
Comparação feita entre o número de contribuintes do imposto de renda no Brasil com países desenvolvidos, feita pelo site G1. está equivocada.
Dão Real Pereira dos Santos
Fonte: Instituto Justiça Fiscal
Data original da publicação: 18/12/2025
O Brasil está criando condições para ampliar a tributação da renda, tributando mais os mais ricos e menos os mais pobres
No último dia 6, o portal G1 publicou uma matéria com o seguinte título “Com isenção do IR até R$ 5 mil, Brasil reduz número de contribuintes e se distancia de países desenvolvidos”. Com base em uma comparação feita pela Consultoria PwC, a reportagem trazia dados de nações como Alemanha, Reino Unido e Estados Unidos, onde grande parte da força de trabalho contribui com Imposto de Renda. Atualmente, 41% da população brasileira declara Imposto de Renda, uma porcentagem que irá reduzir de forma significativa com a isenção para quem ganha até R$ 5 mil mensais. Cerca de 10 milhões de pessoas passarão a não pagar o tributo.
A conclusão dessa comparação está, no mínimo, equivocada. O que tais dados nos revelam é que o Brasil é um país com alta concentração de renda. Com a falta de correção integral da tabela desde 1996, o que tivemos nos últimos anos foi um crescimento artificial no número de declarantes; ou seja, pessoas com rendas mais baixas foram sendo obrigadas a pagar mais Imposto de Renda a cada ano, enquanto as pessoas mais ricas vêm pagando cada vez menos.
Nosso país tem uma renda média de R$ 3.200 por mês, um valor extremamente baixo, que mal garante a subsistência de uma família. Segundo dados da OCDE, o salário médio mensal na Alemanha é de 3.830 Euros, o que equivale a R$ 24.320. Dadas as devidas proporções de gastos, é inegável que o poder de compra e, consequentemente, de contribuição da população alemã de forma homogênea é muito maior do que a brasileira.
Afora que a comparação deve levar em conta as diferentes formas de fazer as declarações em outros países. Nem todas as nações obedecem às mesmas regras. Há países, por exemplo, em que a declaração de Imposto de Renda é quase universal, ou seja, todos declaram, mas não quer dizer que todos paguem. Ainda há locais com imposto negativo, onde as pessoas declaram para receber recursos do governo. Então, é uma falácia querer comparar o volume de declarantes como se todos fossem devedores. Isso depende muito do país e do modelo tributário utilizado.
Outra questão que se deve considerar é que no Brasil existe a figura da Declaração Conjunta, em que o homem e a mulher da mesma família entregam a mesma declaração. Ou seja, para cada duas pessoas, uma declaração. A depender do modelo adotado por uma nação, isso pode não ocorrer.
Um terceiro ponto é que o modelo de tributação no Brasil é altamente regressivo, muito pesado na tributação sobre o consumo e muito pouco incidente sobre renda. Países que tributam menos o consumo podem ter um Imposto de Renda menos concentrado, ou seja, o contribuinte não paga tanto imposto sobre o consumo, o que dá margem para uma cobrança maior sobre a renda. Inclusive, rendas mais baixas poderiam pagar imposto de renda ao invés de pagar uma alta carga sobre o consumo.
Assim, a ampliação da base dos contribuintes do Imposto de Renda depende, em grande medida da redução da extrema concentração de renda que temos por aqui. Para que isso ocorra, é necessário que os mais ricos aceitem a cobrança de uma alíquota efetiva mais elevada do que é paga pela classe média, o que não ocorre no nosso país. Mesmo a tributação de lucros e dividendos, inclusive citada pela reportagem como uma das soluções para o sistema tributário, não encontra ambiente político favorável no Congresso Nacional para a sua aprovação. Apenas assim, poderíamos reequilibrar essa balança e passar a ter um sistema mais justo, como ocorre nas nações citadas pelo estudo.
Ou seja, a comparação realizada não respeita as evidentes diferenças entre os países e modelos de tributação, induzindo a população ao entendimento equivocado de que a medida proposta pelo governo, de isentar quem ganha até R$ 5 mil por mês seria um erro em termos de justiça social. Ao contrário do que é defendido na matéria, o Brasil está criando condições para ampliar a tributação da renda, tributando mais os mais ricos e menos os mais pobres, o que pode aumentar a progressividade do sistema como um todo.
Dão Real Pereira dos Santos é presidente do Sindifisco Nacional (Sindicato dos Auditores-Fiscais da Receita Federal)

