de oportunidade para vozes periféricas e, portanto, para a devida orientação do debate, não se realiza nestes tempos de oferta ilimitada e sem controle. As assimetrias permanecem, a opacidade dos processos se intensifica e o ambiente propício à desordem informacional permite o surgimento de fatores altamente nocivos à saúde de um regime democrático já em crise.
Nesse lócus informacional vertiginoso, caótico e pouco transparente circulam novos fluxos e novos modos de formação da opinião, transformando dinâmicas simbólicas de discussão política, muitas vezes sustentadas em versões que dispensam a verdade factual, em simulacros vazios e descartáveis, com consumo voraz e tempos exíguos.
É nesse cenário que a 8ª Edição do DDF se debruça. Nos textos publicados são discutidos o conceito e os riscos do que se convencionou chamar de fake News, também é observada a importância da memória da comunicação empreendida nos ambientes digitais públicos. Se busca ainda, compreender como valores morais e apelos religiosos são acessados para dar fôlego a um governo perverso e ineficaz, conhecer modos de resistência e combate nas trincheiras das redes sustentadas por ativistas e cidadãos, identificar as novas dimensões da socialização da política, da juventude e da sociedade, entender como pode ser formada uma rede de combate à desinformação a partir do reconhecimento de que existe um mercado rentável para as fake news e o ódio.
Confira abaixo, com os respectivos links, os artigos, temas e autores desta edição.
O deslizamento do debate público para a comunicação privada no Brasil de Bolsonaro. Neste texto a autora Muriel Felten, Mestre em comunicação pública pela UFRGS, recorta alguns aspectos da sua dissertação para entender de que forma o governo de Jair Bolsonaro corrói o sistema democrático em suas bases, enfraquecendo espaços de diálogo autônomos, racionais e com vistas à cooperação e tergiversando sobre temas vitais para a sociedade, que são da competência do Estado, para pautar o debate com temas comportamentais, mais suscetíveis ao reforço ideológico defendido pelo governo. Muriel olha especialmente para a Comunicação de Bolsonaro no Instagram e oferece dados surpreendentes.
Liberdade para que e para quem? A mobilização Bolsonarista nas redes sociais e as narrativas que envolvem liberdade de expressão e fake News. A autora Ana Julia Bonzanini Bernardi, Doutoranda em Ciência Política daUFRGS e Pesquisadora do Instituto Liberdade Digital (ILD), propõe a discussão sobre o bolsonarismo envolvendo os conceitos de fake news, pós verdade e diferentes narrativas sobre liberdade de expressão.
Fake news: um ponto de ebulição social é o texto do professor Mauricio Moura, Doutor em Economia e Política do Setor Público pela FGV-SP, Professor da Universidade George Washington e fundador do IDEIA. Maurício mostra uma pesquisa realizada pelo Instituto IDEIA com uma amostra representativa de 2.000 entrevistados no Brasil. Os resultados corroboram o estado de ebulição do tema na vida cotidiana brasileira e projetam uma preocupação com o futuro de política e das eleições. Para 8 em cada 10 brasileiros, notícias falsas (“fake news”) é um problema sério.
Novas configurações do capitalismo, economia e colonialismo como lócus da desinformação. Ana Regina Rêgo, Jornalista, Professora PPGCOM-UFPI e coordenadora da Rede Nacional de Combate à Desinformação -RNCD BRASIL, a partir do levantamento de vários dados, propõe nesse texto a reflexão sobre o modo como as plataformas desenvolvem suas estratégias de potencialização da lucratividade em escala crescente e constante. Para tanto, desenvolvem um modelo de negócios que mistura economia da atenção com economia da ação, por onde caminham vigilância e controle dos usuários a partir de uma arquitetura orquestrada por inteligência artificial distribuídas em algoritmos e bots que monitoram e extraem os dados de predição comportamental para uso direto pelas plataformas em negociação com os mercados inseridos em seus espaços e que também disputam atenção e visibilidade.
Existe um limite para a liberdade na democracia? Esta é a questão central no texto de Rodrigo Stumpf González, Cientista político e Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Rodrigo observa que o debate público a questão da liberdade de expressão e possíveis riscos que ela pode correr por intervenção do Estado volta à cena. Surpreendentemente, segundo o autor, o argumento de defesa do direito de manifestação tem sido esgrimido por pessoas e atores políticos que, de forma recorrente fazem uma avaliação positiva do regime autoritário iniciado com o golpe de 1964 e minimizam as violações de direitos ocorridas no período. O autor parte das possíveis definições de Democracia e das correspondentes justificativas para considerar que esta seria o melhor sistema.
Ativismo digital e democracia nas redes: atuação dos “internautas” na CPI da Covid. Este texto tem uma autoria que o coloca numa posição muito interessante e características dos novos fluxos e dinâmicas digitais. Trata-se do perfil Tesoureiros do Jair, perfil anônimo que acompanha e combate o bolsonarismo nas redes. Esse perfil organizou um grupo de voluntários que contribuíram com os senadores na CPI da Covid. É este relato que compõe o texto. Através das redes sociais, cidadãos, enviaram informações, vídeos, imagens, perguntas, denúncias e outros dados que se mostraram valiosos nos depoimentos. Acompanharam as oitivas e, pelas redes sociais, mostraram contradições e mentiras dos depoentes que, por diversas vezes, foram apontadas em tempo real pelos senadores durante as sessões. A “participação dos internautas”, que inicialmente foi até vista de forma cética por parte da mídia tradicional, foi reconhecida pelos membros da CPI, que, por diversas vezes, mostraram-se satisfeitos com a contribuição dessa parcela da sociedade.
Juventude, redes sociais e democracia. Jennifer Azambuja de Morais, professora do PPG em Ciência Política da UFRGS, apresenta nesta análise a pesquisa “Democracia, mídias e capital social: Um estudo comparativo de socialização política dos jovens no Sul do Brasil”, realizada pelo Núcleo de Pesquisa sobre América Latina (NUPESAL-UFRGS), realizada em 2015/2016 com jovens do ensino médio de 13 a 24 anos, de escolas públicas e privadas das três capitais do Sul do Brasil: Porto Alegre/RS, Florianópolis/SC e Curitiba/PR. Dentre os achados avaliados no texto está o fato de que os jovens utilizam mais a internet como meio e comunicação e para se informar sobre assuntos políticos. Para juventude, a internet e as redes sociais são agentes socializadores, e são a segunda instituição mais procurada após a família.
Mobilização e redes sociais no Brasil: da crise da Democracia ao populismo de Bolsonaro. Nesse artigo, Andressa Liegi Vieira Costa, Doutoranda e Mestre em Ciência Política pelo Instituto de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) da Universidade de Lisboa, observa as relações entre mídias sociais, populismo e novos desafios à Democracia. Andressa aponta uma tendência a nível mundial de apoio a líderes populistas, tendo especial atenção a eleição de Donald Trump como presidente dos Estados Unidos em 2016. Essa onda reflete, segundo a autora, um efeito de backlash cultural, como resposta negativa à emergência de valores progressistas, juntamente a um aumento da segurança econômica e de desigualdades crescentes. Segundo o texto, devemos levar em conta os processos de precarização nos mercados de trabalho associados às transformações do capitalismo, dos quais surgem o precariado. Assim, esse grupo gera também pressão por respostas do sistema político à situação de precariedade.
Acesso à informação e direito à memória nos sites governamentais brasileiros, da pesquisadora Ana Javes Luz, Jornalista, coordenadora executiva do Observatório da Comunicação Pública (OBCOMP) e integrante do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital, o foco são os poderes públicos constituídos como fontes confiáveis e com credibilidade, como uma das formas de combater a profusão de informações nocivas. Ana alerta, no entanto, que não basta que o Estado produza grande quantidade de dados e de informações. É preciso observar como essas informações são ofertadas ao conjunto de cidadãos e, também, se e como são preservadas para acesso presente e futuro. Pois, ao mesmo tempo em que o desenvolvimento das Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICs) facilitou a produção, o acesso e armazenamento de conteúdos, também facilitou a perda e o descarte de informações. Ana Javes, ainda em 2016, na sua dissertação, comprovou que no que tange à preservação das informações governamentais publicadas em sites oficiais brasileiros, não era possível encontrar notícias, campanhas publicitárias, arquivos de fotos, áudio e vídeo, dentre outros itens que tenham sido produzidos e publicados por gestões já encerradas. A pesquisa deu origem a um projeto de lei nº 2.431/2015 que prevê a responsabilização dos que gestores públicos que autorizarem, permitirem ou negligenciarem “a subtração de patrimônio digital institucional dos sítios oficiais sob a sua responsabilidade”, passando estes a serem “incumbidos da preservação e manutenção do conteúdo digital institucional em seu formato original disponível na rede mundial de computadores, garantindo o acesso público e facilitado aos usuários”[3]. O PL já foi apreciado por duas comissões da Câmara: a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) e Comissão de Cultura (CCULT).