A presidente Dilma Rousseff sancionou uma nova lei no último dia 8 de março que estende a licença-paternidade de cinco para 20 dias, além de garantir outros benefícios importantes aos homens. Os pais agora poderão se ausentar do trabalho por até dois dias para acompanhar a mulher a consultas e exames médicos durante a gravidez, e ganharão um dia por ano para acompanhar a criança a consultas médicas nos primeiros seis anos de vida. Pais adotivos também fazem parte dos beneficiados.
As novas regras foram destaque no noticiário no Dia Internacional da Mulher como uma conquista pela igualdade de direitos – e deveres – entre gêneros. Contudo, algumas dúvidas começam a borbulhar a partir do momento em que o texto entra em vigor. Afinal, a nova lei é obrigatória ou não? Quem poderá requerer pelo direito? Como posso pedir pela licença de 20 dias?
Apenas cadastrados no “Empresa Cidadã”
De início, é importante destacar que o benefício não atinge todos os funcionários que se tornaram pais no Brasil, pois as mudanças são obrigatórias apenas nas companhias cadastradas no ‘Empresa Cidadã’, programa do governo regulamentado em 2010 – e que já garantia a dedução nos impostos das empresas que adotaram a licença maternidade de 6 meses (e não 4 meses conforme a lei). Segundo a Receita Federal, até agora, há 2,9 milhões de trabalhadores registrados em empresas participantes, entre homens e mulheres – o que significa menos de 10% do total dos 39,6 milhões de trabalhadores com carteira assinada no Brasil, de acordo com dados de janeiro do Ministério do Trabalho.
A partir do momento em que a corporação adere ao programa, é obrigada a anunciar aos funcionários seus novos direitos e, consequentemente, a adotar as novas regras propostas. No entanto, caso não seja este o caso, a empresa continua sendo obrigada a dar a licença de 5 dias, como acontece desde a Constituição de 1988.
Outra questão que merece entendimento é que a nova licença paternidade não é aleatória: faz parte do Marco da Primeira Infância, ou PLC 14/2015, que focaliza questões legais relacionadas desde a gestação até o sexto ano da criança. “Até agora, a gente tinha apenas o ECA, que foi e é muito importante, mas precisávamos de algo específico para a primeira infância, especialmente de 0 a 3 anos, que é o momento mais sensível do desenvolvimento da criança”, explica o Gerente de Conhecimento Aplicado da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, Eduardo Marino.
Vale lembrar também que o Marco Regulatório da Primeira Infância não modifica as regras para a licença-paternidade no serviço público, que pode ser de até 30 dias, dependendo do Estado, pois este período é definido pelo órgão ou administração ao qual o servidor é vinculado, respeitando os cinco dias previstos por lei.
Para o advogado José Carlos Wahle, sócio da área trabalhista da Verano Advogados, a ampliação do benefício é um alinhamento com a tradição da Lei Trabalhista Brasileira, um movimento natural pela cultura do País, protecionista ao empregado.
“Se considerar um panorama internacional, percebe que a lei trabalhista brasileira é bastante protecionista. Diferente de modelos como dos asiáticos, que tem regras restritivas aos trabalhadores com licenças mínimas ou mesmo inexistentes, e de países como a Inglaterra e os Estados Unidos, que também possuem licenças menores. Somos próximos a países da Europa Continental, como Itália e Espanha; o que não é ruim, porque a grande massa dos trabalhadores brasileiros não tem condições de se defender sozinha”, analisa.
Além disso, o advogado considera a extensão da licença paternidade como consequência de um movimento comportamental da população, que traz maior percepção e sensibilidade sobre questões sociais e familiares.
O custo da licença estendida
Muitas pessoas podem se perguntar sobre o custo real da extensão da licença paternidade. Vale a pena o investimento? Quais os números da licença estendida?
Para as empresas, além de questões administrativas como adaptação da equipe à falta do funcionário durante mais tempo, por exemplo, os impactos são quase mínimos, já que financeiramente elas possuem subsídio do governo. É bom lembrar que a regra só vale para as empresas que têm tributação sobre lucro real.
“O valor do custo de subsidio do governo hoje chega a R$ 100 milhões de reais por ano; porém, se você considera o conjunto de imposto que elas pagam, é muito pouco. O que falta agora é a sensibilidade, a adesão das empresas. Inclusive, já existem pesquisas que mostram que o retorno para a corporação é positivo”, pontua Eduardo Marino.
Já para o Estado, há impacto financeiro, mas é pouco significativo. Segundo um estudo da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP), se o pedido de licença paternidade for requerido por todos os 7,6% dos trabalhadores formais que terão filhos em determinado ano, o custo direto do aumento de 15 dias pode variar em R$ 4,9 milhões, em 2016, com a adesão de 5% das empresas do País no Empresa Cidadã.
Ainda de acordo com o estudo, para o cenário futuro, em 2030, com 25% das empresas aderidas ao programa, há investimento de pouco mais de R$ 25 milhões, valor que se manteria ao longo do tempo – uma vez que o cenário da demografia brasileira tende à diminuição de natalidade, diminuição da população jovem e aumento da população mais velha.
“Deixar de manter a figura clássica dos ‘Tempos Modernos’, como mostrou Charles Chaplin, e reconhecer que existe um lado humano no trabalho, faz com que, além de maior produtividade, haja maior lealdade do funcionário a empresa”, destaca o advogado trabalhista. “Rotatividade alta gera custos – treinar funcionários diminui produtividade. Não é só produção, é fidelidade. Não é só dinheiro, mas também valorização”, finaliza José Carlos.
A licença paternidade pelo mundo
O número de países que concedem a licença paternidade aumentou de 41 para 79, entre 1994 e 2013, segundo dados da OIT (2014). Desses, 90% têm benefício remunerado. As licenças mudam muito de um lugar para o outro, variando entre 1 e 90 dias. Em alguns casos, ocorrem benefícios extensos (com mais de duas semanas), como na Finlândia, Islândia, Lituânia, Portugal e Eslovênia.
De acordo com a OIT, em todo o mundo, apenas 3 países têm a licença paternidade compulsória – que ajuda a garantir que os pais dividam as responsabilidades e cuidados com o bebê e permite o envolvimento masculino nos estágios iniciais do desenvolvimento da criança.
O que os pais acham disso?
O iG quis saber qual a opinião dos pais sobre a nova licença paternidade sancionada no país. Afinal, cinco dias foram suficientes? O que eles pensam da extensão do período ao lado da mulher e bebê?
Rodrigo Schiefler Fernandes, 37 anos, bancário, pai de Luisa, de 2 anos, e Helena, de 1 mês
“Eu tirei a licença de cinco dias corridos e, para mim, foi suficiente. Acho que o benefício deveria ser flexível – para que o homem possa optar por mais tempo. Penso que deveria ter um desconto parcial de dias trabalhados, caso o funcionário opte por mais de cinco dias, se não, vira festa.”
Murilo Andrade Filho, 41 anos, engenheiro de segurança do trabalho, pai de Miguel, de 5 anos
“Acho interessante a extensão da licença paternidade do ponto de vista paterno. Como pai de primeira viagem, teria apreciado mais tempo. Depois da cesárea, a Patrícia, minha mulher, ficou bastante debilitada, e o Miguel teve de, efetivamente, aprender a mamar, foi um processo complicado e durou alguns dias. Assim, as correrias externas, como ir a supermercado, farmácia, eu que fazia. Não que o homem necessite da licença, mas eu pude perceber que a mulher precisa desse apoio. Muita gente encara como um período de descanso, mas não é. É um momento de apoio”.
Daniel Oliveira, 30 anos, estatístico, pai de Cauã, de 1 ano e 11 meses
“Não tem o que falar, a licença paternidade estendida seria melhor para todos os pais. Em cinco dias, a ficha nem cai! Você fica deslumbrado. Vejo dois colegas meus que voltaram após 5 dias e estavam desnorteados. Eu emendei as férias com a licença, tentei ajudar a Flávia, minha mulher: revezava os cuidados quando o Cauã chorava, ou coisas como buscar água para ela durante a amamentação, porque tinha muita sede. Vinte dias ainda não é muita coisa, porque o primeiro mês é muito tenso, muito tenso mesmo, mas já é alguma coisa.”
Bruno Calderon Trenti, bancário, pai de Mateus, de 1 ano e 1 mês
“Tirei apenas 5 dias e foi um período muito importante para estar com meu filho e, principalmente, com minha esposa. A mulher precisa de muita de ajuda para cuidar da criança. E, se pudesse, gostaria de ter mais tempo de licença. Afinal, há benefícios para a criança, com mais estímulos, e também a ajuda paterna nas atividades de casa”.
Fonte: IG
Texto: Ana Lis Soares
Data original da publicação: 15/03/2016