28 de setembro de 1864: nasce a Primeira Internacional, em Londres

Reunião de diferentes correntes, AIT inauguraria tradição de internacionais de trabalhadores.

Imagem: Domínio Público

Guilherme Daroit

A organização e a politização da classe trabalhadora, que avançavam por todo o século XIX, ganhariam um novo e importante capítulo em 1864. Em 28 de setembro daquele ano, em Londres, seria criada a Associação Internacional dos Trabalhadores (AIT), que entraria para a história como a Primeira Internacional. Reunindo praticamente todas as mais relevantes tendências do pensamento operário que cresciam na Europa, a entidade teria vida curta, mas inauguraria a tradição de cooperação entre as entidades de trabalhadores para além de suas fronteiras.

A criação da Internacional marcaria o renascimento do movimento popular após o ocaso da Primavera dos Povos. A repressão posterior à onda revolucionária que varrera a Europa em 1848 desmantelaria os arranjos operários, que só voltariam a florescer na virada para os anos 1860. A essa altura, novas revoltas já apareciam no continente, agitando novamente os trabalhadores, que percebiam a necessidade de diálogo com seus pares em outros países.

Pouco antes da criação da AIT, franceses e ingleses criaram as bases para a correspondência internacional entre organizações. Em 1862, durante a Exposição Internacional de Londres, operários que integravam a delegação francesa seriam recebidos por seus pares ingleses, abrindo o canal de diálogo. Dali em diante, atos realizados pelos sindicatos britânicos contariam com convites para delegados do país continental, estreitando os laços.

Não seria surpresa, portanto, que viria dos trabalhadores dos dois países, também as mais poderosas nações da época, a propulsão para a criação da Internacional. Eram eles a esmagadora maioria dos quase 2 mil presentes à reunião convocada para a sala de concertos de São Martinho, em Londres, em 28 de setembro de 1864. Também contando com a presença de delegações de países como Itália, Alemanha, Polônia e Suíça, o encontro entraria para a história como a criação da Primeira Internacional, sugerida pelos franceses e aprovada de forma unânime no salão.

A organização da nova entidade ficaria a cargo de uma comissão de duas dezenas de membros, eleita na própria reunião. Entre eles, estava Karl Marx, que, mesmo não participando da coordenação do evento, comparecera à reunião a convite. Em pouco tempo, Marx assumiria as rédeas da comissão, recebendo a incumbência de redação do estatuto e do programa da nova entidade, em parte por saber escrever em todas as línguas necessárias.

A comissão provisória se transformaria, depois, no Conselho Geral, órgão máximo da Internacional, inicialmente concebido para facilitar a correspondência entre as seções nos países, atuando de maneira não-sectária para conciliar os interesses de todas as diferentes correntes de pensamento que se juntavam à organização.

O espraiamento da Internacional aconteceria de maneira irregular. Sua presença seria heterogênea, com alcance relevante em alguns países e presença tímida em outros. Mesmo assim, garantiria a filiação de diversas sociedades operárias desde o início. O primeiro congresso, planejado para 1865, seria adiado para 1866, em Genebra, na Suíça, utilizando-se os primeiros anos para a consolidação da estrutura e filiações de entidades e grupos na Europa e nos Estados Unidos, único país fora do continente com participação na AIT. No auge, estima-se que a entidade tenha atingido 150 mil associados, para além de outros milhares de apoiadores.

A abrangência seria garantida pelo abarcamento de diversas linhas de pensamento, que nem sempre conviveriam em harmonia. A maior celeuma, entre comunistas, liderados por Marx, e anarquistas (primeiro os da linha mutualista, de, Pierre-Joseph Proudhon, e, depois, os coletivistas, de Mikhail Bakunin), eventualmente acabaria por rachar a entidade.

Em 1871, após balanço sobre a queda da Comuna de Paris e buscando maior coesão, os comunistas liderariam uma mudança nos rumos da entidade, transformando-a em um partido operário internacional único, dirigido pelo Conselho Geral, transferido para Nova Iorque. Bakunin e seus seguidores não aceitariam a decisão, que entendiam institucionalizar o autoritarismo, e o russo acabaria expulso da entidade. A partir daí, a Internacional se dividiria em duas, uma de cada facção, que realizariam congressos em separado até 1877, perdendo sua relevância até serem extintas.

Ainda que efêmera e sem atingir seus objetivos, a AIT deixaria como legado a importância da colaboração entre trabalhadores de vários países, além do amadurecimento estratégico e o fortalecimento das entidades em suas próprias nações. Em 1889, a Segunda Internacional seria fundada sobre as lições da experiência anterior, e ao longo do Século XX diversas outras entidades do tipo surgiriam.

Guilherme Daroit é jornalista e bacharel em Ciências Econômicas, formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Atualmente, é diretor do Sindicato dos Bancários de Porto Alegre e Região

 

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