Para marcar o Dia Internacional do Orgulho LGBTI+, celebrado em 28 de junho, Organização Internacional do Trabalho (OIT), Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (UNAIDS) e Ministério Público do Trabalho (MPT) lançam campanha em vídeo para garantir direitos e proteção da população lésbica, gay, bissexual, travesti, transexual e intersex (LGBTI+) no Brasil.
Em meio à crise de saúde da COVID-19 e seus impactos sobre sociedade, economia e mundo do trabalho, as agências afirmam ser fundamental voltar a atenção para as pessoas historicamente excluídas por preconceitos e discriminação em relação à sua orientação sexual e identidade de gênero.
No vídeo, homens e mulheres trans, lésbicas, gays e travestis dizem o que querem: respeito, dignidade, oportunidades de trabalho decente, ser feliz, direitos, e o fim da transfobia. E perguntam: “É diferente do que você quer? Pense nisso”. O vídeo termina com uma homenagem à Amanda Marfree, mulher trans de 35 anos, que faleceu na última terça-feira (23) vítima de COVID-19. Amanda é uma das participantes do vídeo da campanha e uma grande ativista.
“A OIT tem sua missão histórica de promover o trabalho decente que só pode ser concretizado em uma sociedade onde todas as pessoas sejam livres para existir em toda sua identidade e potencialidade. As pessoas do grupo LGBTI+, especialmente as pessoas transexuais, são excluídas historicamente, o que torna sua inserção e permanência no trabalho mais difícil. A sociedade ganha com a inclusão de trabalhadores e trabalhadoras livres para exercer sua profissão, com criatividade e direitos”, disse Martin Georg Hahn, diretor do Escritório da OIT no Brasil.
A Declaração do Centenário da OIT coloca as pessoas no centro de todas as ações de promoção de justiça social e do trabalho decente. E o próprio conceito de trabalho decente sintetiza a missão da Organização de promover oportunidades para que todas as pessoas obtenham um trabalho produtivo e de qualidade, em condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade humanas.
Nesse contexto, a OIT, o UNAIDS e o MPT desenvolvem atualmente dois projetos direcionados à população trans, com objetivo de apoiar o grupo neste momento de crise, promover a capacitação profissional e o aumento do conhecimento sobre temas diversos.
O Web Cozinha&Voz atende a 100 pessoas trans em todo o país, fornecendo uma bolsa de capacitação no valor de 500,00 reais mensais e aulas de assistente de cozinha – coordenadas pela cozinheira Paola Carosella -, aulas de expressão, e de empreendedorismo, com apoio do SEBRAE. A iniciativa também promove debates com especialistas sobre temas relacionados a esta população e seus desafios.
Já o projeto Faces & Sustentabilidade, realizado em São Paulo, adquire mais de 500 quilos de alimentos diários de pequenos produtores rurais, que não estavam conseguindo escoar sua produção com a crise. Os alimentos são usados na produção de 1.000 marmitas por dia, por sua vez distribuídas em comunidades na cidade. A produção das refeições é feita pela escola de gastronomia Hotec e 30 alunos e alunas, incluindo 10 mulheres trans, auxiliam na preparação dos alimentos, enquanto participam de uma formação profissional.
Os alunos e alunas recebem também uma bolsa no valor de 500,00 reais, alimentação e auxílio deslocamento. O uniforme utilizado pelos estudantes é produzido por migrantes e refugiados, completando o ciclo de sustentabilidade. Além dos parceiros mencionados, o projeto conta com o apoio da Unicamp e do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA).
Experiências de estigma e discriminação
Segundo dados do Índice de Estigma em relação às pessoas vivendo com HIV/AIDS realizado em 2019 no Brasil, um estudo inédito no país conduzido em sete capitais brasileiras, mais de 90% da população trans já sofreu discriminação na vida por conta da sua identidade de gênero.
Entre as situações de estigma e discriminação mais comuns, comentários discriminatórios, principalmente por membros da família, são o que mais afeta a população trans: ao menos 80,6% das pessoas relataram já terem passado por essa situação. Assédio verbal (74,2%), exclusão de atividades familiares (69,4%) e agressão física (56,5%) também aparecem como as situações de violência relacionadas à identidade de gênero que mais afetam essa população.
Os dados foram levantados entre abril e agosto de 2019, com 1.784 pessoas vivendo com HIV e com AIDS em sete capitais brasileiras: Manaus (AM), Brasília (DF), Porto Alegre (RS), Salvador (BA), Recife (PE), São Paulo (SP) e Rio de Janeiro (RJ).
“Parece óbvio, mas vivemos num tempo em que ainda é preciso mostrar que somos todos iguais em nossos sonhos e em nossas buscas por uma vida melhor. E que temos orgulho de ser quem somos, temos solidariedade e amor”, diz Ariadne Ribeiro, assessora para apoio comunitário do UNAIDS no Brasil. “Este vídeo busca mostrar que podemos nos enxergar como humanos e abraçar todas as causas, sem deixar ninguém para trás”, conclui Ariadne, que é mulher trans e vive com HIV há mais de duas décadas.
Inclusão no mundo do trabalho
Por muito tempo, a discussão sobre identidade de gênero ficou à margem na sociedade. Populações LGBTI (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros e Intersex) possuem uma série de especificidades sociodemográficas e de identidade, além das intersecções que aumentam a discriminação, como gênero, raça, idade, religiosidade e etnia. Dentre desses grupos, homens e mulheres transexuais são os mais vulneráveis a toda sorte de estigma, preconceito e violência.
No mundo do trabalho, as pessoas LGBTI sofrem com disparidades salariais, maior informalidade, preconceitos e prejuízos oriundos da divisão sexual do trabalho, do racismo e da homolesbotransfobia. As opções profissionais LGBTI são frequentemente restritas a setores específicos, caracterizados por altos níveis de informalidade e por ocupações de baixa qualificação, ainda que tenhamos profissionais extremamente preparados(as), fortalecendo a vulnerabilidade e facilitando a exploração.
O debate sobre da empregabilidade de pessoas transexuais está sendo colocado em empresas e discutido, no Brasil, mais fortemente no Fórum Nacional de Empresas e Direitos LGBTI. De acordo com o Observatório da Diversidade e da Igualdade de Oportunidades no Trabalho, da OIT e do Ministério Público do Trabalho, de 5.570 municípios brasileiros, apenas 21 possuem conselhos de direitos LGBTI.
Para a Procuradora do Trabalho em São Paulo e gerente do Projeto do MPT de empregabilidade da população LGBTIQ+, Sofia Vilela: “É relevante darmos voz e oportunidades à população LGBTIQ+. Por isso, o MPT compreende que, além de haver um eficiente combate a todas as formas de discriminação em razão da orientação sexual e identidade de gênero, é preciso desenvolver e estimular políticas públicas para a inclusão dessa população no mercado de trabalho com a finalidade de oferecer trabalho decente, o qual haja respeito, dignidade e igualdade entre todas as pessoas.”
Fonte: ONU Brasil
Data original da publicação: 29/06/2020