Os jovens serão as principais vítimas da crise econômica causada pela pandemia a longo prazo

Fotografia: Fernando Frazão/Agência Brasil

Nos Estados Unidos, o presidente Donald Trump afirmou que a economia está voltando com força total. Mas o país tem hoje mais desempregados do que em qualquer momento da história desde a Segunda Guerra Mundial.

O crescente número de casos de coronavírus em muitas partes do país provavelmente resultará em milhões de outros desempregados, já que alguns estados são forçados a retomar medidas de isolamento. E o mercado de trabalho não vai voltar aos níveis pré-pandemia por no mínimo 10 anos, segundo uma previsão do Escritório de Orçamento do Congresso.

Globalmente, as consequências da pandemia também são terríveis. Diferentemente dos Estados Unidos, muitos países europeus adotaram programas de ajuda econômica de larga escala com o objetivo de evitar o desemprego em massa. Mas, à medida que os países começam a reabrir suas economias, esses programas estão sendo reduzidos ou cortados ― uma situação que pode levar a um aumento súbito nas demissões.

Muitos empregos que existiam antes da pandemia “não voltarão”, disse recentemente o primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson. “Estamos diante de uma crise muito real.”

A taxa de desemprego entre os britânicos pode atingir quase 15% ― uma das mais altas da Europa ―, de acordo com um novo relatório da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

O número de vagas fechadas na Europa, nos Estados Unidos e em outros países desenvolvidos é 10 vezes maior agora do que nos primeiros meses que se seguiram à crise financeira de 2008, afirmou a OCDE.

“Em questão de poucos meses, a crise da covid-19 acabou com todos ganhos no mercado de trabalho registrados desde o fim da crise financeira de 2008”, disse Stefano Scarpetta, diretor de emprego, trabalho e assuntos sociais da OCDE.

Os jovens que estão entrando agora no mercado de trabalho foram particularmente atingidos pela devastação econômica. E os efeitos de longo prazo só estão começando a ser sentidos.

Na última década, os jovens vêm desempenhando funções cada vez mais mal remuneradas, especialmente nos setores de hospitalidade e varejo. Esses empregos estão entre os mais afetados pela pandemia, de acordo com um relatório divulgado na semana passada pelo Institute for Fiscal Studies, um centro de estudos com sede em Londres.

As repercussões econômicas provavelmente se farão sentir por muito tempo, afirma o relatório. Isso vai significar impacto direto no avanço da carreira e nas perspectivas salariais de muitos jovens.

“Mesmo uma recessão normal pode ser especialmente prejudicial para os jovens, pois o congelamento de novas contratações afeta desproporcionalmente aqueles que estão entrando no mercado de trabalho e aqueles que estariam progredindo em suas carreiras”, disse Agnes Norris Keiller, co-autora do relatório do Institute for Fiscal Studies.

O relatório da OCDE também aponta os prováveis desafios que os jovens enfrentarão nos próximos meses e anos. Os formandos deste ano encontrarão um mercado de trabalho turbulento ao terminar seus estudos, e os millennials passam pela segunda grande convulsão econômica ― a crise de 2008 já fora muito prejudicial para suas perspectivas econômicas

Aquela crise acelerou mudanças estruturais em uma economia que vinha crescendo havia décadas. Como escreveu Michael Hobbes no HuffPost em 2017 sobre a situação dos millennials:

“Os salários estão estagnados, e setores inteiros foram para o buraco. Ao mesmo tempo, o custo de todos os pré-requisitos para uma existência segura ― educação, moradia e assistência médica – estão na estratosfera. Da segurança do emprego à rede de segurança social, todas as estruturas que nos isolam da ruína estão se erodindo. E as oportunidades que garantem uma vida de classe média ― com as quais os baby boomers tiveram a sorte de contar ― estão cada vez mais fora do nosso alcance. Faça as contas. Não é surpresa que sejamos a primeira geração na História moderna a ficar mais pobres do que nossos pais.”

Nos países desenvolvidos, quase 1 de cada 10 empregos ocupados por pessoas com menos de 30 anos de idade foi destruído durante a crise financeira da década passada. Muitos jovens ainda sofrem as consequências: insegurança financeira, enormes dívidas, empregos mal remunerados, benefícios em declínio, dificuldade de comprar uma casa própria.

Agora, a pandemia de coronavírus se soma a esses problemas. “Mais uma vez, os jovens correm o risco de estar entre os grandes perdedores da crise atual”, afirmou o relatório da OCDE.

Na semana passada, o ministro das Finanças britânico, Rishi Sunak, divulgou uma série de medidas econômicas destinadas a apoiar jovens que procuram emprego, bem como as indústrias de hospitalidade e turismo.

O ponto central da proposta de Sunak é um programa de US$ 2,5 bilhões que vai subsidiar vagas para jovens com menos de 25 anos durante 6 meses.

“Os jovens arcam com a maior parte do fardo das crises econômicas, mas eles correm um risco particular neste momento, porque trabalham nos setores desproporcionalmente atingidos pela pandemia”, afirmou Sunak. “Também sabemos que o desemprego entre os mais jovens tem um impacto de longo prazo na empregabilidade e nas perspectivas salariais. Não queremos que isso aconteça com essa geração.”

Sunak também anunciou que os empregadores que se beneficiaram do programa de manutenção de empregos receberiam um bônus de £ 1.000 para cada funcionário que continuar empregado pelo menos até janeiro. O programa começará a ser reduzido em agosto e terminará em outubro.

Sunak disse “ainda há dificuldades por vir”, mas insistiu que ninguém ficará “sem esperança”. Ele disse aos parlamentares que o governo fará “o possível” para preservar empregos.

Os bilhões de libras investidos na revitalização da economia devem beneficiar muita gente. De acordo com o Institute for Fiscal Studies, os empréstimos tomados pelo governo para o ano fiscal de 2020-2021 devem ultrapassar £ 300 bilhões, de longe a mais alta proporção do PIB britânico desde a Segunda Guerra Mundial.

Mas os críticos dizem que é necessário fazer muito mais.

Locatários que correm o risco de despejo pedem mais apoio do governo. Os trabalhadores mais velhos também dizem são ignorados pelo foco nos jovens. Economistas e líderes empresariais argumentam que as medidas não serão suficientes para evitar uma nova onda de demissões.

“O timing dessas novas medidas parece ruim. Pode haver um novo aumento do desemprego”, disse Garry Young, vice-diretor do National Institute for Economic and Social Research, um centro de estudos londrino.

“Se você me perguntar: ‘Dá para proteger todos os empregos?’”, é claro que a resposta é não. Se a pergunta for: ‘O desemprego vai aumentar?’. A resposta é sim, e a escala disso será significativa”, disse Sunak à BBC na semana passada. 

“Estamos entrando em uma das recessões mais duras que o Reino Unido já viu. É claro que isso terá um impacto significativo no desemprego.”

Debates semelhantes estão ocorrendo em todo o mundo, à medida que os países se deparam com o fato de que a pandemia não é simplesmente uma interrupção econômica momentânea, mas um desafio de longo prazo.

Ainda não se sabe se os governantes estarão à altura do problema. Os líderes europeus devem finalizar nesta semana os detalhes de um plano de recuperação econômica de € 750 bilhões (US$ 849 bil). Mas ainda não há consenso sobre como implementar essa ajuda econômica.

Nos Estados Unidos, o fim dos benefícios adicionais de desemprego no final deste mês poderia resultar em milhões de americanos com dificuldade para pagar suas contas. Além disso, a suspensão temporária dos despejos determinada em vários estados está para terminar – muita gente pode ser forçada a deixar sua casa. Enquanto isso, a reabertura da economia em várias regiões do país deve forçar muitos trabalhadores fazer uma escolha impossível: receber um salário ou proteger sua saúde.

Enquanto isso, democratas e republicanos no Congresso continuam divididos sobre os detalhes de um novo pacote de ajuda econômica.

Os americanos, porém, terão de esperar. Na semana passada, os legisladores deixaram Washington para um recesso de duas semanas.

Fonte: HuffPost Brasil
Texto: Sasha Belenky
Data original da publicação: 14/07/2020

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