Lucros das empresas são o principal motor da inflação nos EUA

A inflação é o tema mais debatido nos últimos tempos. A escalada dos preços da maioria dos bens e serviços que adquirimos no nosso dia-a-dia, desde os produtos alimentares aos combustíveis, passando pela eletricidade e pelo gás, já tinha começado ao longo de 2021, mas acentuou-se significativamente no início de 2022. A invasão russa da Ucrânia e a disrupção que esta causou nas cadeias de distribuição globais de produtos como o gás natural, o petróleo ou os cereais têm contribuído para esta tendência.

Um dos aspetos mais importantes do debate atual é o que diz respeito ao que está a causar a inflação. Nos EUA, muitos economistas apontavam o crescimento salarial como um dos motores da inflação. Na Europa, este debate tem sido menos expressivo, sobretudo pelo facto de os salários continuarem estagnados, o que impossibilita a tese de que os atuais aumentos de preços se devem a um crescimento salarial generalizado.

Economic Policy Institute (EPI) procurou fornecer uma resposta para este debate. Para isso, olhou para a evolução das três principais componentes dos preços da maioria dos bens e serviços: custos salariais, outros custos de produção (matérias-primas, energia, transporte, etc.) e margens de lucro das empresas. A análise do EPI foi feita com base em dados sobre as empresas não-financeiras, que representam cerca de 75% do setor privado norte-americano.

Conclusão: não são os salários que estão a provocar a inflação; na verdade, o principal motor da subida dos preços tem sido o aumento dos lucros das empresas.

Entre o segundo trimestre de 2020 e o quarto trimestre de 2021, os custos unitários do trabalho (que podem ser utilizados como indicador do crescimento salarial) foram responsáveis por apenas 7,9% da subida dos preços. A evolução dos custos das matérias-primas e outras componentes explica 38,3% da subida dos preços. Já os lucros das empresas explicam 53,9% desta subida. Por outras palavras, o aumento dos lucros é o principal responsável pela inflação registada desde o início da pandemia.

Poder de mercado tem sido “canalizado para aumentar os preços”

Josh Bivens, autor desta análise do EPI, relaciona este aumento dos lucros com o poder de mercado das empresas. O poder de mercado, isto é, a capacidade de as empresas fixarem preços elevados de forma a maximizarem os seus lucros durante a crise, tem sido “canalizado para aumentar os preços [dos produtos]”, explica Bivens.

O economista aponta uma resposta para este problema: tributar os lucros extraordinários obtidos com a crise. “Uma maneira eficaz de impedir que o poder do setor empresarial seja utilizado para aumentar os preços ao longo do ano seria um imposto temporário sobre os lucros extraordinários”, pode ler-se na análise.

Em Portugal, o Bloco de Esquerda defende uma medida semelhante, sobretudo em setores como o da energia, onde as grandes empresas estão a lucrar com o aumento dos preços. É uma forma de tentar que os custos da crise não recaiam maioritariamente sobre as pessoas mais vulneráveis. A contribuição das empresas que estão a registar ganhos com a crise poderia ser utilizada para financiar medidas de combate à quebra de poder de compra da maioria das pessoas.

No entanto, o Governo continua a recusar essa solução. Questionado sobre se ponderava avançar com esta medida, o ministro da Economia, António Costa Silva, foi claro: “Nesta altura não, de todo […] O que eu posso dizer é que nós respeitamos muito as empresas e portanto não hostilizamos as empresas.”

Fonte: Esquerda
Data original da publicação: 02/05/2022

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