A disciplina do trabalho entre os trabalhadores autogestionados das empresas recuperadas na Argentina

Renake Bertholdo David das Neves

Fonte: Revista da Sociedade Brasileira de Economia Política, Niterói, n. 40, p. 38-60, fev./maio 2015.

Resumo: Este artigo busca retratar as principais características da disciplina do trabalho nas Empresas Recuperadas por seus Trabalhadores (ERT) na Argentina, movimento que vem se desenvolvendo no país desde a década de 1990. Após uma introdução que procura prover o leitor com algumas noções gerais sobre as ERT argentinas, como contexto de surgimento, setores econômicos abrangidos, número de trabalhadores, processo de luta para chegar à autogestão etc., o texto divide-se em duas partes. Primeiramente, faz uma discussão sobre a importância do controle do tempo e da disciplina do trabalho no capitalismo, dialogando com Marx, Braverman, Postone, Thompson, Coriat e Perrot. Feito esse percurso, passamos a descrever as configurações da disciplina do trabalho nas empresas recuperadas, geridas por seus trabalhadores, e a analisar as similitudes e diferenças entre a disciplina autogestionada e a heterogestionada a partir da experiência dos trabalhadores das ERT.

Sumário: Noções gerais sobre as empresas recuperadas na Argentina | Capital, tempo e disciplina do trabalho | A experiência dos trabalhadores das empresas recuperadas: tempo e disciplina | Bibliografia

Na Argentina, a partir da década de 1970, a reconfiguração da arena da luta de classes foi pontuada por derrotas dolorosas para os grupos subalternos, impostas através da coerção (que chegou à eliminação física sistematizada), da cooptação e do consenso. As transformações econômicas e políticas ocorridas nas últimas décadas, intensificadas nos anos 90, geraram condições extremamente favoráveis de extração de sobretrabalho através da intensa precarização das condições de trabalho do proletariado, obtida por meio de uma série de mudanças na organização do trabalho no chão de fábrica e de uma ampla expropriação secundária. O traço mais desolador desse cenário dramático, do ponto de vista dos proletários, foi a explosão do mundo do desemprego. A partir de 1994, a taxa de desemprego sempre esteve acima dos dois dígitos e, ao longo de toda a década, o número de desempregados incrementou-se em 146%. (Rapoport, 2000, p. 1020) Em 2001, quando explodiu a crise econômica mais devastadora da história do país e que desembocou no Argentinazo, a taxa de desemprego atingiu o índice de 18,3% da População Economicamente Ativa (PEA). (INDEC) Entre os chefes de família, o desemprego cresceu 40%. No ano seguinte, 22% da força de trabalho na Argentina encontrava-se desempregada, além de outros 19,3% em condições de subocupação horária, i.e., ocupados que trabalham menos de 35 horas semanais por causas involuntárias e desejam trabalhar mais horas. (ibidem)

O fenômeno das Empresas Recuperadas por seus Trabalhadores (ERT) começa a tomar corpo em meados da década de 1990. Trabalhadores que se encontravam frente ao iminente fechamento das empresas onde eram assalariados, devido a processos de falência, convocatória de credores, ou, simplesmente, ao abandono por parte de seus proprietários, começaram a se organizar em busca de uma solução que não os lançassem nas fileiras do exército industrial reserva. A resposta dos trabalhadores foi ocupar essas empresas e assumir sua gestão, iniciando-se o movimento de constituição das ERT.

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Renake Bertholdo David das Neves é Doutora em História Social pelo PPGH-UFF. Pesquisadora do NIEP-Marx. Este artigo refere-se à investigação para obtenção de grau de Doutor, realizada com bolsa do CNPq (2009-2011) e da Faperj (2011-2013).

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