Demorou cinco meses, mas o governo finalmente divulgou os primeiros dados de emprego e desemprego no país em 2020. Alegando falta de algumas informações e mudanças no sistema, a equipe econômica não havia divulgado nenhuma informação até agora e os primeiros números que vieram a público indicam uma situação alarmante.
Segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), o Brasil perdeu 860.503 empregos com carteira assinada entre janeiro e abril. O número de admissões do último mês está abaixo do número de demissões. Foram 598.596 contra 1.459.099. Frente a abril do ano passado, o índice de demissões está 17,2% superior e o de admissões 56,5% inferior.
Os resultados indicam que o aumento no desemprego começou antes da chegada da pandemia no coronavírus, a despeito das sucessivas afirmações de Jair Bolsonaro (sem partido) de que o isolamento social para conter a doença iniciaria uma deterioração no mercado de trabalho. Desde a tramitação da reforma trabalhista, que vigora desde 2017, especialistas vinham alertando sobre o enfraquecimento da proteção ao trabalhador.
As críticas se intensificam com as novas flexibilizações, propostas para enfrentamento da crise causada pelo vírus. A Medida Provisória 936 suspende contratos, reduz jornadas e salários, entre outras definições. O economista Marcelo Manzano, da Fundação Perseu Abramo, afirma que os dados do Caged apresentam um quadro de deterioração grave.
Ele lembra também que a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) revelou um acréscimo de mais de 3,7 milhões de trabalhadores informais entre fevereiro e abril. Nas palavras do economista, a desestruturação do mercado de trabalho é profunda.
“O que isso nos revela? Primeiro que a reforma trabalhista de 2017 – que foi, de maneira oportunista, realizada sob a bandeira de que flexibilizando as regras de trabalho e reduzindo os custos trabalhistas nós teríamos maior volume de emprego no país – fracassou completamente. Não só não gerou emprego, como agora – em uma situação de crise – é muito mais fácil demitir, muito mais difícil garantir condições de segurança e de estabilidade no trabalho, tão necessárias para as famílias trabalhadoras.”
“A culpa é do vírus”
A análise é de que sem esse enfraquecimento e se o Brasil estivesse vindo de um momento positivo na economia, poderia haver mais recursos e organização para enfrentar a crise pandêmica. A economia estaria mais forte para que fossem colocadas em prática medidas de proteção ao trabalho. Mas, no discurso do governo, a deterioração econômica em geral está diretamente ligada ao coronavírus.
Há cerca de dois meses, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmava que o país estava em pleno voo quando a doença chegou ao Brasil. Nesta sexta-feira, após a divulgação dos resultados do Produto Interno Bruto, ele voltou atrás. Disse que vai pedir novas análises para observar se o Brasil já estava no que chamou de “estado meio anêmico”.
Marcelo Manzano afirma que a inação e a omissão do governo Bolsonaro e da equipe de Paulo Guedes são fatores decisivos no quadro atual.
“Esse governo não agiu como precisava, como outros governos ao redor do mundo estão fazendo. Governos, inclusive, alinhados ideologicamente ao de Bolsonaro. Como o caso do Boris Johnson, na Inglaterra, que adotou medidas de sustentação de todos os empregos do país, com o governo assumindo 80% dos salários dos trabalhadores. Medidas semelhantes ocorreram na Espanha, na França, na Argentina. Aqui, entretanto, Paulo Guedes e sua equipe resistem a adotar medidas de intervenção sobre o mercado de trabalho e a economia. Resistem por conta de seu apego à tese do equilíbrio fiscal e da dificuldade de acreditar que o governo é capaz de realizar gastos públicos num momento como este.”
Os dados do Caged mostram ainda que São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro registraram os maiores números em fechamento de vagas. O único setor que teve saldo positivo entre contratações e demissões foi o da agricultura. Construção civil, comércio, serviços e indústria, apresentaram resultados negativos. O Brasil tem hoje quase 13 milhões de desempregados e cerca de 6,5 milhões de subocupados.
Fonte: Brasil de Fato
Texto: Nara Lacerda
Data original da publicação: 30/05/2020