Você troca um sindicato pelo seu bullet journal?

Com condições precárias de trabalho, são exigidas dos trabalhadores mais tarefas do que é humanamente possível cumprir. 

Marília Moschkovich

Fonte: Blog da Boitempo
Data original da publicação: 21/01/2022

Você precisa de um “bullet journal”? Sua vida vira um caos sem um “planner“? É janeiro e se você, como eu, não tem emprego formal, provavelmente já desenvolveu algum esquema próprio de organização de tarefas e trabalho, que envolve aplicativos de produtividade, técnicas pomodoro e recursos como o “BuJo” ou “planners” (que nada mais são do que agendas semanais, convenhamos). O que essas ferramentas dizem sobre a maneira como trabalhamos – ou, melhor, como somos obrigados a trabalhar?

O método Bullet Journal [em tradução, “diário de listas” ou “diário em tópicos”] foi criado no final da década de 1990 para uso pessoal de seu criador, Ryder Carroll, nos Estados Unidos. O método só ganhou popularidade, porém, depois da crise de 2008 – mais precisamente, no início da década de 2010, quando os mercados e economias do centro do imperialismo começaram a se recuperar da crise, enquanto quebravam as economias e mercados das periferias (como a nossa), no típico balé das crises cíclicas do capital. Não parece ser coincidência que a década de 1990 seja um marco importante na aceleração da desigualdade de renda e da precarização do trabalho nos EUA. Mas essa história começa bem antes, e está ligada à coreografia das crises e da exploração do trabalho no modo de produção capitalista.

No processo de recuperação da crise de 1929 nos Estados Unidos, se instaurou uma crise social ligada a trabalho e emprego. A miséria aumentou, os empregos desapareceram e, nesse processo, os sindicatos e reivindicações trabalhistas ganharam força. Ao tomar posse como presidente em 1933, Roosevelt iniciou uma série de ações do governo federal procurando intervir sobre a crise. Uma de suas primeiras medidas foi o National Industrial Recovery Act, que estabelecia diversas medidas novas relativas à regulação do trabalho e do funcionamento das empresas no país. Entre elas, estava a garantia do direito de associação em sindicatos e a proibição dos chamados “yellow-dog contracts”, que eram contratos de trabalho com uma cláusula em que o trabalhador se comprometia a não se sindicalizar. Houve uma onda de sindicalizações e greves denunciando práticas abusivas dos empregadores logo na sequência, e após alguns meses de mandato o presidente instituiu o National Labor Board [Conselho Nacional do Trabalho] como organismo de monitoramento e encaminhamento de denúncias trabalhistas.

Inicialmente, esse órgão tinha um presidente próprio (sempre um membro do legislativo, tendo sido o primeiro o senador pelo Partido Democrata Robert Wagner) e mais três representantes de sindicatos (na primeira formação, o presidente de uma federação nacional de sindicatos, mais os respectivos presidentes dos sindicatos dos mineiros e da indústria têxtil) e três de grandes empresas (General Electric, uma grande rede de lojas de departamento e uma petroleira). O conselho durou pouco, e em 1935 se tornou National Labor Relations Board [Conselho Nacional das Relações de Trabalho] com menos membros e com o status de agência governamental. Quando a Lei Wagner foi aprovada em 1935, estabelecendo regulamentação do trabalho para todas as categorias laborais, o conselho se tornou sua agência implementadora e reguladora.

A década de 1980, que se seguiu a um outro momento de crise, assistiu ao desmonte dessa estrutura. Nesse período, uma série de mudanças foram impostas pelo então presidente Reagan, do Partido Republicano, inclusive a substituição dos membros do conselho, tradicionalmente ligados ao Direito do Trabalho, por empresários. A nova formação do conselho suprimiu direitos trabalhistas, retirando principalmente o direito à sindicalização de professores universitários, entre outras mudanças (como a criminalização da contratação de imigrantes sem documentação regular no país). No início da década de 1990 foi regulamentada a licença médica e licença maternidade sem remuneração. Em 1996, com a desculpa sempre esfarrapada de “salvar as pequenas empresas”, o salário mínimo foi reduzido drasticamente, e passou a ser permitido que o empregador utilizasse as gorjetas de funcionários para pagar seus salários.

O aumento da desigualdade de renda e a ausência de proteções legais ao trabalhador poderiam se tornar um novo caldeirão de greves e reivindicações da população explorada, se não houvessem garantido o desmonte e fragilização de boa parte dos sindicatos, junto a uma segunda estratégia patronal – e é aqui que chegamos mais perto do Bullet Journal, dos planners e dos pomodoros nossos de cada dia: a criação de uma nova ideologia do trabalho, interna às empresas, que tem como parte fundamental a criação de estruturas que pareçam flexíveis o suficiente para acomodar necessidades do trabalhador, agora tratadas como necessidades individuais, e não mais coletivas. Vejam: num primeiro momento, diante da intervenção federal em disputas trabalhistas, mediada pelo conselho, a solução dos empresários estadunidenses foi criar sindicatos internos das empresas, controlados por seus representantes – os chamados “yellow unions” [sindicatos amarelos]. Essa tentativa não durou muito, já que em 1935 a Lei Wagner também proibiu esse tipo de prática. Foi então que apareceu a ideologia do “Envolvimento dos Funcionários” ou “Employee Involvement” (EI) e os chamados “Employee Involvement Programs”. A ideia era criar estruturas internas (como ouvidorias) em que os funcionários pudessem sentir que têm acesso a decisões da empresa e as influenciam. Assim, segundo os manuais de administração, cria-se um ambiente de lealdade à empresa, e a ideia de que o sindicato ficou inútil, parado no tempo, e não ajuda muito nas relações de trabalho contemporâneas. Soa familiar?

No processo de desregulação e precarização do trabalho, tão bem discutido por Ricardo Antunes em sua obra, e tão bem descrito no ensaio “O novo closet do proletariado” presente na tese doutoral de Leonardo Guimarães (FEA/USP), há uma exacerbação do indivíduo. A ideologia neoliberal pega fogo e se alastra na década de 1990 justamente com esse tom, e convence os trabalhadores de que eles são indivíduos fazendo a própria sorte. Hoje vivemos o ponto extremo desse tipo de exploração, com o trabalho por plataforma – em que empresas como Uber, iFood são as mais conhecidas, mas que também opera para professores, trabalhadores do cuidado, faxineiras e em praticamente todas as profissões e formas laborais. Se a metáfora do “líquido” de Bauman virou quase uma piada quando saiu de moda, ela parece fazer algum sentido aqui enquanto fantasia: as relações são ditas flexíveis, líquidas, sem amarras, apenas como estratégia para que se reafirme da forma mais rígida o possível a manutenção das estruturas produtivas. Afinal, aqueles que têm poder para definir como o meu, seu, nosso trabalho deve ser realizado e que condições precisamos suportar para garantir (ou tentar) subsistência, seguem sendo os mesmos.

Não é um acaso que os métodos de produtividade e recursos como bullet jornal, planners e pomodoro se tornem cada vez mais populares. Com condições precárias de trabalho, são exigidas dos trabalhadores mais tarefas do que é humanamente possível cumprir. Dessa forma, o tempo de trabalho precisa ser não apenas estendido, mas também otimizado. O uso capitalista das tecnologias – que a ingenuidade dos marxistas europeus na década de 1970 permitiu sonhar que fossem diminuir a carga laboral – é taticamente desenhado para que essa produtividade extrema seja possível, em detrimento da vida. Se uma ou várias funções humanas são substituídas por execução de máquinas, ou um processo é flexibilizado ou facilitado com novas tecnologias (como é o caso do Pix ou da integração das tecnologias de reuniões online e EaD ao cotidiano, ocorrida durante a pandemia da covid-19), não apenas há trabalhadores demitidos, como em geral aqueles que se mantém empregados passam a acumular mais e mais funções e tarefas. Com a desvalorização do trabalho humano típica desses processos, em economias desiguais como a brasileira, a renda que o trabalho proporciona também passa a não ser suficiente para a manutenção da vida cotidiana, obrigando boa parte da população a dividir seu pouco tempo em diversos projetos profissionais, carreiras e empregos. É o trabalhador múltiplo, requerimento básico da economia de 2022.

O surpreendente é como o mecanismo ideológico, junto à construção da subjetividade por meio de uma moral do trabalho, fazem com que não apenas o processo de precarização seja acatado, mas também celebrado e desfrutado genuinamente. A estética descolada dos bullet journals e a escolha de um planner totalmente personalizado são formas de expressão de si num mundo de bens e consumo. Em 1979 (novamente, contexto pós-crise), a antropóloga Mary Douglas escreveu O mundo dos bens (em 1979!), analisando a maneira como se constrói uma “alma” das mercadorias e como o consumo dá sentido subjetivo ao trabalho (tornando-o suportável, desejável, sinônimo de vida e realização pessoal). Nesse contexto, é interessante observar como planners e BuJos são itens de consumo que se encaixam perfeitamente nesse ciclo: servem diretamente à economia do trabalho em pelo menos três frentes: a aquisição da mercadoria em si e sua cadeia de mercadorias associadas (caderno, canetas, o planner em si, gráfica, serviços de logística e entrega, comércio etc.), o aumento da produtividade e capacidade de trabalho de cada trabalhador que se organizar direitinho (sic); e a inserção subjetiva desse trabalhador num ciclo em que usa o seu próprio salário/renda para investir no que vai beneficiar quem o contrata (com a produtividade, a compra desses insumos etc.). Como bônus há ainda todo um mercado simbólico do universo dos BuJos planners que se forma, com ainda mais mercadorias e serviços relacionados. Dessa forma, nos mantemos trabalhando e trabalhando para o trabalho, massacrados na precarização glamourizada. Mas tudo bem, porque daqui a alguns minutos me permito uma pausa de 5 minutinhos pra me distrair, no pomodoro.

Você troca um sindicato pelo seu bullet journal?

Não é um acaso que os métodos de produtividade e recursos como bullet jornal, planners e pomodoro se tornem cada vez mais populares. Com condições precárias de trabalho, são exigidas dos trabalhadores mais tarefas do que é humanamente possível cumprir. Dessa forma, o tempo de trabalho precisa ser não apenas estendido, mas também otimizado.

Publicado em 21/01/2022 // 1 comentário

TUNED IN, DE DAVID PLUNKERT

Por Marília Moschkovich

Você precisa de um “bullet journal”? Sua vida vira um caos sem um “planner“? É janeiro e se você, como eu, não tem emprego formal, provavelmente já desenvolveu algum esquema próprio de organização de tarefas e trabalho, que envolve aplicativos de produtividade, técnicas pomodoro e recursos como o “BuJo” ou “planners” (que nada mais são do que agendas semanais, convenhamos). O que essas ferramentas dizem sobre a maneira como trabalhamos – ou, melhor, como somos obrigados a trabalhar?

O método Bullet Journal [em tradução, “diário de listas” ou “diário em tópicos”] foi criado no final da década de 1990 para uso pessoal de seu criador, Ryder Carroll, nos Estados Unidos. O método só ganhou popularidade, porém, depois da crise de 2008 – mais precisamente, no início da década de 2010, quando os mercados e economias do centro do imperialismo começaram a se recuperar da crise, enquanto quebravam as economias e mercados das periferias (como a nossa), no típico balé das crises cíclicas do capital. Não parece ser coincidência que a década de 1990 seja um marco importante na aceleração da desigualdade de renda e da precarização do trabalho nos EUA. Mas essa história começa bem antes, e está ligada à coreografia das crises e da exploração do trabalho no modo de produção capitalista.

No processo de recuperação da crise de 1929 nos Estados Unidos, se instaurou uma crise social ligada a trabalho e emprego. A miséria aumentou, os empregos desapareceram e, nesse processo, os sindicatos e reivindicações trabalhistas ganharam força. Ao tomar posse como presidente em 1933, Roosevelt iniciou uma série de ações do governo federal procurando intervir sobre a crise. Uma de suas primeiras medidas foi o National Industrial Recovery Act, que estabelecia diversas medidas novas relativas à regulação do trabalho e do funcionamento das empresas no país. Entre elas, estava a garantia do direito de associação em sindicatos e a proibição dos chamados “yellow-dog contracts”, que eram contratos de trabalho com uma cláusula em que o trabalhador se comprometia a não se sindicalizar. Houve uma onda de sindicalizações e greves denunciando práticas abusivas dos empregadores logo na sequência, e após alguns meses de mandato o presidente instituiu o National Labor Board [Conselho Nacional do Trabalho] como organismo de monitoramento e encaminhamento de denúncias trabalhistas.

Inicialmente esse órgão tinha um presidente próprio (sempre um membro do legislativo, tendo sido o primeiro o senador pelo Partido Democrata Robert Wagner) e mais três representantes de sindicatos (na primeira formação, o presidente de uma federação nacional de sindicatos, mais os respectivos presidentes dos sindicatos dos mineiros e da indústria têxtil) e três de grandes empresas (General Electric, uma grande rede de lojas de departamento e uma petroleira). O conselho durou pouco, e em 1935 se tornou National Labor Relations Board [Conselho Nacional das Relações de Trabalho] com menos membros e com o status de agência governamental. Quando a Lei Wagner foi aprovada em 1935, estabelecendo regulamentação do trabalho para todas as categorias laborais, o conselho se tornou sua agência implementadora e reguladora.

A década de 1980, que se seguiu a um outro momento de crise, assistiu ao desmonte dessa estrutura. Nesse período, uma série de mudanças foram impostas pelo então presidente Reagan, do Partido Republicano, inclusive a substituição dos membros do conselho, tradicionalmente ligados ao Direito do Trabalho, por empresários. A nova formação do conselho suprimiu direitos trabalhistas, retirando principalmente o direito à sindicalização de professores universitários, entre outras mudanças (como a criminalização da contratação de imigrantes sem documentação regular no país). No início da década de 1990 foi regulamentada a licença médica e licença maternidade sem remuneração. Em 1996, com a desculpa sempre esfarrapada de “salvar as pequenas empresas”, o salário mínimo foi reduzido drasticamente, e passou a ser permitido que o empregador utilizasse as gorjetas de funcionários para pagar seus salários.

O aumento da desigualdade de renda e a ausência de proteções legais ao trabalhador poderiam se tornar um novo caldeirão de greves e reivindicações da população explorada, se não houvessem garantido o desmonte e fragilização de boa parte dos sindicatos, junto a uma segunda estratégia patronal – e é aqui que chegamos mais perto do Bullet Journal, dos planners e dos pomodoros nossos de cada dia: a criação de uma nova ideologia do trabalho, interna às empresas, que tem como parte fundamental a criação de estruturas que pareçam flexíveis o suficiente para acomodar necessidades do trabalhador, agora tratadas como necessidades individuais, e não mais coletivas. Vejam: num primeiro momento, diante da intervenção federal em disputas trabalhistas, mediada pelo conselho, a solução dos empresários estadunidenses foi criar sindicatos internos das empresas, controlados por seus representantes – os chamados “yellow unions” [sindicatos amarelos]. Essa tentativa não durou muito, já que em 1935 a Lei Wagner também proibiu esse tipo de prática. Foi então que apareceu a ideologia do “Envolvimento dos Funcionários” ou “Employee Involvement” (EI) e os chamados “Employee Involvement Programs”. A ideia era criar estruturas internas (como ouvidorias) em que os funcionários pudessem sentir que têm acesso a decisões da empresa e as influenciam. Assim, segundo os manuais de administração, cria-se um ambiente de lealdade à empresa, e a ideia de que o sindicato ficou inútil, parado no tempo, e não ajuda muito nas relações de trabalho contemporâneas. Soa familiar?

No processo de desregulação e precarização do trabalho, tão bem discutido por Ricardo Antunes em sua obra, e tão bem descrito no ensaio “O novo closet do proletariado” presente na tese doutoral de Leonardo Guimarães (FEA/USP), há uma exacerbação do indivíduo. A ideologia neoliberal pega fogo e se alastra na década de 1990 justamente com esse tom, e convence os trabalhadores de que eles são indivíduos fazendo a própria sorte. Hoje vivemos o ponto extremo desse tipo de exploração, com o trabalho por plataforma – em que empresas como Uber, iFood são as mais conhecidas, mas que também opera para professores, trabalhadores do cuidado, faxineiras e em praticamente todas as profissões e formas laborais. Se a metáfora do “líquido” de Bauman virou quase uma piada quando saiu de moda, ela parece fazer algum sentido aqui enquanto fantasia: as relações são ditas flexíveis, líquidas, sem amarras, apenas como estratégia para que se reafirme da forma mais rígida o possível a manutenção das estruturas produtivas. Afinal, aqueles que têm poder para definir como o meu, seu, nosso trabalho deve ser realizado e que condições precisamos suportar para garantir (ou tentar) subsistência, seguem sendo os mesmos.

Não é um acaso que os métodos de produtividade e recursos como bullet jornal, planners e pomodoro se tornem cada vez mais populares. Com condições precárias de trabalho, são exigidas dos trabalhadores mais tarefas do que é humanamente possível cumprir. Dessa forma, o tempo de trabalho precisa ser não apenas estendido, mas também otimizado. O uso capitalista das tecnologias – que a ingenuidade dos marxistas europeus na década de 1970 permitiu sonhar que fossem diminuir a carga laboral – é taticamente desenhado para que essa produtividade extrema seja possível, em detrimento da vida. Se uma ou várias funções humanas são substituídas por execução de máquinas, ou um processo é flexibilizado ou facilitado com novas tecnologias (como é o caso do Pix ou da integração das tecnologias de reuniões online e EaD ao cotidiano, ocorrida durante a pandemia da covid-19), não apenas há trabalhadores demitidos, como em geral aqueles que se mantém empregados passam a acumular mais e mais funções e tarefas. Com a desvalorização do trabalho humano típica desses processos, em economias desiguais como a brasileira, a renda que o trabalho proporciona também passa a não ser suficiente para a manutenção da vida cotidiana, obrigando boa parte da população a dividir seu pouco tempo em diversos projetos profissionais, carreiras e empregos. É o trabalhador múltiplo, requerimento básico da economia de 2022.

O surpreendente é como o mecanismo ideológico, junto à construção da subjetividade por meio de uma moral do trabalho, fazem com que não apenas o processo de precarização seja acatado, mas também celebrado e desfrutado genuinamente. A estética descolada dos bullet journals e a escolha de um planner totalmente personalizado são formas de expressão de si num mundo de bens e consumo. Em 1979 (novamente, contexto pós-crise), a antropóloga Mary Douglas escreveu O mundo dos bens (em 1979!), analisando a maneira como se constrói uma “alma” das mercadorias e como o consumo dá sentido subjetivo ao trabalho (tornando-o suportável, desejável, sinônimo de vida e realização pessoal). Nesse contexto, é interessante observar como planners e BuJos são itens de consumo que se encaixam perfeitamente nesse ciclo: servem diretamente à economia do trabalho em pelo menos três frentes: a aquisição da mercadoria em si e sua cadeia de mercadorias associadas (caderno, canetas, o planner em si, gráfica, serviços de logística e entrega, comércio etc.), o aumento da produtividade e capacidade de trabalho de cada trabalhador que se organizar direitinho (sic); e a inserção subjetiva desse trabalhador num ciclo em que usa o seu próprio salário/renda para investir no que vai beneficiar quem o contrata (com a produtividade, a compra desses insumos etc.). Como bônus há ainda todo um mercado simbólico do universo dos BuJos planners que se forma, com ainda mais mercadorias e serviços relacionados. Dessa forma, nos mantemos trabalhando e trabalhando para o trabalho, massacrados na precarização glamourizada. Mas tudo bem, porque daqui a alguns minutos me permito uma pausa de 5 minutinhos pra me distrair, no pomodoro.

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Marília Moschkovich é socióloga-antropóloga e pesquisadora do departamento de antropologia da FFLCH/USP. Mestra (2013) e doutora (2018) em Educação (na linha de pesquisa Educação e Ciências Sociais) pela Unicamp, também trabalhou no Museu de Antropologia da Universidad Nacional de Córdoba (UNC), na Argentina, e na École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS), em Paris. 

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