Há 89 anos, era publicado o Decreto nº 23.103, importante passo na consolidação do direito a férias no Brasil
Igor Natusch
Durante muitas décadas, a ampla maioria das trabalhadoras e trabalhadores brasileiros não tinha nenhuma garantia de períodos de descanso fora da rotina. As movimentações legislativas voltadas ao direito a férias só começaram a ganhar fôlego na primeira metade do século passado – e um dos passos decisivos nessa direção foi sacramentado em 19 de agosto de 1933, quando foi publicado o Decreto nº 23.103. A medida consolidou regramentos então inéditos, mas que hoje são interpretados como básicos em qualquer relação de trabalho razoável no Brasil.
O texto em questão surgiu oito anos depois da chamada Lei de Férias (Decreto nº 4.982, de 1925), primeira a regrar o descanso remunerado em escala nacional. Antes dela, as únicas leis em vigor eram bem específicas, concedendo 15 dias de férias para servidores de alguns ministérios e trabalhadores do sistema ferroviário. A Lei de Férias veio cheia de boas intenções, buscando estender esse benefício a todos os trabalhadores do setor privado, mas acabou não tendo grande efeito prático, em especial pela ausência de diretrizes para fiscalizar o cumprimento da norma.
Assinado por Getúlio Vargas, o novo decreto de 1933 veio para delimitar de forma mais clara os benefícios da lei anterior, ao mesmo tempo em que impunha novos limites e regras para o desconto de faltas. O descanso anual de 15 dias foi mantido, mas passou a estar condicionado ao prazo de doze meses ininterruptos trabalhados na mesma empresa, tanto para a aquisição do direito quanto para o gozo das férias. Também tornou-se obrigatório o registro das férias na carteira de trabalho do empregado, e uma série de diretrizes básicas foram estabelecidas para fiscalizar o cumprimento da lei. Desta forma, o Decreto nº 23.103 dispunha de dispositivos mais sólidos para impor sua efetividade – o que, somado a um governo que tinha os direitos trabalhistas como uma de suas principais bandeiras, garantiu à nova norma uma eficácia muito maior do que as leis anteriores.
Boa parte das prerrogativas assinadas em 1933 permanece em vigor, com alterações de maior ou menor grau, até os dias atuais. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em 1943, consagrou o gozo de férias como um direito básico de trabalhadores e trabalhadoras no Brasil, e um decreto-lei de 1977 ampliou o período de descanso remunerado para 30 dias anuais. Hoje, trabalhadores com carteira assinada recebem um adicional equivalente a um terço do salário, consagrado a partir da Constituição de 1988. Recentemente, contudo, alterações trazidas por reformas trabalhistas têm colocado em questão algumas dessas prerrogativas, em um processo que pode impor mudanças futuras significativas ao cenário do trabalho no país.