12 de dezembro de 1930: entra em vigor lei de nacionalização do trabalho

Eternizada como lei dos dois terços, regra criada por Vargas limitava estrangeiros nas firmas.

Guilherme Daroit

O novo governo emergido da Revolução de 1930 ainda dava seus primeiros passos quando romperia com um dos pilares da República Velha que havia deposto. Governando por decreto, em dezembro daquele ano o novo líder, Getúlio Vargas, determinaria o fim das políticas de atração de imigrantes. Por meio da regra que entraria para a história como a “lei dos dois terços”, o governo provisório limitava a entrada de estrangeiros no país e exigia, das empresas, o preenchimento de pelo menos dois terços dos postos de trabalho por brasileiros natos.

Assentada na agricultura e na exportação de produtos primários, a economia nacional passava por um novo momento com os efeitos da crise internacional de 1929, que botaria abaixo o modelo. Alçado ao governo em novembro de 1930, após o sucesso do golpe de estado que encerraria a república das oligarquias, Vargas lideraria a transição para uma economia cada vez mais urbana, com forte atuação estatal e a formação de um mercado interno, viabilizado pela integração entre as regiões do país.

Parte do processo viria da busca pela formação de uma unidade linguística, religiosa e cultural em todo o território. A criação de um povo brasileiro, coeso e identificado entre si, surgia como preocupação do governo, que, para além da identidade nacional, buscava também a contenção do desemprego causado pela crise econômica. Atingindo ambos os objetivos, então, a exaltação e a supervalorização do trabalhador brasileiro ganhariam espaço na agenda da nova administração.

O controle à imigração externa rompia com os estímulos criados pela república até então. Com o fim da escravidão, no fim do século anterior, medidas de atração e subsídio à colocação de estrangeiros no Brasil, notadamente europeus, seriam criadas pelo governo, que buscava, entre outros objetivos, substituir a mão de obra recém liberta. Na virada do século, os europeus já formavam esmagadora maioria na força de trabalho das poucas indústrias nacionais, mas também em outros ramos, como os serviços.

A crise econômica, aliada a formação política de parte dos europeus, que introduziam os pensamentos socialistas e sindicalistas no país, contribuiriam então para uma mudança na percepção dos estrangeiros por parte das elites dominantes. Antes solução, agora eram vistos como problema, sendo necessária a sua substituição.

Dessa forma, em 12 de dezembro de 1930, o decreto n. 19.482 entraria em vigor limitando ainda mais a entrada de imigrantes no Brasil. A partir do ano seguinte, tornava-se proibida a entrada no país de estrangeiros indesejados, isto é, os trabalhadores. O recorte era garantido pela limitação a quem vinha na terceira classe dos navios. Ficavam isentos apenas os artífices ou agricultores convocados por empresas e indivíduos, desde que seguissem as regras já em vigor, que exigiam prévia autorização do governo.

O acesso de imigrantes ao Brasil já era restrito desde pelo menos 1921, nos casos de moléstia, idade avançada e outras características indesejadas, mas tornava-se ainda menos aberto com a nova medida. Para permanecer por mais de 30 dias no país, a partir de então, adultos precisavam comprovar a posse de três contos de réis, demonstrando mais uma vez a delimitação da proibição àqueles cuja renda dependia de sua força de trabalho.

Além disso, a lei determinava que, em noventa dias, todas as firmas deveriam possuir pelo menos dois terços de seus quadros funcionais compostos por brasileiros natos. O panorama de cada empresa deveria ser comunicada ao Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, pasta criada duas semanas antes para estatizar as relações trabalhistas, sendo chamado de “ministério da revolução” por sua importância para o novo regime. Situações distintas só seriam liberadas em caso de falta de brasileiros natos e em serviços “rigorosamente técnicos”, e, mesmo nesses casos, deveriam ser priorizados os brasileiros naturalizados sobre os estrangeiros.

Para viabilizar as contratações de nacionais, o decreto ainda determinava que todos os desempregados deveriam se apresentar ao governo, nas estruturas do novo ministério ou mesmo nas delegacias de polícia, para que fossem tomadas “medidas convenientes sobre sua ocupação”. Os custos dessa iniciativa seriam financiados por um imposto de emergência, em 1931, de até 2% dos vencimentos de todos os servidores federais, civis e militares.

A medida seria uma das primeiras intervenções de Vargas nas relações de trabalho. Nos anos seguintes, o presidente estabeleceria novas regras de sindicalização, a jornada de 8 horas, a carteira de trabalho, o salário mínimo, os institutos de aposentadoria, entre outras iniciativas. Em 1943, já sob a égide do Estado Novo, o aparato varguista seria compilado na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), na qual o capítulo II do Título III, “Da nacionalização do trabalho”, compreendido pelos artigos 352 a 358, ostenta até hoje as regras trazidas pela lei dos dois terços.

Guilherme Daroit é jornalista e bacharel em Ciências Econômicas, formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Atualmente, é diretor do Sindicato dos Bancários de Porto Alegre e Região



 


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