30 de outubro de 1985: greve conquista jornada de 6h na Caixa Econômica Federal

Paralisação de um dia resultaria também no direito à sindicalização dos trabalhadores.

Guilherme Daroit

Um dia de agências fechadas por todo o país mudaria, para sempre, o panorama dos trabalhadores da Caixa Econômica Federal. Mobilizada durante meses, a greve das 6 horas teria adesão de praticamente todos os empregados do banco público, e conquistaria não apenas a redução na jornada de trabalho, como também o direito à sindicalização. Com as alterações, a categoria voltava a ser enquadrada como bancária, obedecendo às mesmas regras de seus pares.

As normas diferentes para a Caixa eram ainda herança da recém findada Ditadura Militar, que ainda nos anos 1960 havia aumentado a jornada dos economiários para 8h diárias, além de proibir a sua sindicalização. No início dos anos 1980, outra iniciativa aumentaria ainda mais a frustração dos trabalhadores.

Em 1981, a direção do banco chamaria 20 mil novos empregados em concurso público, enquadrados em um novo cargo de auxiliar de escritório com o objetivo de pagar a eles metade do salário de entrada do restante do quadro de pessoal. A medida destravaria a indignação entre os trabalhadores, que passavam a se organizar coletivamente para denunciar e modificar a distinção, solicitando a isonomia entre as funções.

Em 1984, após a pressão dos trabalhadores, a Caixa aceitaria avançar com o reenquadramento de parte dos trabalhadores. Os processos seletivos para progressão na carreira, entretanto, estavam limitados a 4 mil vagas. Insuficiente para abarcar todos os auxiliares de escritório, a medida resultaria em uma série de protestos, com grupos de trabalhadores recusando-se a realizar as provas.

As manifestações acarretariam inclusive em demissões, que seriam o estopim para o aprofundamento da insatisfação e da organização dos empregados, que pediam, a partir daí, o direito de sindicalização e a jornada de 6h para todos, expandindo a pauta de reivindicações. No ano seguinte, marcado também pelo fortalecimento dos movimentos dos bancários, as atividades se intensificariam.

Em 6 de agosto, seria realizado um dia de luta em todo o país, no qual os economiários distribuiriam cartas sobre a situação à população, além do envio de telegramas diretos ao governo por parte da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa (Fenae). Cinco dias depois, agências esparsas em Brasília e no Ceará fechariam por duas horas, escalando as ações.

A resposta do Ministério da Fazenda viria apenas em setembro, em meio à greve dos bancários, primeiro movimento paredista de alcance nacional após a retomada da Democracia. O efeito vitorioso da greve, que havia ganhado a opinião pública e conquistado avanços na relação trabalhista de trabalhadores com os bancos graças à união em diversos estados, encorajaria os empregados da Caixa a seguirem o mesmo caminho. Já em 13 de setembro, um dia após o fim da greve dos bancários, cerca de mil economiários sairiam às ruas em São Paulo, protestando contra a negativa do governo quanto às suas reivindicações.

Em outubro, nos dias 19 e 20, outro marco aconteceria. Impossibilitados de vida sindical, pela primeira vez os trabalhadores da Caixa se reuniriam em fórum, realizando em Brasília o 1º Congresso Nacional dos Empregados da Caixa Econômica Federal (Conecef). Com cerca de 500 delegados, o encontro, realizado anualmente até hoje, deliberaria enfim por uma paralisação de um dia, marcada para 30 de outubro, na qual todas as agências do banco público deveriam se manter fechadas, sob coordenação da Fenae.

E assim foi feito. No dia marcado, com adesão praticamente total em todo o país, nenhuma agência da Caixa abriu suas portas em todo o território nacional. A força do movimento, ainda mais em uma empresa alijada da organização trabalhista tradicional, surpreenderia a população e o próprio poder central, modificando o polo de poder na relação trabalhista. No dia seguinte, as agências retornariam ao funcionamento normal, mas a vida no banco já não seria mais a mesma.

Já na semana seguinte, caravanas de economiários rumariam à Brasília, estendendo a pressão. No dia 4 de novembro, o Congresso enfim encaminharia a deliberação de propostas que respondiam aos anseios dos trabalhadores, colocando em regime de urgência os projetos vinculados. A mudança para a jornada de 6h seria aprovada ainda em novembro na Câmara, e no início de dezembro no Senado.

Em 17 de dezembro, o presidente José Sarney sancionaria a Lei 7.430, instituíndo o novo regime a partir de janeiro de 1986. Três dias depois, sancionaria também a Lei 7.449, retirando a Caixa e as demais companhias de economia mista da lista de proibição do direito à sindicalização dos funcionários públicos. Com as duas medidas, os economiários se juntavam, finalmente, à categoria bancária, ingressando nos sindicatos já organizados pela categoria.

Guilherme Daroit é jornalista e bacharel em Ciências Econômicas, formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Atualmente, é diretor do Sindicato dos Bancários de Porto Alegre e Região

 


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