A efetiva inovação normativa está no reconhecimento de que todas as gestantes, independentemente de atestado médico específico, têm reconhecida sua condição como suficiente para tornar inconveniente a permanência de trabalho presencial.
Rodrigo Trindade
Fonte: Revisão Trabalhista
Data original da publicação: 13/05/2021
Foi sancionada ontem, e publicada hoje no Diário Oficial, a Lei 14.151/2021, que determina o afastamento de gestantes do trabalho presencial, durante a pandemia. Com apenas dois artigos, a nova lei garante o afastamento de grávidas das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo da remuneração.
O normativo, todavia, autoriza a permanência de trabalho da gestante, em domicílio, seja por meio de teletrabalho ou por outra forma de desenvolvimento de suas atividades à distância.
Dados da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde mostram um aumento na letalidade da covid entre as grávidas brasileiras. Mais de 200 mulheres morreram nos últimos meses de gestação ou no pós-parto após serem diagnosticadas com o coronavírus. Esse quantitativo representa mais de 70% dos óbitos maternos em razão da doença em todo mundo.
A Lei 14.151/2021 tem origem no Projeto de Lei n. 3.932/2020, da deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC). Foi aprovada no Senado em 15 de abril de 2021 e aguardava avaliação desde 23/4/2021. Foi sancionada no último dia do prazo constitucional.
Análise
A garantia de emprego a gestantes, sem prejuízo de remuneração, já encontrava abrigo na legislação brasileira. Permite o art. 392, § 4º, I, da CLT a transferência de local de trabalho, quando as condições e saúde da grávida o exigirem, assegurando retomada da função anteriormente exercida, logo após o retorno ao serviço. Também a Portaria Conjunta n. 20/2020, do Ministério da Economia inclui as gestantes de alto risco no grupo de trabalhadoras de risco, estabelecendo a priorização de sua permanência na residência em teletrabalho ou trabalho remoto ou, ainda, em atividade ou local que reduza o contato com outros trabalhadores e o público, quando possível.
A efetiva inovação normativa está no reconhecimento de que todas as gestantes, independentemente de atestado médico específico, têm reconhecida sua condição como suficiente para tornar inconveniente a permanência de trabalho presencial. Com isso, afastam-se duas limitadoras da Portaria: exclui-se o corte de “alto risco” para a gravidez, de modo que toda grávida passa a poder ser retirada do trabalho internalizado no empregador.
Também há esclarecimento sobre a validade da exigência pelo empregador de realização de serviços a partir da residência da trabalhadora. A permanência de trabalho da gestante passa a ser direito do empregador, condicionado à possibilidade do desenvolvimento das atividades em domicílio.
A passagem, todavia, dependerá, da avaliação da habilitação da empregada, fornecimento regular de equipamentos e infraestrutura de trabalho, bem como a não afetação substancial do espaço familiar. Como tratamos em detalhes em obra própria de análise das condições de trabalho na pandemia, acredita-se que é possível estabelecer certa compatibilização de atribuições, mas desde que não haja subversão aos elementos básicos da contratação, nem exigência de habilidades e esforços excepcionais e incompatíveis.
Tratando-se de passagem para teletrabalho, ou outra forma de serviço em domicílio, deve haver observância de certos requisitos estabelecidos no art. 4º da Medida Provisória n. 1.045/2021 (substitutiva da MP 927/2020). Especialmente, há necessidade de definição das atividades que serão desenvolvidas pela empregada e as formas de custeio ou reembolso de despesas para aquisição e manutenção de equipamentos e infraestrutura.
A empregada gestante tem garantia de emprego durante o período da gestação, independente da condição de risco. Apenas não havendo condições de direcionamento do empregador para realização de trabalho remoto, haverá obrigação de continuidade do pagamento de salários, mas sem exigência de trabalho. Ocorrendo dispensa da empregada, mesmo que motivada pela impossibilidade de passagem ao serviço em domicílio, existirá direito à reintegração (mantendo-se o afastamento do trabalho presencial) ou, substitutivamente, a conversão do período em indenização.
Texto da Lei:
Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração.
Parágrafo único. A empregada afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância.
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 12 de maio de 2021; 200o da Independência e 133o da República.
Rodrigo Trindade é professor universitário, ex-Presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 4ª Região – AMATRA IV, juiz do Trabalho na 4ª Região.