Ruy Braga e a natureza estrutural da opressão racial no capitalismo

Ilustração: Boitempo

“A angústia do precariado”, novo livro de Ruy Braga, destaca a valorização da experiência coletiva da classe trabalhadora nos Estados Unidos também fornece lições para a luta contra o autoritarismo no Brasil.

Silvio Almeida

Fonte: Blog da Boitempo
Data original da publicação: 14/08/2023

A ascensão do nacionalismo supremacista nos Estados Unidos pode ser interpretada apenas como produto do ódio, do ressentimento e do racismo da classe trabalhadora branca? Ou as razões que explicam o comportamento político dos trabalhadores brancos são mais variadas, desafiando uma narrativa politicamente conveniente tanto para democratas como para republicanos?

Fruto de catorze meses de pesquisa de campo realizada em pequenas cidades rurais na região dos Montes Apalaches, A angústia do precariado desvenda uma história muito diferente e praticamente desconhecida a respeito de como as condições de subsistência dos trabalhadores brancos se aproximaram daquelas frequentemente associadas às comunidades negras naquele país.

Em sua etnografia operária, Ruy Braga investigou como o sofrimento de cidades duramente golpeadas pela confluência entre crise econômica, desindustrialização, epidemia de abuso de substâncias ilícitas e pandemia ajudou a impulsionar, após o assassinato de George Floyd, protestos em favor das vidas negras numa região majoritariamente formada por brancos.

O livro empenhou-se em compreender como esse comportamento se enraíza no longo processo histórico de reconstrução das identidades coletivas dos trabalhadores precários estadunidenses, que vai do longo ciclo grevista dos anos 1960 até a atual onda de criação de novos sindicatos protagonizada pelos trabalhadores racializados.

Ao perseguir esse objetivo, Braga enfatizou em sua análise a natureza estrutural da opressão racial no capitalismo, argumentando que a atual crise que ameaça as instituições democráticas decorre em larga medida da incapacidade do movimento organizado dos trabalhadores de superar as fronteiras raciais que dividem as classes subalternas.

Daí a centralidade da reconfiguração das identidades coletivas dos trabalhadores impactados pela onda mundial de protestos antirracistas impulsionada pelo movimento Black Lives Matter. Ao valorizar a experiência coletiva da classe trabalhadora nos Estados Unidos, sublinhando seu potencial emancipador, o autor soube reunir algumas lições valiosas, capazes de favorecer a luta contra a ascensão do autoritarismo também no Brasil.

Silvio Almeida é advogado, filósofo e professor, atual ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania do Brasil.

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