Sandra Beatris Diniz Ebling
Elza Maria Fonseca Falkembach
Lizandra Andrade Nascimento
Marciele Moreira da Silva
Silvana de Oliveira Silva
Patrícia Stangherlin Minussi
Fonte: Trabalho, Educação e Saúde, Rio de Janeiro, v. 13, n. 3, p. 581-596, set./dez. 2015.
Resumo: Trata-se de um estudo de natureza qualitativa, de caráter exploratório e descritivo, desenvolvido em um assentamento rural do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra da região centro-ocidental do Rio Grande do Sul. Busca apresentar e discutir as concepções das mulheres assentadas em relação ao trabalho no interior do assentamento, abordando suas implicações na saúde da mulher. Os dados foram reunidos no decorrer de 2011, com nove mulheres residentes no assentamento, por meio de entrevista semiestruturada. Com base na análise temática, os resultados indicaram que o trabalho da mulher assentada é amplo e nem sempre reconhecido. No que se refere à saúde, constatou-se que as cidadãs na condição de assentadas estão expostas a vulnerabilidades, pois vivem em um espaço no qual o trabalho é eminentemente braçal, expostas aos fenômenos e instabilidades da natureza. Outra constatação resultante da pesquisa é a ampliação do espaço de participação da mulher nos negócios da família, inclusive com linhas de crédito específicas para as agricultoras, o que contribui para a emancipação feminina. Portanto, parece relevante a união de esforços no sentido de ampliar ações que subsidiem a elaboração de políticas públicas abrangentes ao contexto da realidade em que essas mulheres se inserem.
Sumário: Introdução | Caminho metodológico | As mulheres e suas vozes | A mulher e a ‘lida’ | A mulher e a ‘lida’ no contexto da saúde | Considerações finais | Notas | Referências
Introdução
Debater movimentos sociais significa pensar em ações sociais coletivas, de traços sociopolíticos e culturais que possibilitem novas formas de os sujeitos se organizarem, “articulando ações coletivas que agem como resistência à exclusão e lutam pela inclusão social” (Gohn, 2003, p. 15). Dentre tais movimentos, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), no Brasil, apresenta-se como um espaço de resistência à histórica acumulação característica do capitalismo. Por isso, torna-se imprescindível compreender como se organizam no espaço conquistado o ‘assentamento’, principalmente no que tange às mulheres,7 e suas ‘lidas’.
A condição de mulher no espaço do MST abrange as dificuldades no acesso às informações e ações de saúde, as quais se relacionam às desigualdades das relações de gênero; às grandes distâncias entre a residência ou o trabalho e os serviços de saúde; e ao acesso a tais serviços. Todos esses elementos relacionam-se com a pouca sensibilização e a fragilidade da rede de saúde para trabalhar com a especificidade dos agravos derivados do trabalho no campo (Brasil, 2004).
O adoecimento e a morte de cada indivíduo revelam os impactos e consequências das desigualdades sociais, econômicas e culturais. De acordo com os indicadores de saúde, as populações expostas a frágeis condições de vida estão mais vulneráveis e vivem menos.
Nesse sentido, o Relatório do Fundo de População das Nações Unidas de 2002 traça um panorama sobre a condição da mulher, demonstrando que, em relação aos homens, o número de mulheres que vivem em situação de pobreza é superior, assim como o número de horas que as mulheres trabalham é maior. Este estudo destaca que metade do tempo das mulheres é gasto em atividades não remuneradas, o que diminui o seu acesso aos bens sociais, inclusive aos serviços de saúde (Brasil, 2004).
São muitos os estudos que, na atualidade, abordam o tema da mulher rural. Entretanto, esperamos avançar em relação aos estudos meramente biologicistas da mulher, buscando compreender as especificidades da vida no assentamento e direcionando as análises para as relações das mulheres no contexto do trabalho e saúde.
Assim, dentre as questões a serem discutidas, está a complexidade do trabalho feminino, no que se refere à jornada e à multiplicidade de tarefas desempenhadas pela mulher. Estudos desenvolvidos por Schwendler (2006),Salvaro (2004) e Melo (2001) salientam a dupla ou tripla jornada de trabalho da mulher assentada, mostrando que, no final do dia de atividades na lavoura, ela ainda tem a preocupação com os afazeres do domicílio, o cuidado com as crianças e, nesse entremeio, se depara com as atividades de militante na luta social.
Vale salientar que os afazeres domésticos, comumente, não são reconhecidos como trabalho. A esse respeito, Schwendler argumenta que
mesmo a mulher participando do trabalho produtivo, este é muitas vezes visto como uma ‘ajuda’. Da mesma forma, quando o homem realiza alguma atividade no lar, ele também estaria ‘ajudando’ a mulher” (Schwendler, 2006, p. 2).
As atividades ditas femininas e as tarefas ditas masculinas são aprendidas e transmitidas como ‘naturais’ entre muitos assentados e assentadas. Mesmo em espaços de lutas por mudanças sociais, atitudes conservadoras interferem fortemente na definição do modo de se tornar homem ou mulher em nossa sociedade. Com base nas questões mencionadas, este artigo busca apresentar e discutir as concepções das mulheres assentadas em relação ao trabalho no interior do assentamento, abordando suas implicações na saúde da mulher.
Sandra Beatris Diniz Ebling. Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, Santiago, Rio Grande do Sul, Brasil
Elza Maria Fonseca Falkembach. Universidade Regional do Noroeste do Rio Grande do Sul, Programa de Pós-Graduação em Educação nas Ciências, Ijuí, Rio Grande do Sul, Brasil.
Lizandra Andrade Nascimento. Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, Campus São Luiz Gonzaga, Rio Grande do Sul, Brasil.
Marciele Moreira da Silva. Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, Santiago, Rio Grande do Sul, Brasil
Silvana de Oliveira Silva. Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, Santiago, Rio Grande do Sul, Brasil
Patrícia Stangherlin Minussi. Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões, Santiago, Rio Grande do Sul, Brasil