Pelo menos 1% dos funcionários da província de Buenos Aires, onde moram 39% dos argentinos, deverão ser do coletivo travesti, transexual, trans ou transgênero, caso seja aprovado projeto de lei em discussão. A Câmara dos Deputados dessa província aprovou na quarta-feira (18/12) à noite uma iniciativa que garante a cota. Para virar lei, precisa de aprovação também no Senado de Buenos Aires.
“Existem problemas que temos que resolver a respeito da inserção laboral, tanto no âmbito privado quanto no setor público, e precisamos continuar a despertar a consciência cidadã para atingir a real igualdade de oportunidades”, declarou a deputada que promoveu o projeto, Karina Nazábal, da kirchnerista Frente para a Vitória (FpV).
Foi no Governo de Cristina Fernández de Kirchner que a Argentina aprovou nos últimos quatro anos a lei de casamento de pessoas do mesmo sexo e a lei de identidade de gênero, que permite que cada pessoa defina o sexo (masculino ou feminino) que quiser em seu documento. Mas paras muitos transexuais é difícil conseguir emprego na Argentina, e centenas deles terminam se prostituindo em ruas e parques.
A iniciativa pela cota no emprego público buenairense foi repudiada por partidos da oposição. Por exemplo, a Frente Renovadora, do candidato à Presidência Sergio Massa, líder nas pesquisas para as eleições de 2015, à frente do governador da província de Buenos Aires, o kirchnerista Daniel Scioli. “Na gestão de Scioli (desde 2007) houve crescimento de 20% no pessoal (da província), e mesmo assim está longe de cumprir a disposição que estabelece cota para deficientes”, disse o deputado Jorge Sarghini, da Frente Renovadora, que pediu que antes de votar a nova lei sobre emprego público sejam cumpridas as anteriores.
A província de Buenos Aires não é a única preocupada com o emprego de transexuais. Em Rosário, a terceira cidade mais populosa da Argentina, depois de Buenos Aires e Córdoba, dois vereadores, da União Cívica Radical (UCR, centrista) e da FpV, propuseram a criação de uma cota de empregos públicos para o coletivo trans. A iniciativa da FpV tem o apoio do coletivo Putos Peronistas, integrado por lésbicas, gays, bissexuais e transexuais (LGBT) de bairros pobres e identificados com o peronismo.
Na cidade autônoma de Buenos Aires (independente da província de mesmo nome), uma vereadora da FpV e militante do coletivo LGBT María Rachid propôs em novembro que os transexuais com mais de 40 anos recebam benefício mensal equivalente a cerca de 680 reais. “Estamos falando de pessoas que têm média de vida de 35 anos, pela extrema exclusão social em que vivem”, disse Rachid, que acusou os meios de comunicação e o partido Proposta Republicana (PRO, conservador), que governa a capital argentina, de distorcer o projeto e divulgar que o benefício seria de mais de 2.000 reais. No Congresso da Argentina, uma deputada kirchnerista apresentou projeto semelhante ao de Rachid. Ambas propostas de auxílio provocaram grande polêmica no país todo, mas só a da província de Buenos Aires conseguiu o consenso para ser aprovada por uma das câmaras do Parlamento distrital.
“Muito se discutiu neste mês sobre os subsídios, quando é certo que um coletivo que precisa trabalhar dignamente e ter um salário, que a sociedade lhe abra as portas sem um quadro de discriminação”, disse a deputada buenairense Nazábal sobre sua iniciativa votada nesta quarta-feira. À agência pública de noticias Télam, Nazábal declarou que, “quando um travesti abrir a porta todos os dias para uma família num jardim da infância, isso vai ser normal”. O projeto de lei também é apoiado pelo coletivo transexual. “Muitas vezes somos excluídas do seio familiar e até escolar, o que nos impossibilita de competir no mercado formal”, afirmou Diana Sacayán, militante do Movimento Antidiscriminatório de Liberação.
Fonte: El País
Texto: Alejandro Rebossio
Data original da publicação: 19/12/2014