O cancelamento das 800 demissões anunciadas pela Volkswagen na fábrica de São Bernardo, com acordo que prevê, entre outros itens, a vinda de um novo produto para a unidade e a manutenção de postos de trabalho até 2019, “põe a defesa do emprego na pauta nacional”, avalia o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Rafael Marques. “É um alerta, para criar um caldo de cultura, um antídoto a qualquer situação que possa criar aumento da taxa de desemprego. O ano de 2015 depende muito de ações e de lideranças comprometidas com o país”, afirma.
Essas ações serão importantes para os próximos meses, em que a economia brasileira, ainda sob impacto da crise internacional, deverá passar por ajustes, “Vamos ter um primeiro semestre muito difícil e um segundo revertendo, melhorando”, avalia Rafael. Mas ele observa que as medidas a serem implementadas não podem ter como preço o fechamento de postos de trabalho. “Não é esse o caminho que a presidenta Dilma apresentou e tenho certeza de que não é o que ela quer.”
Na Volks, ele acredita que o acordo aprovado em assembleia resolve o problema da unidade, além de garantir investimentos. Além disso, embora não seja a medida considerada ideal pelos metalúrgicos, trará o Jetta, fabricado no México, para ser montado na fábrica do ABC, a partir da metade do ano, via CKD (veículos desmontados). “A montagem hoje envolve 400 trabalhadores. Esse carro pode se tornar plataforma mundial. Na sua nova versão, pode passar a ser totalmente produzido em São Bernardo. Essa unidade precisa de carro de maior valor agregado. É uma planta que está se modernizando a passos largos”, diz o sindicalista. A fábrica, de 1959 (a primeira da montadora alemã fora do país de origem), tem 13 mil funcionários e produz 1.200 veículos por dia.
O acordo que encerrou a greve, após dez dias, vale até 2019. Prevê ainda reajuste com base na inflação integral nesse período. Este ano, o reajuste e um aumento real (acima da inflação) de 2% serão pagos em forma de abono, na terça-feira (20). No próximo, o ganho real também se dará via abono, enquanto o INPC será incorporado. As cláusulas sociais também vão até 2019.
Houve melhorias na proposta inicial da empresa, que havia sido rejeitada no final do ano passado. Mas Rafael considera fundamental implementar um sistema de proteção ao emprego, para todo o setor, conforme pauta já apresentada ao governo federal. Na última terça-feira, por exemplo, ele se reuniu com o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Miguel Rossetto. “Todas as informações que a gente recebeu até agora, de ministros e da própria presidenta Dilma, são de que o programa é positivo, moderno, e ajuda a fazer a gestão de momentos difíceis. O compromisso (de Rossetto) foi de conversar com a presidenta para ter o sinal de como conduzir o sistema de proteção.”
Ele espera que o programa seja adotado e anunciado em breve. “Nós reivindicamos que o governo posso colocar de pé esse programa no primeiro trimestre. E nós defendemos que seja um programa para todos os trabalhadores no Brasil, mesmo que seja agora um programa-piloto”, observa Rafael. “A gente reconhece que teve um desempenho negativo da indústria (em 2014), e há ameaça de que isso se repita. É uma medida que pode preservar empregos.”
Sobre a política de desonerações ao setor, interrompida neste 2015, ele lembra que outras atividades também foram beneficiadas durante momentos ruins da economia. “Não podemos deixar de analisar que sobre o Brasil caem os efeitos da crise internacional. O Brasil resiste bravamente, mas os efeitos existem. As exportações caíram fortemente, o ano passado foi o pior para o setor. As desonerações foram importantes, mas reconhecemos que anos seguidos desse modelo podem proporcionar distorção. Mas não acho que isso é ruim e acabou. Isso é importante e poderá ser usado. A indústria automobilística e outros setores são muito sensíveis a alterações macroeconômicas. O mundo vive uma turbulência. O desafio é grande. A luta que a gente fez e as ações que a gente fez tiveram efetividade sobre o emprego.”
O dirigente também defende o aumento do crédito no setor, a exemplo do que ocorreu nas áreas imobiliária e rural. “Segue sendo uma questão fundamental. As medidas estão longe de esgotar”, afirma, acrescentando que a relação crédito/PIB, de 58% no Brasil, chega a 60%, 70% em países como Argentina e Chile, a 98% na Alemanha e a mais de 100% nos Estados Unidos.
Para o metalúrgico, a movimentação no Volks pode ser uma sinalização positiva em uma luta prioritária este ano, que é a defesa do emprego. “Começamos bem com a Volks. Acho que é um bom recado para as demais montadoras. Isso fortalece o movimento sindical. As centrais estão com o emprego na pauta.”
Fonte: Rede Brasil Atual
Texto: Vitor Nuzzi
Data original da publicação: 16/01/2015