Licença-paternidade de 20 dias: o que dizem os pais e qual será o impacto econômico

De um lado, um pai conta, empolgado, como foi importante ficar em casa logo após o nascimento da filha. Apoiou a mulher, assumiu tarefas da casa e da bebê, compartilhou preocupações e alegrias.

De outro, um pai lembra como foi complicado deixar a mulher e o filho em casa apenas cinco dias depois do nascimento dele. Voltou ao trabalho exausto, sem foco e com a cabeça longe.

A distância que separa a realidade desses dois pais que conversaram com a BBC Brasil (leia os depoimentos abaixo) pode se estreitar em breve. Isso porque o Senado aprovou, na quarta-feira, um projeto de lei que prevê a ampliação da licença paternidade de 5 para 20 dias, inclusive nos casos de adoção.

O projeto, chamado Marco Legal da Primeira Infância (PLC 14/2015), segue agora para sanção presidencial. A ampliação do benefício é válida para as companhias que aderirem ao programa Empresa Cidadã, que já possibilita a ampliação da licença-maternidade de quatro para seis meses.

Impacto econômico mínimo

Para subsidiar as discussões do projeto, foi encomendado um estudo cruzando projeções da população brasileira com dados de mercado para mostrar como é a licença-paternidade em outros países, os benefícios disso no desenvolvimento infantil e o impacto econômico da medida.

Eduardo Marino, um dos responsáveis pelo estudo e gerente de Conhecimento Aplicado da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal (que promove pesquisas e projetos relacionados à primeira infância), disse à BBC Brasil que os benefícios para as crianças, os pais e o Brasil de uma ampliação da licença-paternidade superam, e muito, os custos da implementação.

“Do ponto de vista econômico, o impacto de se ampliar a licença-paternidade é mínimo, comparado aos benefícios. Custaria o equivalente a apenas 0,009% da arrecadação federal, ou seja, R$ 99 milhões por ano”, diz ele.

Para comparação, o valor é menos de um quinto dos R$ 576 milhões que o governo federal deve gastar este ano ressarcindo as emissoras de TV e rádio que transmitem o horário eleitoral, segundo cálculos divulgados pelo site Contas Abertas.

Papel do pai

“Dar mais dias de licença-paternidade vai na linha do que está cada vez mais claro com pesquisas em todo mundo: o papel do pai é crucial desde o acompanhamento do pré-natal, no apoio pós-parto e também no vínculo que ele cria com o bebê”, diz.

“Um pai em casa, o seu apoio à mulher, favorece a amamentação em um período crítico, em que a mãe e a criança precisam se adaptar ao processo de amamentação. É aí que costumam aparecer os problemas. E se a mulher não estiver amparada, há uma tendência maior de se desistir da amamentação e passar para as fórmulas (leite em pó).”

Segundo Eduardo, esse é um dos exemplos de como o investimento na ampliação da licença beneficia também as contas do país, já que bebês que mamam por mais tempo ficam mais protegidos de doenças como diarreia, infecções respiratórias e alergias. E bebês menos doentes oneram menos os serviços de saúde pública.

O estudo demonstra ainda como um maior envolvimento do pai na primeira infância auxilia no desenvolvimento da criança também a longo prazo. E destaca como uma extensão da licença-paternidade diminui a desigualdade de gêneros no mercado de trabalho e muda o comportamento das famílias quanto à divisão de tarefas domésticas.

No caso da administração pública e de empresas privadas com lucro real (que pagam impostos), os custos da extensão da licença seriam absorvidos pela União – quase 65% dos trabalhadores hoje se encaixam nesses casos. Assim, o gasto seria descontado do imposto pago pela empresa, por meio do programa Empresa Cidadã.

Diante de tantos dados econômicos, confira agora o lado dos pais que sofreram com uma licença de poucos dias, o dos pais que aproveitaram semanas (e até meses) em casa e também o de algumas empresas no Brasil que já concedem esse benefício:

Daniel Schwebel, gerente da área de Talentos do LinkedIn no Brasil – 3 semanas de licença

“Cinco dias de licença é algo… é impossível. Eu não sei como seria. Acho que ia ficar desmotivado, com a cabeça em outro lugar, querendo voltar logo para casa.

Para minha família, foi muito importante eu poder tirar essas três semanas de licença.

No começo, principalmente para pais de primeira viagem como nós, é bem difícil, especialmente para a mulher. Exige demais da mãe. Então, o que fiz foi cuidar de tudo relativo à casa, comida, às compras – para assim ela poder ficar livre para se dedicar à nossa filha. Como eu estava em casa o tempo todo, também pude assumir várias tarefas, como dar banho.

Eu pude curtir minha filha no comecinho da vida dela. Na hora de voltar, foi difícil. Sorte que eu posso trabalhar de casa e conseguia fazer isso até três ou quatro dias por semana.”

Leonardo Leão, gerente de Desenvolvimento de Negócios do Facebook Brasil – 4 meses de licença-paternidade

“A primeira pergunta que a maioria das pessoas me faz é: ‘Mas quatro meses é demais… você vai tirar mesmo?’ E eu sempre respondo: ‘Claro que sim! Você não tiraria se pudesse?’

É uma vantagem muito grande ter a chance de estar com meu filho o tempo todo durante os seus primeiros meses. Vou lembrar desses momentos para o resto da minha vida.

Acho que iria estranhar bastante (se tivesse de voltar ao trabalho cinco dias depois do nascimento do meu filho). Uma sensação de que estamos saindo, mas deixando um pedaço nosso em casa. Seria como se ficasse faltando alguma coisa.

Acredito que esse benefício represente de forma emblemática a filosofia de equilibrar a vida pessoal e profissional de maneira saudável.

Diferente de um período de férias, em que você usa o tempo livre para relaxar, a licença serve para você participar ativamente da nova rotina da casa. Assim, ao voltar desse período, você foca em encaixar o trabalho em sua nova rotina.”

Hélio (preferiu não ter seu sobrenome publicado), autônomo – 5 dias corridos de licença

“Tenho um filho de 2 anos e meio e uma filha de seis meses. Depois do nascimento dos dois foi a mesma coisa. Tirei só os cinco dias corridos de licença, como diz a lei.

Presto serviço para uma empresa, e não tinha como tirar mais dias. É muito triste porque na verdade não são nem cinco dias. Se você fica dois ou três dias na maternidade, sobram só dois em casa.

É muito complicado, porque chegava uma hora que minha mulher estava exausta. Acho que com toda mulher é assim. Tem que ficar acordando para amamentar.

Você precisa estar junto, para apoiar. Gostaria de ter ficado muito mais tempo para ajudar, participar mais. A gente acaba perdendo muita coisa ficando afastado.

Fora que você também volta exausto para o trabalho, não fica totalmente focado, até porque sua cabeça está longe.”

Thomas Ampessan, 27 anos, advogado do escritório Souza Schneider – 1 mês de licença

“Vou começar a licença de um mês daqui a poucos dias, quando minha filha nascer. Não conheço ninguém que tem esse benefício. Fiquei feliz desde que soube que poderia ficar um mês em casa. E ao longo desses meses fui refletindo, pensando em como vai ser bom poder ficar mais tempo com a minha filha.

Esse papel do pai é muito importante. E acho que vou voltar mais tranquilo para o trabalho, bem mais focado do que se voltado só alguns dias depois do nascimento dela.

O RH e a equipe daqui (ele trabalha no escritório de Brasília da empresa) estão me apoiando bastante; meus colegas fizeram uma reorganização das tarefas. É como se alguém estivesse saindo de férias, não é complicado.”

O QUE DIZEM AS EMPRESAS

Alexandre Ullmann, diretor de RH do LinkedIn no Brasil

“Temos essa política há cerca de um ano e meio. Temos a premissa de que o bem estar dos nossos profissionais vem em primeiro lugar.

E recebemos um retorno muito positivo dos pais. Eles dizem que é um alívio poder ficar em casa nesse período, sem ter que se preocupar com o trabalho. No Brasil, todos os funcionários que se tornaram pais usufruíram desse benefício.”

Ana Carolina Borghi, gerente de RH do Facebook para América Latina

Nossa aspiração é ser a melhor empresa para o funcionário e sua família. Fizemos várias análises, levando em conta cada mercado e o tamanho de cada escritório. E, em novembro, colocamos em prática esse benefício em todos os escritórios do Facebook no mundo.

O funcionário tem um ano para tirar essa licença, da maneira que achar melhor. Pode fracionar se quiser.

Sabemos da importância do vínculo criado entre o pai e os filhos, da importância do pai participar ativamente do cotidiano da família.

A empresa não entende como uma perda de produtividade. Temos recursos, ferramentas e outros profissionais preparados para suprir a ausência desse funcionário. Também pode ser uma oportunidade para outros funcionários terem outros desafios.”

Política do Google no Brasil

Oferece licença paternidade de até 4 semanas (28 dias) com remuneração integral aos novos pais. A licença deve ser tirada até o primeiro aniversário do bebê e é possível fazer isso em partes, desde que ele respeite o período mínimo de uma semana. Por exemplo, duas semanas logos após o nascimento e duas semanas quando o bebê estiver na fase de adaptação ao berçário.

Fonte: BBC Brasil
Texto: Mariana Della Barba
Data original da publicação: 05/02/2016

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *