Aos 61 anos, Marinalva Dantas é uma mulher comum: mãe, avó, já foi casada e enfrenta dramas e problemas como qualquer pessoa. A missão que abraçou, por outro lado, é extraordinária. Auditora fiscal do Trabalho, ela passou quase 10 anos à frente do grupo do Governo Federal que combate à escravidão no Brasil. Mergulhada nessa causa, Marinalva libertou mais de 2.300 homens, mulheres e crianças nos rincões do país.
Para tanto, teve de abrir mão da vida pessoal e da convivência com os dois filhos e marido. Tudo devido à sua dedicação extrema na luta contra o trabalho escravo que ainda assola o Brasil. Após 127 anos da assinatura da Lei áurea, em 1888, o país ainda tem cerca de 155 mil cativos. Eles moram em barracos no meio do mato, recebem alimentação precária, são obrigados a beber água suja e não têm nenhum direito trabalhista.
A Dama da Liberdade, publicado pela Benvirá, selo de não ficção e ficção da Saraiva, é resultado de cinco anos de pesquisa do autor Klester Cavalcanti. Três vezes vencedor do Prêmio Jabuti de Literatura – uma delas com seu livro anterior, “Dias de Inferno na Síria” –, o jornalista tem acompanhado o trabalho de Marinalva desde o início e não apenas fez um perfil da poderosa mulher, como traz ao debate a questão ainda persistente do trabalho escravo nos dias de hoje. Klester viajou por sete Estados, entrevistando quase setenta pessoas, entre elas familiares de Marinalva, policiais, aliciadores de escravos, o ex-presidente da República, Fernando Henrique Cardoso e ex-escravos. Sua pesquisa inclui quase 120 horas de entrevistas, a leitura de 2 mil páginas de documentos e a análise de cerca de 200 fotos e 30 horas de vídeos. “Acho importante contar a história dessa mulher, que representa todas as pessoas que combatem o trabalho escravo no Brasil, em pleno século 21, o que torna essa história ainda mais impactante”, diz Cavalcanti.
As ações de Marinalva lembram cenas de filmes de Hollywood, com mobilização da polícia federal, tiroteio com capangas de fazendeiros, resgate de homens, mulheres e crianças mantidos cativos em fazendas dos rincões do Brasil. Em muitos casos, os escravagistas são políticos brasileiros e grandes empresários. Como não poderia deixar de ser, Marinalva é uma dessas personalidades desconhecidas do grande público que vivem ameaçadas de morte. A publicação de sua história de luta e apego às causas libertárias pode comover as pessoas. Sua vida retratada nesse trabalho trará aos leitores algumas horas de suspense, ação, romance e aventura.
Como destaca o cineasta Fernando Meirelles no prefácio: “O jornalista Klester Cavalcanti deve ter algum tipo de compulsão ou distúrbio que o leva, a cada livro que escreve, a situações mais extremas, sempre com o objetivo de revelar, para quem o lê, uma espécie de lado B do mundo. A Dama da Liberdade segue essa tônica, ao nos colocar dentro do universo do trabalho escravo no Brasil, uma realidade impensável no século XXI, mas mais presente do que supomos. A esperança é que este livro caia nas mãos de quem coordena essa área no Ministério do Trabalho. Após sua leitura, não há como não querer que dezenas de Marinalvas sejam replicadas pelo Brasil, para nos livrar desta vergonha que é o trabalho escravo, de uma vez por todas”.
Fonte: Portal no Ar
Data original da publicação: 24/05/2015