Competências e profissionalização no “trabalho informal”

Abdallah Nouroudine

Fonte: Trabalho & Educação, Belo Horizonte, v. 25, n. 3, p. 11-54, set./dez. 2016.

Tradução: Estela Vieira

Revisão: Daisy Moreira Cunha

Resumo: Neste artigo propomos uma reflexão sobre as competências, a profissionalização e o “trabalho informal”. Trata-se, de um lado, das atividades e ofícios que existem de fato sem estar inscritos em um processo de profissionalização e, por outro lado, de percursos de trabalho aguardando reconhecimento que permitiria aos atores relacionados de ganharem status de “profissionais”. Nosso questionamento é o seguinte: em que condições a profissionalização das atividades realizadas no “trabalho informal” é possível? Levantamos a hipótese de que a profissionalização das atividades realizadas no “trabalho informal” passa pelo reconhecimento, em diversas modalidades, das competências que nele são produzidas. Em nossas reflexões, analisamos a profissionalização segundo formas particulares em relação com as situações de trabalho específicas e as situações de vida singulares dos atores na sociedade em que se encontram. Para que a ligação que sugerimos entre as competências e profissionalização possa ser efetuada eficazmente, sugerimos que uma e outra noção sejam consideradas enquanto realidades multidimensionais e complexas.

Sumário: Introdução | 1. Atividade, experiência e “competência para viver” | 2. “Trabalho informal”, normas e saberes | 3. Saberes através dos “ingredientes de competência” | 4. Competências profissionalizantes: modalidades de validação de saberes | A dimensão técnica | A dimensão organizacional | A dimensão econômica | A dimensão social | A dimensão ética | A dimensão política | Conclusão: a profissionalização como postura | Referências

Introdução

A questão da relação entre competências e profissionalização carrega interesses consideráveis nos planos teórico e prático. Isso é verdade para a maioria dos países, mas é ainda mais para os países do terceiro mundo, onde o trabalho dito informal e o trabalho não mercantil ocupam um lugar importante. As atividades, em grande volume, que são realizadas nesses dois domínios da atividade permitem frequentemente responder a uma demanda local de produção de bens ou prestação de serviços com resultados relativamente satisfatórios. Isso significa que, de um lado, o trabalho realizado nessas condições responde às necessidades reais e, por outro lado, que as atividades realizadas nessas configurações mobilizam saberes. Quando contratamos os serviços de um mecânico, um carpinteiro, um canalizador, um soldador… que exercem o “trabalho informal”, pode-se perceber que, geralmente, as atividades que são realizadas são eficazes. É o mesmo para a força de trabalho que se mobiliza no momento de uma prestação social de serviço não mercantil regida segundo as regras do dom e do contradom a fim de construir uma casa, arar um campo, cozinhar pratos para uma cerimônia de casamento, etc. Essa força laboral no trabalho mercantil não será menos eficaz que no trabalho não mercantil, sem o qual esse sistema não seria assim estabelecido no uso das sociedades de trabalho não mercantil. Com a existência desse campo de atividades socialmente e economicamente úteis e, além disso, executadas eficazmente, emerge com urgência o problema da profissionalização. O objeto visado nesta reflexão diz respeito a ofícios que existem de fato sem serem inscritos em um processo de profissionalização e a percursos personalizados de trabalho na espera do reconhecimento que permitiria aos interessados se posicionar como profissionais no trabalho que eles executam diariamente. Vamos examinar em particular o caso da profissionalização das atividades do “trabalho informal”, deixando, por hora, em suspenso as atividades de trabalho não mercantil. Em que condições a profissionalização das atividades realizadas no “trabalho informal” é possível? Propomos a hipótese de que seja na situação em que a profissionalização das atividades realizadas no trabalho informal passe pelo reconhecimento, de diversas maneiras, das competências que são produzidas no ofício. A partir dessa afirmação geral, a profissionalização só poderia assumir formas particulares em relação às situações de trabalho específicas e a situações de vida singulares em uma dada sociedade. Para que a ligação que sugerimos entre as competências e a profissionalização possa ser realizada evitando-se todo reducionismo, é necessário que uma e outra noção sejam capturadas na sua complexidade. Os “ingredientes da competência” (SCHWARTZ, 2000), ideia segundo a qual a competência é analisada como uma noção complexa que reúne em si saberes de diferentes naturezas, de um lado, e a abordagem multidimensional da profissionalização proposta por Janine Roche (1999), por outro, são a fundamentação a nos permitir prosseguir com a tentativa de articulação entre competência e profissionalização capaz de ajudar a tratar o caso particular de atividades no “trabalho informal”. Nessa reflexão, a noção de profissionalização será estudada em relação à atividade e à experiência (primeira parte) e tomando o caso do “trabalho informal” (segunda parte). A questão do saber na profissionalização das atividades e dos ofícios será tratada na análise dos “ingredientes da competência” (terceira parte) e na revisão dos métodos de validação do saber (quarta parte).

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Abdallah Nouroudine é Doutor em Filosofa pela Aix Marseille Université, Diretor Geral do Centre National de Documentation et de Recherche Scientifque (CNDRS)/Comores, Professor na Université des Comores.

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