As promessas, os resultados e a necessidade de revisão das leis trabalhistas

Fotografia: Agência Brasil

No Brasil, o movimento de desmonte se inicia ainda em 2016, quando, no contexto de esgarçamento institucional, as primeiras alterações nos direitos começaram a tomar corpo.

Fernando Amorim Teixeira

Fonte: GGN, com blog Democracia e Economia  – Desenvolvimento, Finanças e Política
Data original da publicação: 17/08/2022

Desde o início da década de 2010, dezenas de países promoveram alterações em suas leis trabalhistas ao redor do mundo. Tais medidas, partiam do pressuposto de que mudanças importantes estavam em curso nas estruturas produtivas, com o advento de novas tecnologias, e que as leis vigentes acabavam prejudicando a capacidade das empresas de se manterem competitivas e realizarem novas contratações.

No Brasil, o movimento de desmonte se inicia ainda em 2016, quando, no contexto de esgarçamento institucional, as primeiras alterações nos direitos começaram a tomar corpo.  Desde então, diversas outras pequenas reformas foram sendo implementadas, evidenciando, por um lado, o baixo nível de planejamento e coordenação de seus patrocinadores e, por outro, o oportunismo para “passar a boiada” enquanto é tempo.

A Lei 13.467/2017, mais conhecida como Reforma Trabalhista, pode ser considerada o expoente máximo das mudanças em nosso Sistema de Relações de Trabalho (SRT). Tal reforma, impactou as relações capital-trabalho através da criação de novas formas de contratação, teve impacto na organização e financiamento sindical, consequências na Justiça do Trabalho, entre outros.

A maneira como a lei foi encaminhada pelo Congresso Nacional, a rapidez com que foi aprovada e o teor do texto, por sua vez, não deixavam dúvidas sobre seu caráter: não houve, de fato, qualquer consulta ou participação dos representantes dos trabalhadores, tendo sido, portanto, construída de forma unilateral, de cima pra baixo.

Deve-se ressaltar que, no caso brasileiro, tais reformas vinham acompanhadas de exacerbado otimismo por parte dos governos Temer/Bolsonaro e grandes grupos empresariais e contou com forte apelo na mídia corporativa. A alegação era de que a CLT era antiga e inadequada para os tempos atuais, e a solução passava por abandonar o princípio da hipossuficiência, partindo da prerrogativa de que patrões e empregados estariam em condições de igualdade para negociarem.

Por essa perspectiva, o Estado, como sempre, apenas gerava ineficiências e, portanto, não mais deveria arbitrar essas relações. Já os sindicatos, como reguladores sociais, deveriam ser enfraquecidos permitindo que os salários fossem mais flexíveis, gerando menos rigidezes na economia.

A melhoria do ambiente de negócios, como resultante, faria com que a fatídica “fada da confiança” reaparecesse em terras brasileiras, gerando aumento dos investimentos e um consequente ciclo virtuoso. Dentre as promessas, haveria geração de 6 milhões de empregos formais e redução nos níveis de informalidade, o que permitiria ao país se aproximar do restante do mundo, não havendo mais entraves para a chegada da modernidade. A máxima de que a população deveria escolher entre mais empregos ou mais direitos, poderia então ser testada.

Após mais de 5 anos do início desse processo, podemos, a partir de indicadores selecionados, avaliar alguns resultados e a pertinência ou não, de realizarmos uma revisão na legislação trabalhista no Brasil. Vamos aos dados:

No início de 2017, a taxa de desemprego medida pela PNAD-Contínua (IBGE), se situava na casa dos 11%, patamar muito similar ao verificado nos primeiros meses de 2022. No que se refere aos níveis de informalidade, ainda segundo a PNAD, saímos de 36% para algo em torno de 40% no mesmo período, ou seja, houve uma piora substancial.

Quando olhamos para os processos negociais, o cenário também preocupa. Do ponto de vista do número de acordos e convenções coletivas registrados no Mediador (MTE), eram mais de 47 mil antes da reforma, não chegando aos 42 mil, no final de 2021. Quanto aos reajustes salariais, em 2017, cerca de 63% das categorias conquistaram ganho real, isto é, os salários de seus representados foram reajustados acima da inflação medida pelo INPC/IBGE. Esse percentual caiu para 15,8% no ano passado, segundo o DIEESE.

Por esse breve quadro, podemos afirmar que, no pós-reforma trabalhista, houve piora em alguns indicadores associados ao mercado de trabalho, enquanto em outros não foi possível visualizar a melhora prometida. Na prática, a geração de emprego não ocorreu nos níveis necessários, houve aumento da informalidade (o que significa maior precarização), os sindicatos de trabalhadores enfrentaram maior dificuldade em negociar com os patrões e as categorias formalizadas tiveram, em sua maioria, perda no poder de compra dos salários. Desta forma, a retórica de que uma flexibilização nas leis laborais colocaria o Brasil no caminho da modernidade se revelou uma falácia.

Macroeconomicamente, a soma desses fatores se manifesta em queda na demanda agregada, impactando negativamente a atividade produtiva. Ao invés de um ciclo virtuoso, geram-se restrições ao crescimento e ao investimento no curto e médio prazo. Diante disso, considera-se urgente uma revisão do atual Sistema de Relações de Trabalho que permita, enfim, que o país possa recomeçar a construir as bases para o desenvolvimento econômico e social tão almejado.

Fernando Amorim Teixeira é doutorando pelo PPGE/UFF, pesquisador do Grupo de Pesquisa em Financeirização e Desenvolvimento (FINDE), Professor Substituto do Instituto de Relações Internacionais e Defesa da UFRJ e Técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE).

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