O presidente Jair Bolsonaro disse na sexta-feira (19/7) que “falar que se passa fome no Brasil é uma grande mentira”. A declaração foi dada durante um encontro com jornalistas, no Palácio do Planalto, em Brasília.
“Passa-se mal, não se come bem, aí eu concordo. Agora passar fome, não. Você não vê gente, mesmo pobre, pela ruas com o físico esquelético como se vê em outros países pelo mundo”, disse o presidente.
Criticado pela declaração, Bolsonaro reviu sua opinião horas depois, em outro evento, ao reconhecer que “uma pequena parte (dos brasileiros) passa fome”. Ele se irritou ao ser questionado por jornalistas se havia recuado da declaração inicial: “Se for para entrar em detalhe, em filigranas, eu vou embora. Não estou vendo nenhum magro aqui. Temos problemas alimentares no Brasil? Temos. Não é culpa minha, vem de trás.”
De fato, dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) indicam que a fome ainda não foi erradicada do Brasil.
Segundo a última pesquisa do órgão sobre o tema, de 2013, 3,6% dos brasileiros têm insegurança alimentar grave. O índice correspondia a 7,2 milhões de pessoas no ano da pesquisa. Na definição do IBGE, em domicílios com insegurança alimentar grave, pode-se “passar pela privação de alimentos, podendo chegar à sua expressão mais grave, a fome”.
O IBGE não colheu dados sobre a fome no Brasil desde então. Porém, é provável que o índice tenha aumentado nos últimos anos, acompanhando o crescimento da pobreza verificado a partir de 2016.
Naquele ano, 52,8 milhões de pessoas (ou 25,7% dos brasileiros) eram consideradas pobres, número que passou para 54,8 milhões (26,5%) em 2017. Não houve medições da pobreza desde então.
Não é a primeira vez que o governo Bolsonaro causa polêmica ao se referir à fome no Brasil.
Em abril, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina (DEM), afirmou que “nós não passamos muita fome porque temos manga nas nossas cidades, nós temos um clima tropical”.
Ranking da fome no mundo
Em seu último relatório “O estado da segurança alimentar e da nutrição no mundo”, de 2018, a FAO (agência da ONU para agricultura e segurança alimentar) põe o Brasil na categoria dos países com o menor índice de fome no planeta. Nessas nações, o índice de pessoas com subalimentação entre 2015 e 2017 foi “menor que 2,5%”, segundo a organização.
A FAO não cita números detalhados para os países com índices inferiores a 2,5% por considerar que as cifras não são precisas, mas sim estimativas calculadas a partir de diversos indicadores com margem de erro.
Na América do Sul, só Brasil e Uruguai alcançam essa categoria – que também abarca países altamente desenvolvidos como Austrália, Canadá, Suécia e Finlândia.
No encontro com jornalistas nesta manhã, Bolsonaro fez outra declaração contestável sobre a questão alimentar.
Ao tratar de agricultura, o presidente afirmou que “estamos (no Brasil) nos últimos lugares no tocante ao uso de agrotóxicos”.
Segundo a FAO, porém, o Brasil ocupa a 47ª posição entre 198 nações em um ranking sobre o consumo agrotóxicos por área plantada.
Quando se analisa o total de agrotóxicos consumidos por cada país, o Brasil disputa as primeiras posições da lista. Em 2013, segundo um levantamento feito pela consultoria Phillips McDougall para a FAO, o Brasil consumiu o equivalente a US$ 10 bilhões em agrotóxicos.
O resultado deixou o país na primeira posição do ranking, à frente dos Estados Unidos (US$ 7,4 bilhões), China (US$ 4,8 bilhões) e Japão (US$ 3,4 bilhões).
Fonte: BBC News Brasil
Texto: João Fellet
Data original da publicação: 19/07/2019