Previdência: maioria na Câmara não acredita que propostas serão aprovadas

Depois de ter sido engavetada e, agora, voltar a ser foco de discursos políticos governistas, a reforma da Previdência passou a ser enxergada a partir de, pelo menos, três lentes diferentes. O Executivo passa a impressão de que está tudo certo e que haverá votação na Câmara dos Deputados até setembro, ou talvez outubro, admitem técnicos da equipe econômica, nos bastidores, sem deixar o aparente otimismo de lado. Já no Congresso Nacional, a visão é menos positiva. Oito em cada 10 deputados admitem não acreditar que haja chance real de o assunto ser votado este ano, por dois motivos principais: eleições batendo à porta e base governista fraca, constatou a consultoria política Arko Advice.

Enquanto se procura um equilíbrio de expectativas entre Executivo e Legislativo, o terceiro fator, mercado financeiro, se mantém no meio termo. Embora defendam com firmeza a necessidade da reforma, os investidores mostram que não se abalarão tanto caso seja necessário desidratá-la. Em tempos politicamente instáveis, a conclusão é que não há problema em fazer mais concessões, desde que se garanta, pelo menos, a idade mínima para aposentadoria, de 62 anos para mulheres e de 65 para homens.

O governo sabe que a dificuldade de conseguir os 308 votos necessário na Câmara é enorme. Por isso, esforça-se para não deixar o assunto morrer e sinalizar ao mercado que ainda tem compromisso com a reforma, avaliam especialistas. “O foco agora é vencer as mudanças macroeconômicas, como a revisão da meta fiscal. Mas a reforma da Previdência não pode ser imobilizada, porque passaria uma mensagem ruim. Deixar o assunto em voga, ainda que não seja aprovado agora, é a melhor tática”, avaliou o coordenador de Análise Política da Prospectiva, Thiago Vidal.

Expectativas

Nesse cenário, o que antes incomodava o governo, como os rumores sobre pontos que precisam ser mudados, hoje é comemorado. “É um sinal de que o assunto ainda está em pauta”, avaliou uma fonte do Executivo. O discurso para a sociedade, no entanto, é de que o texto precisa ser aprovado no plenário do jeito que foi proposto pelo relator, Arthur Maia (PPS-BA), em abril. O texto de Maia diminuiu em R$ 200 bilhões a economia prevista para os próximos 10 anos com as alterações em aposentadorias, pensões e outros benefícios. “Vamos tentar passar a reforma tal qual foi aprovada na comissão especial, sempre reconhecendo, é claro, que quem decide é o Congresso”, reforçou o secretário de Previdência Social do Ministério da Fazenda, Marcelo Caetano, em entrevista ao Correio, na última terça-feira.

Para retomar o assunto agora, arquivada a primeira denúncia contra o presidente Michel Temer, e em meio à expectativa de que chegue outra nos próximos dias, os deputados que ainda têm alguma esperança de votar a reforma este ano discutem o que mais pode ser mudado no texto. Parte do DEM, por exemplo, defende que o tempo de contribuição seja revisto — a ideia do governo é exigir que os brasileiros trabalhem 25 anos, e não mais 15, como é hoje, para poder pedir aposentadoria.

“Ainda não tem nada oficial por parte do governo, mas estamos discutindo as opções. Por enquanto, trabalhamos com a proposta que saiu da comissão, mas sabendo que será mantido o que for consenso. O que levanta divergência será extraído. Talvez seja melhor deixar para o próximo governo os pontos que geram dificuldades”, disse o líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB). Entre os assuntos que devem avançar sem mudanças, ele acredita que estão a idade mínima e “a questão de focar em quem ganha acima do teto do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS)”.

Com o mesmo viés de poupar os menos favorecidos, outros partidos da base, como o PSDB, insistem que o Benefício de Prestação Continuada (BPC) seja deixado como é atualmente: idosos de baixa renda podem receber um salário mínimo por mês quando completam 65 anos. A proposta do relator aumenta essa idade para 68 anos. “É uma sugestão cruel, porque mexe diretamente com os mais vulneráveis”, argumentou uma deputada tucana.

Embora defenda que a proposta seja aprovada como passou na comissão especial, o coordenador de Previdência do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Rogério Nagamine, enfatizou que, dentro das opções, as alterações “menos traumáticas” seriam, de fato, na idade de acesso ao BPC e no tempo de contribuição. A segunda seria uma forma de mostrar comprometimento com os mais pobres, já que o mais difícil para eles é completar o tempo de contribuição, e não a idade mínima. “Mas acho que as pessoas estão discutindo isso de uma forma muito superficial”, ressaltou. “O mercado de trabalho melhorou muito nos anos 2000. A tendência é que a densidade contributiva aumente, não fique mais na casa dos 20 anos de contribuição, em média, como é hoje.”

Fonte: Correio Braziliense
Texto: Alessandra Azevedo
Data original da publicação: 29/08/2017

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