por Laura Glüer
Na primeira segunda-feira de setembro, os Estados Unidos da América festejam o Labor Day – Dia do Trabalho (lá não se comemora o 1º de maio como nos demais países). Neste ano de 2023, em especial, a data teve uma importante peculiaridade: uma onda intensa e crescente de renascimento das lutas de trabalhadores e do movimento sindical.
A onda começou em julho, com a greve de roteiristas dos grandes estúdios de Hollywood, apoiada por muitas celebridades do cinema. Às vésperas do 4 de julho, o feriado da Independência dos Estados Unidos, foi a vez dos trabalhadores de hotéis. Uma greve unificada parou boa parte dos serviços de 19 hotéis de Los Angeles e Orange (condado da Califórnia). Redes como Hyatt, Hilton e Accor não queriam sequer negociar o aumento salarial reivindicado – de US$ 5 por hora. Sob a liderança do sindicato Unite Here Local 11, o levante teve a adesão de milhares de cozinheiros, camareiros, lavadores de pratos, garçons, mensageiros e recepcionistas. Em assembleia, 96% da categoria apoiou a proposta de greve – a base da entidade soma mais de 32 mil trabalhadores.
Representados pelo sindicato International Brotherhood of Teamsters, 97% dos 340.000 motoristas do gigante dos correios UPS (United Parcel Service) votaram para entrar em greve. Um acordo entre empresa e sindicato foi firmado no final de julho.
Ainda em julho, o United Auto Workers (Sindicato dos Metalúrgicos) anunciou que está pronto para iniciar uma greve dos seus 150 mil associados, caso as chamadas Big Three de Detroit (as montadoras Ford, Stellantis e General Motors) não concordem com os termos pleiteados para as renovações de contratos em setembro. As negociações se encerram na quinta, 14 de julho. Se acontecer, essa promete ser a maior de todas as greves do ano de 2023.
Em resumo, quase 900 greves eclodiram nos EUA nos últimos meses e o ano de 2023 já contabiliza 44 paralisações. Um fenômeno surpreendente, em um país que há muito tempo não via a força das mobilizações de trabalhadores.
Os EUA tiveram o auge do sindicalismo na virada dos anos 1940, chegando a atingir o patamar de 33% dos trabalhadores sindicalizados. Porém, houve declínio do movimento com a Lei Taft-Hartley, de 1947, que estabeleceu legislação antigrevista e anticomunista, estimulando a perseguição a sindicalistas.
Agora, em meio à quarta revolução industrial, com o avanço da Inteligência Artificial, e a precarização das relações de trabalho, indicando uma crise do Capitalismo moderno, o sindicalismo está renascendo com uma importante missão: como preservar empregos e proteger os trabalhadores neste cenário.
O “novo sindicalismo” traz para o debate questões fundamentais do futuro do trabalho e, com isso, começa a conquistar a simpatia da opinião pública. Sondagem recente do Instituto Gallup mostra que 71% da população estadounidense tem opinião favorável acerca dos sindicatos, o nível mais elevado desde 1965. Entre as pessoas com menos de 30 anos, esse número sobe para 88%.
Com mais consciência e organização da base, é possível retomar a luta sindical em novos patamares. Em entrevista à BBC, o diretor do Centro de Estudos do Trabalho, Emprego e Democracia da Universidade da Califórnia, Nelson Lichtenstein analisou que “os sindicatos entraram no modo ofensivo, o que não víamos há muito, muito tempo”.
A criação de estruturas sindicais na Junta Nacional de Relações Laborais dos EUA teve aumento de 53% em 2022, com uma tendência a aumentar este ano. O número de trabalhadores que aderiram a movimentos grevistas também subiu seis vezes nos últimos dois anos.
O governo dos EUA, em período pré-eleitoral, está atento ao cenário. Biden, desde Roosevelt, é o presidente que mais discursou em defesa do movimento sindical. Um de seus mantras é que “Wall Street não construiu o país. A classe trabalhadora é que construiu este país – e os sindicatos construíram a classe trabalhadora”. O senador Bernie Sander, também do Partido Democrata, afirmou em recente discurso que “hoje estamos vendo que trabalhadores se levantam e lutam de uma maneira que não vimos em décadas”.
O desafio para o fortalecimento dos sindicatos nos EUA e nos demais países passa pela ampliação da base sindical. Aumentando o número de associados aos sindicatos, essas entidades se fortalecem para seguir em frente na luta.
As centrais sindicais precisam buscar também as novas gerações. Aos poucos, trabalhadores da Starbucks e Amazon, empresas hostis à atuação sindical, começam a fazer sua sindicalização. Nos EUA, ainda é baixo o percentual de sindicalizados. No setor privado, apenas 6% dos trabalhadores estão associados a alguma entidade.
O renascimento do sindicalismo nos EUA tem muito a ensinar para países como o Brasil, onde a Reforma Trabalhista enfraqueceu a luta sindical. Temas relacionados ao futuro do trabalho frente à tecnologia e a proteção da classe trabalhadora serão capazes de unificar os trabalhadores brasileiros no atual contexto histórico? O tempo dirá, mas fica a reflexão.
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