Considerações sobre a inclusão de pessoas com diagnóstico de transtorno mental no trabalho

Giovanna Eleutério Levatti
Marianne Ramos Feijó
Edward Goulart Júnior
Mário Lázaro Camargo

Fonte: Revista Laborativa, São Paulo, v. 4, n. 2, p. 64-84, out. 2015.

Resumo: Revisão bibliográfica realizada nas bases de dados Scielo, Capes e BVS-Psi, norteou a discussão sobre a função inclusiva do trabalho, para pessoas com diagnóstico de transtorno mental. Dos artigos encontrados, os nacionais destacam as mudanças obtidas a partir da Reforma Psiquiátrica, e o os internacionais da precariedade do emprego oferecido àqueles que apresentaram transtorno mental. Destaca-se dado de estudo australiano, em que 50% dos empregadores entrevistados afirmaram que raramente ou nunca contratariam uma pessoa com transtorno psiquiátrico. Nossas considerações revelam, além da escassez de estudos sobre o tema, um cenário ainda marcado pela exclusão.

Sumário: 1. Introdução | 2. Objetivos e Metodologia | 3. Resultados e Discussões | 4. Considerações Finais | Referências

1. Introdução

O trabalho, considerado de fundamental importância na sociedade em que estamos inseridos, vem sendo apontado como fonte de realização e de saúde, mas também de adoecimento e de exclusão, dependendo do contexto e das formas por meio das quais é realizado (DEJOURS, 1992; LARANJEIRA, 1999; BENETTI et al., 2014; MENDES; CRUZ, 2004). O emprego, ou outra forma de trabalho remunerado, possibilita o sustento do indivíduo e a aquisição de bens importantes para sua inserção social.

Conforme os padrões socialmente estabelecidos, as pessoas que atuam no mercado de trabalho e, cujas atividades são consideradas bem- sucedidas, recebem importante reconhecimento — sobretudo na sociedade ocidental —, o que contribui para a sua inserção na sociedade de forma mais ampla e legitimada. A construção da identidade também é fortemente marcada pela identificação profissional, o que corrobora com a importância do trabalho na vida adulta. Jacques (1998) argumenta que a identidade do trabalhador começa a se constituir precocemente, especialmente pela identificação com modelos adultos e/ou pela inserção concreta no mundo do trabalho, ressaltando que os diferentes espaços de trabalho oferecidos constituir-se-ão em oportunidades diferenciadas para a aquisição de atributos qualificativos da identidade de trabalhador.

Para Murta e Tróccoli (2004), o trabalho é fonte de autorrealização, de satisfação de necessidades, de manutenção de relações interpessoais e de sobrevivência. A organização de trabalho, por sua vez, pode se tornar parte importante da rede social pessoal de trabalhadores, na medida em que proporciona o contato com o trabalho, com o aprendizado e com as pessoas. Colegas de trabalho podem se tornar amigos e atuar como fonte de apoio, de companhia social e de encaminhamento a serviços, dentre outras funções exercidas pela rede social pessoal, grupo de pertencimento, cuja importância para a construção da identidade de pessoas e para a sua saúde é fundamental (FEIJÓ, 2006; SLUZKI, 1997).

Aqueles que, por motivos de saúde, ficam impedidos de retornar ao trabalho, perdem um significativo espaço social e um meio de obtenção de recursos materiais e afetivos, de apoio e de fortalecimento da autoestima e da autonomia, o que aumenta sua vulnerabilidade (AYRES et al., 2003; LEVATTI; FEIJÓ, 2014). Nem sempre, porém, há de fato impossibilidade de readaptação ou de inclusão no trabalho por pessoas que sofreram acidentes, que possuem deficiências, doenças mentais ou doenças crônicas. Muitos são mantidos ou se mantêm sem trabalhar por causa de preconceitos, medos, vergonha, falta de informação, de recursos materiais ou de contratantes e colegas de trabalho dispostos a lidar com as diferenças e com o novo.

Os resultados do Censo 2010 apontaram para a existência de 45.606.048 pessoas que declararam ter pelo menos uma das deficiências investigadas (deficiências de ordem ou afecção física, auditiva, visual, mental e múltipla), correspondendo a 23,9% da população brasileira. Dessas pessoas, 38.473.702 se encontravam em áreas urbanas e 7.132.347, em áreas rurais. Comparado ao resultado anterior — Censo 2000, onde tínhamos um total de 24,5 milhões de pessoas com deficiência, ou seja, 14,5% da população —, isso equivale a um aumento, em 10 anos, de 9,4 % (IBGE, 2010). Isso significa que vem se ampliando quantitativa e qualitativamente o desafio de incluir as pessoas com deficiência no mercado de trabalho brasileiro. Portanto, não obstante a existência de um “aparente” esforço marcado por ações afirmativas — como a chamada Lei de Cotas, Lei nº. 8.213/91 (BRASIL, 1991) —, decretos e uma instituída política nacional pró-inclusão, há ainda um grande (e crescente) número de pessoas com deficiência sendo alijadas do direito de experienciar essa relação com o trabalho e, por meio dela, avançar positivamente no processo de sua inclusão social.

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Giovanna Eleutério Levatti é graduada em Psicologia pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), Faculdade de Ciências, Campus de Bauru e mestranda do Programa de Pós-Graduação em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem (Unesp/Bauru).

Marianne Ramos Feijó é Psicóloga, Doutora em Psicologia Clínica (PUC/SP), Professora Assistente Doutora no Departamento de Psicologia da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), Faculdade de Ciências, Campus de Bauru. Membro do Grupo de Pesquisa CNPq/Unesp “Psicologia Organizacional e do Trabalho”, Linha de Pesquisa “Indivíduo, contextos, processos e intervenções organizacionais”.

Edward Goulart Júnior é Psicólogo, Doutor em Psicologia (PUC Campinas), Professor Assistente Doutor no Departamento de Psicologia da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), Faculdade de Ciências, Campus de Bauru. Membro do Grupo de Pesquisa CNPq/Unesp “Psicologia Organizacional e do Trabalho”, Linha de Pesquisa “Indivíduo, contextos, processos e intervenções organizacionais”.

Mário Lázaro Camargo é Psicólogo, Doutor em Psicologia (FFCLRP/USP), Professor Assistente Doutor no Departamento de Psicologia da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), Faculdade de Ciências, Campus de Bauru. Membro do Grupo de Pesquisa CNPq/Unesp “Psicologia Organizacional e do Trabalho”, Linha de Pesquisa “Indivíduo, contextos, processos e intervenções organizacionais”.

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