CEPAL e OPAS: ”sem saúde não haverá recuperação econômica sustentável”

A região mais desigual do mundo em termos de renda e riqueza, a América Latina e Caribe, também  foi a que mais sofreu com a pandemia de Covid-19. Embora conte com 8,4% da população mundial, tivemos 35% das mortes e 20% dos casos registrados de Covid. Foram 45,7 milhões de infectados com mais de 1,5 milhão de mortes, com evidências de “uma alta correlação entre a vulnerabilidade socioeconômica e o nível de gravidade e morte por COVID-19”.

A região apresentou no ano passado a maior contração econômica em 120 anos e o pior desempenho entre as regiões em desenvolvimento. “O crescimento praticamente nulo nos cinco anos anteriores à crise, juntamente com a forte contração em 2020 (-6,8%), traduziram-se numa queda histórica do emprego e num aumento sem precedentes do desemprego, a par de aumentos significativos da pobreza, da pobreza extrema e da desigualdade, que agravaram ainda mais os problemas estruturais da região”, afirmam a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) e a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS)

Acelerar a vacinação, ampliar o investimento público e fortalecer estados de bem-estar são algumas medidas propostas pela CEPAL e pela OPAS. Segue o comunicado das agências da ONU:

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A CEPAL e a OPAS pedem aos governos latino-americanos para acelerar os processos de vacinação, transformar os sistemas de saúde e construir estados de bem-estar para controlar a pandemia e avançar na recuperação da região.

Ambas as agências das Nações Unidas divulgaram um novo relatório conjunto que aborda o impacto da pandemia na saúde, economia e desenvolvimento social da América Latina e do Caribe.

Em um novo relatório conjunto divulgado hoje, a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) e a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) instam os governos da região a acelerar os processos de vacinação, transformar os sistemas de saúde, ampliar o investimento público e fortalecer estados de bem-estar, entre outras medidas, controlar a crise da saúde no curto prazo e caminhar para uma recuperação transformadora com equidade e sustentabilidade ambiental, em consonância com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

“A pandemia evidenciou a necessidade de construir uma agenda de saúde pública com uma perspectiva abrangente e integrada na América Latina e no Caribe, que reconheça a interdependência que existe entre as dimensões sanitária, social, econômica e ambiental”, afirma o documento La prolongación de la crisis sanitaria y su impacto en la salud, la economía y el desarrollo social, [O prolongamento da crise sanitária e seu impacto na saúde, na economia e no desenvolvimento social] anunciado hoje em entrevista coletiva por Alicia Bárcena, Secretária Executiva da CEPAL, e Carissa F. Etienne, Diretora da OPAS.

A pandemia de COVID-19 já ceifou pouco mais de 1,5 milhão de vidas na América Latina e no Caribe e levou a mais de 45,7 milhões de casos confirmados desde seu aparecimento na região em fevereiro de 2020. A região é responsável por cerca de um quinto dos casos confirmados de COVID-19 e cerca de 30% das mortes em todo o mundo, apesar de constituir apenas 8,4% da população mundial.

Em 2020, como resultado da crise de saúde, a região da América Latina e do Caribe experimentou a maior contração econômica em 120 anos e foi a região com pior desempenho de todas as regiões em desenvolvimento. O crescimento praticamente nulo nos cinco anos anteriores à crise, juntamente com a forte contração em 2020 (-6,8%), traduziram-se numa queda histórica do emprego e num aumento sem precedentes do desemprego, a par de aumentos significativos da pobreza, da pobreza extrema e da desigualdade, que agravaram ainda mais os problemas estruturais da região. Para 2021 espera-se uma taxa média de crescimento de 5,9%, enquanto em 2022 é de 2,9%. No entanto, essa expansão não será suficiente para trazer toda a região de volta ao seu nível de PIB anterior à crise.

“Junto com as fragilidades estruturais dos sistemas de saúde para enfrentar a pandemia, o prolongamento da crise sanitária está intimamente relacionado ao lento e desigual andamento dos processos de vacinação na região e às dificuldades dos países em manter as medidas sociais e de saúde pública nos níveis adequados ”, sustenta o relatório. Em média, na América Latina e no Caribe, 39% da população tem vacinação completa. Embora países como Chile e Uruguai excedam 70%, 25 dos 49 países e territórios da região não excedem 40% da população total com um programa completo de vacinação.

A assimetria global e a fragmentação institucional observada na América Latina e no Caribe em termos de acesso às vacinas contra a COVID-19 demonstram a urgência de fortalecer os mecanismos de coordenação e integração regional, bem como a cooperação internacional, enfatizam ambas as instituições. Esta é uma oportunidade para desenvolver capacidades produtivas e tecnológicas e reformular estratégias e políticas destinadas a fortalecer a capacidade produtiva regional de vacinas e medicamentos essenciais para o consumo na própria região. Nesse sentido, destaca-se o Plano de Autossuficiência em Saúde para a América Latina e o Caribe, elaborado pela CEPAL e aprovado pelos países da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC) em setembro, bem como a Plataforma Regional da OPAS para o Avanço na Produção de Vacinas e outras Tecnologias em Saúde para COVID-19 nas Américas lançado em setembro deste ano para facilitar a transferência de tecnologia, inovação e o desenvolvimento de tecnologias de saúde contra COVID-19, incluindo o avanço com o desenvolvimento de uma vacina de mRNA na região.

O documento destaca que a persistência da crise evidenciou a necessidade de transformar os sistemas de saúde da América Latina e do Caribe, que mesmo antes da pandemia se caracterizavam pela fragilidade da capacidade de resposta dos serviços de saúde, seu subfinanciamento, com um nível muito inferior ao acordo regional de 6% do PIB, e à fragmentação e segmentação do sistema de saúde. Essas condições constituem as causas estruturais das iniquidades no acesso aos serviços de saúde e da persistência de elevados gastos diretos, alertam a CEPAL e a OPAS. Na verdade, ambas as organizações afirmam no relatório “uma alta correlação entre a vulnerabilidade socioeconômica e o nível de gravidade e morte por COVID-19.”

Da mesma forma, os déficits de investimento público nos sistemas de saúde da região se traduzem em fraca liderança das autoridades sanitárias, uma relativa escassez de recursos humanos, com uma disponibilidade média de 20 médicos por 10.000 habitantes, muito abaixo dos parâmetros recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), e nas limitações na capacidade resolutiva da rede de serviços de saúde, principalmente no primeiro nível de atenção.

“Fizemos a transição da emergência em 2020 para a prolongada crise de saúde em 2021. No ano passado argumentamos que sem saúde não há economia e hoje reiteramos que sem saúde não haverá recuperação econômica sustentável. A prioridade continua sendo a necessidade de controlar a crise de saúde, a partir de um enfoque integral e acelerando os processos de vacinação da população. Ficou evidente a importância de fortalecer a capacidade da região de produzir vacinas e medicamentos e superar a dependência externa que enfrentou durante esta pandemia”, destacou Alicia Bárcena, Secretária Executiva da CEPAL.

“O prolongamento da pandemia COVID-19 na região mais desigual do mundo destacou a centralidade da saúde para o bem-estar, a economia e o desenvolvimento. É hora de transformar os sistemas de saúde da América Latina e do Caribe com base no enfoque da atenção primária à saúde, para acelerar a recuperação após a pandemia, recuperar e manter as conquistas em saúde pública e retornar ao caminho da saúde universal, garantindo o acesso à saúde e vacinação para todos aqueles que precisam”, disse Carissa F. Etienne, Diretora da OPAS.

O documento também expressa preocupação com a falta de acesso aos serviços de saúde que parte da população vivenciou durante a pandemia devido à saturação observada. Segundo informações oficiais, em 2021, 35% dos países teriam registrado algum tipo de interrupção na prestação dos serviços integrados de saúde, que chegou a 55% no caso dos países que declararam interrupção dos serviços prestados no primeiro nível de atenção .

No relatório, a CEPAL e a OPAS destacam que “o Estado desempenhou um papel fundamental e indispensável na resposta aos desafios da pandemia e deve continuar desempenhando esse papel para dar um novo rumo às políticas públicas, para construir sociedades mais igualitárias, inclusivas e resilientes”.

Entre suas recomendações específicas, ambas as instituições apontam para a necessidade de: incorporar o enfoque intersetorial nas políticas de saúde; transformar os sistemas de saúde levando em consideração a centralidade da atenção primária à saúde, fortalecer o exercício das funções essenciais de saúde pública, a equidade em saúde, a sustentabilidade financeira e o papel do Estado; acelerar os processos de vacinação em massa e manter as medidas sociais e de saúde pública em níveis adequados para controlar a crise de saúde; alcançar avanços tecnológicos para a saúde e o desenvolvimento sustentável em nível regional; acelerar os processos de transformação digital do setor saúde; manter políticas fiscais expansivas e fortalecer o investimento público para avançar em direção a uma recuperação transformadora; e consolidar os estados de bem-estar com políticas universais, redistributivas e solidárias com enfoque de direitos.

Fonte: Carta Maior, com Cepal
Data original da publicação: 14/10/2021

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