Pesquisadores e entidades defendem ampliação da NR-17 para proteção dos trabalhadores

Dezenas de pesquisadores, professores, sindicalistas, profissionais e entidades relacionadas à área de saúde do trabalhador, inclusive o Instituto Trabalho Digno e a ABRASTT – Associação Brasileira de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora, divulgaram nesta quarta-feira (11) uma Nota Técnica em que analisam as propostas de  alteração da Norma Regulamentadora nº 17 – Ergonomia (NR-17), defendendo que, para modernizar a norma, é preciso que ela seja mais protetora do que a versão vigente, fazendo para isso sugestões concretas.

Veja a seguir a íntegra da Nota Técnica.

Revisão da NR 17/2019: é preciso modernizar e proteger mais a Saúde dos Trabalhadores

Sobre a proposta de revisão da NR 17

Profissionais técnicos da área da ergonomia, saúde do trabalhador, entidades de classe, e pessoas que atuam na área de proteção aos direitos dos trabalhadores pelo trabalho digno e decente, analisando o atual texto para a NR 17 colocado em Consulta Pública pela Secretaria de Previdência e Trabalho, consideram que, na comparação com o antigo texto da NR-17 de 1990, o texto atual proposto manteve a essência fundamental da ergonomia como disciplina que detém princípios norteadores e fundamentos para a ação pública e privada, a partir de seu objetivo da adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores e ao
elencar condições físicas, materiais e organizacionais de trabalho como se segue:

17.1.1. Esta Norma Regulamentadora visa a estabelecer as diretrizes e os requisitos que permitam a adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores, de modo a
proporcionar conforto, segurança, saúde e desempenho eficiente.

17.1.1.1. As condições de trabalho incluem aspectos relacionados ao levantamento, transporte e descarga de materiais, ao mobiliário, às máquinas e equipamentos e às condições ambientais do posto de trabalho e à própria organização do trabalho.

No entanto, é preciso destacar que algumas medidas concretas e objetivas existentes na NR 17 vigente foram excluídas, trazendo um prejuízo significativo para a efetividade das ações de prevenção de acidentes e doenças relacionados ao trabalho. Em especial, trata-se da exigência de pausas dentro do tempo efetivo de trabalho para descanso e recuperação psico-fisiológica nos casos em que as demandas de trabalho não possam ser eliminadas ou reduzidas e provoquem fadiga física e mental, como sobrecarga muscular estática e dinâmica do pescoço, ombros, dorso e membros superiores e Inferiores, e particularmente em atividades de trabalho com elevadas cargas cognitivas e/ ou psíquicas (estas últimas no caso de realização da atividade em ambientes com violência, assédio, e outros constrangimentos).

Apontamos, nesse documento, algumas sugestões adicionais, fundamentadas em normas internacionais de referência.

Sugestões de acréscimos complementares sublinhadas no texto que segue:

Acompanhando o princípio da Ergonomia que deve adaptar as condições de trabalho às características psico-fisiológicas dos trabalhadores e considerar para a análise e intervenção das situações de trabalho as características da natureza e conteúdo da atividade exigida, solicita-se atenção ao seguinte item:

17.3. Avaliação das situações de trabalho

17.3.1. A organização deve realizar o levantamento preliminar das situações de trabalho que em decorrência da natureza e conteúdo da atividade requerida demandam adaptação às características psicofisiológicas dos trabalhadores.

E, de forma correspondente, às demais condições de trabalho elencadas, a “organização do trabalho” deve manter o mesmo princípio:

17.4 Organização do trabalho

17.4.1 A organização do trabalho deve ser adequada às características psicofisiológicas dos trabalhadores e à natureza do trabalho a ser executado.

17.4.2. A organização do trabalho, para efeito desta NR, deve levar em consideração o nível micro das tarefas e atividades de trabalho (trabalho prescrito e trabalho real) e o nível macro do sistema de atividade

que se organiza em função do objeto da produção de bens e serviços:
Mantendo os sub-itens apresentados e complementados (ENGESTRO M.Y. 1987. Learning by expanding : an activity-theoretical approach to developmental research. Helsinki: Orienta-Konsultit), quais sejam):
1.

a) as normas e regras de produção;
b) o modo operatório;
c) a exigência de tempo;
d) a determinação do conteúdo de tempo;
e) o ritmo de trabalho;
f) o conteúdo das tarefas;
g) dimensionamento e capacidade do efetivo/ equipe;
i) a divisão do trabalho e as relações hierárquicas;
h) os instrumentos, meios técnicos materiais e imateriais disponíveis;
j) a relação com a comunidade ( clientes, órgãos de controle);
k) e a relação com outros sistemas/ rede de atividades.

Sugere-se complementos ao item 17.4.2. como se segue:

17.4.2 Nas atividades que exijam sobrecarga muscular estática ou dinâmica do pescoço, ombros, dorso e membros superiores e inferiores devem ser adotadas medidas técnicas de engenharia, organizacionais e administrativas com o objetivo de eliminar ou reduzir a repetição de movimentos dos membros superiores ou inferiores e as posturas extremas ou nocivas de trabalho.

17.4.2.1. Para as atividades de trabalho em que são exigidas repetitividade e/ou sobrecarga muscular estática ou dinâmica do pescoço, ombros, dorso e membros superiores e inferiores, devem ser incluídas pausas para descanso, asseguradas pausas psicofisiológicas que devem ser computadas como tempo de trabalho efetivo.

17.4.3. Para as atividades de trabalho em que são exigidas elevadas cargas cognitivas e/ ou psíquicas (estas últimas no caso de realização da atividade em ambientes com episódios de violência, assédio, e outros  constrangimentos mentais e afetivo-emocionais que possam resultar em fadiga mental, devem ser incluídas pausas para descanso, asseguradas pausas psicofisiológicas que devem ser computadas como tempo de
trabalho efetivo.

17.4.4. Para que as pausas possam propiciar descanso e recuperação psicofisiológica dos trabalhadores,devem ser observados os seguintes requisitos:

a) A introdução de pausas não pode ser acompanhada do aumento da cadência individual;

b) As pausas devem ser obrigatoriamente usufruídas fora dos locais de trabalho, em ambientes que ofereçam conforto térmico e acústico, disponibilidade de bancos ou cadeiras e água potável;

c) No local de repouso deve existir relógio de fácil visualização pelos trabalhadores, para que eles possam controlar o tempo das pausas.

d) A participação em quaisquer modalidades de atividade física, quando ofertada pela empresa, pode ser realizada apenas em um dos intervalos destinado a pausas, não sendo obrigatória a participação do
trabalhador, e a sua recusa em praticá-la não é passível de punição.

e) Fica facultado o fornecimento de lanches durante a fruição das pausas, resguardas as exigências sanitárias.

f) As saídas dos postos de trabalho para satisfação das necessidades fisiológicas dos trabalhadores devem ser asseguradas a qualquer tempo, independentemente da fruição das pausas.

17.4.5. Para as atividades de trabalho em que são exigidas escalas de trabalho em turnos e noturno, principalmente aquelas em que a atividade de trabalho interfira no repouso noturno, que sejam implementadas medidas efetivas e rigorosas na proteção da saúde dos trabalhadores, com ênfase na
prevenção de doenças crônicas, e de acidentes do trabalho. Dentre as medidas preventivas, devem se incluir, de acordo com a avaliação das exposições ocupacionais ( isoladas e combinadas) ao longo das distintas jornadas diurnas e noturnas, a implantação de medidas cabíveis, tais como:

a) a inclusão de pausas para descanso além daquela destinada à refeição, conforme item 17.4.4.;

b) a implantação de escalas que permitam a redução de noites consecutivas de trabalho;

c) a adequação da jornada diária de trabalho a partir das exigências físicas, cognitivas e psíquicas das atividades;

e) a redução da jornada de trabalho diária ou semanal, conforme estipulado no artigo sétimo, inciso 14 da Constituição Federal do Brasil de 1988.

Sugere-se, ainda, explicitar importantes aspectos organizacionais do trabalho e do conteúdo temporal das jornadas de trabalho, mantendo os itens de 17.4.3. a 17.4.5., incluindo os itens abaixo:

17.4.6. A organização das tarefas deve ser efetuada com base em estudos e procedimentos de forma a atender os seguintes objetivos:

a) a cadência requerida na realização de movimentos de membros superiores e inferiores não deve comprometer a segurança e a saúde dos trabalhadores;

b) as exigências de desempenho devem ser compatíveis com as capacidades dos trabalhadores, de maneira a minimizar os esforços físicos estáticos e dinâmicos que possam comprometer a sua segurança e saúde;

c) o andamento da atividade deve ser efetuado de forma menos árdua e mais confortável aos trabalhadores;

d) facilitar a comunicação entre trabalhadores, entre trabalhadores e supervisores, e com outros setores afins.

17.4.7. A empresa deve possuir contingente de trabalhadores em atividade, compatível com as demandas e exigências de produção, bem como mecanismos para suprir eventuais faltas de trabalhadores, e exigências relacionadas ao aumento de volume de produção, de modo a não gerar sobrecarga excessiva aos trabalhadores.

17.4.8. Mudanças significativas no processo produtivo com impacto no dimensionamento dos efetivos devem ser efetuadas com a participação do Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do  Trabalho – SESMT, da CIPA e do Comitê de Ergonomia, se houver, em conjunto com os supervisores imediatos.

17.4.9. Na organização do processo de produção deve ser considerada a variabilidade dos materiais empregados, a diversidade de produtos finais com sua efetiva variabilidade temporal requerida para sua produção e as necessárias mudanças de posto de trabalho, troca de equipamentos e ajuste dos assentos.

17.4.10. Os mecanismos de monitoramento da produtividade ou outros aspectos da produção não podem ser usados para aceleração do ritmo individual de trabalho para além dos limites considerados seguros.

17.4.11. A alternância de atividades deve ser efetuada, sempre que possível, entre as tarefas com cadência estabelecida por máquinas, e equipamentos com outras tarefas em que o trabalhador possa determinar livremente seu ritmo de trabalho.

17.4.12. De acordo com a avaliação das situações de trabalho realizadas, caberá implantar o uso de estratégias compensatórias como os Rodízios.

17.4.12.1. O empregador deve implementar rodízios de atividades, se avaliado como uma medida efetiva, dentro da jornada diária que propicie o atendimento de pelo menos uma das seguintes situações:

a) alternância das posições de trabalho, tais como postura sentada com a postura em pé;

b) alternância dos grupos musculares solicitados;

c) alternância com atividades sem exigências de repetitividade;

d) redução de exigências posturais, tais como elevações, flexões/extensões extremas dos segmentos corporais, desvios cúbitos radiais excessivos dos punhos, entre outros;

e) redução ou minimização dos esforços estáticos e dinâmicos mais frequentes;

f) alternância com atividades cuja exposição ambiental ao ruído, umidade, calor, frio, seja mais confortável;

g) redução de carregamento, manuseio e levantamento de cargas e pesos;

h) redução da monotonia.

17.4.13. Os rodízios devem ser definidos pelos profissionais do SESMT e pelo Comitê de Ergonomia, se houver, e implantados com a participação da CIPA e dos trabalhadores envolvidos.

17.4.14. O SESMT e o Comitê de Ergonomia da empresa, quando houver, devem avaliar os benefícios dos rodízios implantados e monitorar a eficácia dos procedimentos na redução de riscos e queixas dos trabalhadores, com a participação dos mesmos.

17.4.15. Os rodízios não substituem as pausas para recuperação psicofisiológica previstas nesta NR.

Preocupados, nessa revisão com a modernização e aperfeiçoamento da normatização brasileira em saúde e segurança dos trabalhadores, alinhada às diretrizes internacionais, caberia abordar nesta NR-17 de Ergonomia, medidas de prevenção a aspectos psicossociais do trabalho com nocividade para a saúde e segurança dos trabalhadores.

17.9. Aspectos psicossociais:

17.9.1. Considerando o desenho de ambientes de trabalho saudáveis deve-se proporcionar:

17.9.1.1. Níveis de Demandas quantitativos e qualitativos seguros para a saúde dos trabalhadores: assegurar que os trabalhadores possam lidar com demandas físicas, cognitivas e emocionais de trabalho requeridas
pela produção;

17.9.1.2. Níveis de Controle seguros e saudáveis sobre o Trabalho: assegurar que os trabalhadores tenham um grau de margem de manobra, autonomia e controle confortável sobre as demandas e ritmo de trabalho requeridos, resguardando a oportunidade de consulta e participação em decisões que modifiquem o conteúdo do seu trabalho, jornada e ritmo de trabalho;

17.9.1.3. Estimular e proporcionar níveis saudáveis e seguros de Suporte e Apoio Social: assegurar que os trabalhadores possam receber suporte e apoio para a realização das demandas de produção através dos seus
superiores hierárquicos, colegas de trabalho, clientes e integração no coletivo de trabalho;

17.9.1.4. Assegurar níveis saudáveis de exigências emocionais na relação com clientes/pacientes, mantendo o cuidado com situações de controle/ocultação de emoções;

17.9.1.5. Previsibilidade e antecipação de situações negativas de estresse: assegurar que os trabalhadores possam participar ou ser informados com antecedência das mudanças de planos para o trabalho que é
executado no tocante a demissões intempestivas, redução de salário e outras formas de insegurança de renda e custeio das suas despesas ordinárias;

17.9.1.6. Assegurar níveis de exigências compatíveis com valores e ética profissional nas relações com clientes e fornecedores assegurando a minimização de conflitos e contrariedade de valores morais e éticos;

17.9.1.7. Nas relações hierárquicas, assegurar que não ocorra ambiguidade de papéis e falta de clareza nas exigências e responsabilidades requeridas para o trabalho;

17.9.1.7.1. Os superiores hierárquicos diretos dos trabalhadores devem ser treinados para buscar no exercício de suas atividades:

a) facilitar a compreensão das atribuições e responsabilidades de cada função;

b) manter aberto o diálogo de modo que os trabalhadores possam sanar dúvidas quanto ao exercício de suas atividades;

c) facilitar o trabalho em equipe;

d) conhecer os procedimentos para prestar auxílio em caso de emergência ou mal estar;

e) estimular tratamento justo e respeitoso nas relações pessoais no ambiente de trabalho.

17.9.1.8. Implantar medidas efetivas para a prevenção de atos de violência física, psicológica e moral, assédio sexual e moral dentro do local de trabalho na relação com colegas, clientes e superiores hierárquicos e internamente à organização.

Para aderir à nota, envie nome, formação de base e instituição de vínculo, se tiver, para o e-mail: Nr17revisao@gmail.com

No caso de entidades, envie nome completo da instituição, CNPJ e site, se houver.

Referências Internacionais:

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Fonte: Instituto Trabalho Digno
Data original da publicação: 11/09/2019

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