Guillaume Descazal, de 35 anos, está há seis meses usando a bicicleta mais do que nunca. Ele é o responsável pela pesquisa informática na Crédit Coopératif e, em abril, aceitou a experiência piloto lançada pelo Governo do presidente François Hollande para incentivar os trabalhadores a utilizarem o transporte limpo para chegar ao trabalho.
A sede da Crédit Coopératif fica em Nanterre, nos arredores de Paris, e Descazal trocou sua moto por uma bicicleta. A empresa, em troca, paga 0,25 euro por cada quilômetro percorrido. “Os 30 euros [99 reais] em média por mês que me pagam me ajudaram a comprar um bicicleta nova, porque a que eu uso no meu tempo livre é de montanha”, diz o funcionário, após retirar o equipamento especial que usa para pedalar pelas ruas de Paris.
A experiência piloto acabou em 1 de dezembro. Participaram trabalhadores de 20 empresas, e o Governo prepara a apresentação de suas conclusões. Enquanto isso, já acatou uma proposta apresentada pelos Verdes na Assembleia Nacional em sua Lei de Transição Energética para obrigar as empresas a compensarem os trabalhadores que usam a bicicleta para ir ao trabalho. Atualmente, só pagam (até o teto de 55 euros por mês) para quem usa o transporte público.
Essa é uma das várias iniciativas tomadas na França para tornar o país um exemplo de desenvolvimento sustentável. A todas elas se somou esta semana uma das mais drásticas e inovadoras: a prefeita da capital, Anne Hidalgo, anunciou que a cidade ficará livre de veículos a diesel em pouco mais de cinco anos. Paralelamente, enquanto Paris aumenta suas comunicações no subsolo com 200 novos quilômetros de trilhos de metrô, na superfície haverá um ar mais limpo e mais pessoas de bicicletas. O uso deste veículo está aumentando, mas transitar nele em Paris continua sendo, atualmente, uma temeridade.
O Governo e sua poderosa ministra da Ecologia, Ségolène Royal, não foram tão longe. Esta última, inclusive, entrou no debate afirmando que a proibição ao uso das lareiras, que estava prevista para janeiro de 2015, era um exagero. Isso apesar de especialistas afirmaram que o fogo que queima durante uma tarde em uma lareira emite tantas partículas quanto um antigo carro a diesel de oito anos que tenha percorrido vários milhares de quilômetros. Mas, em seu ministério, trabalham para oferecer um prêmio de 10.000 euros para quem trocar seu antigo carro a diesel por um elétrico ou híbrido, para incentivar a pesquisa verde no setor e para impor aos carros, como faz a Alemanha, um sistema que permita a identificação rápida dos veículos que mais poluem. A França, um país altamente industrializado, quer, definitivamente, mudar de ares.
O transporte é o principal emissor de gases do efeito estufa no país (27% do total). Além disso, o diesel, que é utilizado por 60% da frota automobilística francesa, emite micropartículas que são cancerígenas, segundo levantamento de 2012 da Organização Mundial da Saúde (OMS). As montadoras de automóveis, no entanto, consideram errada a proibição generalizada. Argumentam que os novos carros a diesel têm filtros que impedem a emissão de micropartículas prejudiciais à saúde. Na PSA, fabricante francesa das marcas Citroën e Peugeot, a mais importante da Europa em veículos deste tipo, há um ceticismo. “A qualidade do ar não vai melhorar. Nós já temos no mercado oito milhões de veículos a diesel livres de micropartículas. O importante é distinguir entre os antigos, os que poluem mais, e os novos”, afirma a este jornal a porta-voz da empresa, Laure de Servigny, que acrescenta: “Segundo nossas projeções, em 2020 só haverá na França 3% de veículos elétricos e 20% híbridos. O resta será de gasolina ou diesel”.
“Os veículos velhos a diesel são uma aberração. São o verdadeiro problema”, diz Jean-Baptiste Renard, diretor do laboratório de física e química do meio ambiente do CNRS, o instituto público de pesquisa. “Para limpar o ar de Paris seria preciso estender a limitação a esses veículos à periferia e, em geral, consumir menos”. Nisso estão as fábricas de automóveis e as autoridades públicas, que preveem promover ainda mais o transporte público e veem na bicicleta um aliado ideal.
Tudo menos uma repetição dos picos de poluição do passado, como em dezembro de 2013 e março deste ano, quando nas ruas de Paris se respirava o mesmo ar de um cômodo de 20 metros quadrados com oito fumantes.
A França e, principalmente, Paris, querem se aproximar do estilo de vida nórdico. A mudança pode gerar um interessante nicho econômico, o verde, que melhorará a qualidade de vida de seus cidadãos e, de quebra, reduzirá o gasto energético. O edifício reformado do Crédit Coopératif é de energia positiva (gasta menos do que produz), e vários de seus empregados decidiram ir trabalhar de bicicleta. É o meio de transporte de Christophe Vernier, que foi o incentivador dele dentro da empresa. Afirma estar satisfeito: “É bom para o meio ambiente, é bom para o assalariado, porque faz exercício e ganha um prêmio, e é bom para a empresa porque reduz o estresse de seu pessoal, que sofre menos doenças e é mais produtivo, ainda que sejam resultados difíceis de se medir”.
Fonte: El País
Texto: Gabriela Cañas
Data original da publicação: 15/12/2014