A promessa incumprida de mais tempo livre ao trabalhador

Leonardo Lani de Abreu

Resumo: A luta pela limitação da jornada de trabalho travada entre a burguesia e o proletariado, ainda no Século XIX, redundou nas primeiras leis trabalhistas. A crescente mecanização e automatização produtiva gerou uma aposta numa sociedade sem trabalho, na qual os esforços humanos seriam assumidos pelas máquinas. Contudo, a tendência dominante é de uma jornada de trabalho cada vez mais dilatada, ainda que sob roupagens “flexíveis”. A sensação generalizada é a de que, a despeito do extraordinário desenvolvimento tecnológico, jamais se trabalhou tanto. Neste contexto, a jornada 6X1 se revela como a ponta do iceberg da superexploração capitalista, e sua compreensão pode fornecer subsídios para descortinar a lógica do sistema econômico, a fim de subvertê-lo.

Sumário: Introdução | A propensão capitalista à força bruta | O mito do capitalismo justo | O potencial de insurgência da luta contra a escala 6X1 | Considerações finais

Introdução

A liberdade humana é inconcebível sem o tempo, a ponto de se poder afirmar que, na ausência do tempo livre, isto é, o período temporal em que uma pessoa não está obrigada a trabalhar ou a realizar outras atividades impostas, inexiste também a liberdade real. Quem não é dotado de tempo livre tem pouca margem para pensar, criar, estudar, descansar ou participar da vida política. O resultado dessa privação é o surgimento em larga escala de indivíduos autocentrados, intelectualmente embotados, esgotados, ou, numa palavra, infelizes. Esta é a razão por que Marx (2011) identificou a riqueza genuína como o tempo livre dispensado ao alcance da plenitude do desenvolvimento humano, em vez do acúmulo de bens materiais. 

Em direção contrária, as jornadas longas e intensas, o empobrecimento do tempo livre e o rebaixamento da vida à função econômica pura e simples, na quadra histórica atual, patenteiam a subordinação do tempo às lógicas do trabalho, da produtividade irrestrita e do lucro. Este sequestro do tempo é, ao fim e ao cabo, uma diminuição da liberdade. Apesar de formalmente “livres”, as pessoas ou não dispõem de tempo para exercerem sua liberdade, ou, quando arranjam algum tempo livre, estão fatigadas e/ou sem recursos para aproveitá-lo. Resta saber por que um regime tão adverso à emancipação humana apresenta tanta resiliência, sumarizada na doutrina TINA, acrônimo de “There Is No Alternative”, verdadeiro mantra de Margareth Thatcher (1925-2013), ex-primeira-ministra do Reino Unido. 

A resposta mais óbvia é a de que a sobrevida do sistema capitalista advém da dominação da classe trabalhadora. E não poderia ser de outra maneira, pois a economia burguesa, ao privar a esmagadora maioria dos cidadãos dos meios básicos para uma existência digna e frutífera, só consegue subsistir mediante o emprego da violência, nas suas mais diversas modalidades. Parafraseando o lema do brasão chileno, trata-se de uma coercitividade estabelecida “pela razão ou pela força”. O presente artigo se propõe a analisar essas duas estratégias de perpetuação do capital, no intuito de desnaturalizá-las.

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Leonardo Lani de Abreu é doutor em Educação pela Universidade Federal do Paraná, Professor do curso de Direito da Universidade Federal do Acre e Superintendente Regional do Trabalho no Acre.


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