Clemente Ganz Lúcio
Nos anos 1990, o movimento sindical jogou na defesa, enfrentando baixo crescimento, hiperinflação, arrocho salarial, desemprego, pobreza, precarização, informalidade, desigualdade, entre outros problemas. No jogo social, somente a tática da defesa não transforma a realidade.
Em meados da década passada, o jogo mudou e o ataque passou a fazer parte da tática. Os resultados foram crescimento econômico, geração de emprego, aumento dos salários, redução de desigualdade e informalidade etc. Vitórias importantes foram conquistadas, como a política de valorização do salário mínimo ou o reconhecimento das Centrais Sindicais, entre tantas outras.
Entretanto, um olhar retrospecto atento e crítico indica que o time abdicou muitas vezes do ataque, perdeu gols e campeonatos. Exemplo claro: não se conseguiu a redução da jornada de trabalho para 40 horas, apesar de a bola quicar na área muitas vezes. Preciosismos? Tentar um gol de placa? Um toque a mais e a bola bateu na trave!
Deixar de atacar significou não realizar mudanças no sistema de relações de trabalho que levassem ao aumento da representatividade dos sindicatos, ao enraizamento da organização sindical no local de trabalho, ao fortalecimento das negociações coletivas em todos os níveis, à criação de mecanismos e processos de solução ágil de conflitos, ao amplo direito de greve, ao direito de negociação no setor público, entre outros inúmeros avanços urgentes e necessários para a verdadeira modernização trabalhista, parte fundamental do desenvolvimento econômico e social do país. Modernizar, para o time sindical, é ampliar e elevar o padrão civilizatório das relações sociais no campo do trabalho e da produção. Jamais destruir ou retirar direitos.
Essas mudanças fazem falta no presente e farão mais ainda no futuro próximo, pois os jogos voltaram a ser, predominantemente, no campo do adversário, com chuva, gramado pesado, torcida única (deles!) e muitas outras adversidades. Será um tempo que exigirá muito dos nossos atletas, de toda a torcida, dos dirigentes e de toda a comissão técnica. Necessário, sem dúvida, reforçar muito a defesa. Mas time que só joga na defesa não ganha campeonato. É preciso um bom meio de campo para armar nosso ataque.
Será necessário construir capacidade para que o movimento sindical volte ao ataque para buscar resultados, como o crescimento econômico sustentado no desenvolvimento produtivo nacional, o fortalecimento do mercado de consumo interno de massa, a geração de empregos de qualidade, o aumento dos salários, a redução das desigualdades, a consistente participação no comércio mundial, a preservação ambiental, a democracia, a liberdade e a soberania nacional.
Para que esses resultados venham, teremos que vencer muitas partidas dificílimas. Para armar as estratégias e táticas, será preciso reunir forças e ter união em torno de propósitos. A quantidade e gravidade dos problemas exigirão um olhar a partir do interesse geral do país e da nação, sem os quais, as soluções específicas ou corporativas poderão se constituir em derrotas estruturais para a grande maioria.
O jogo social não para nunca e são sempre inéditos o presente e as possibilidade abertas de futuro. No jogo social, a utopia cumpre papel fundamental para armar as estratégias e táticas, pois indica o sentido maior para a movimentação no presente e anima a luta para construir e antecipar o futuro. A utopia enuncia o inédito, que um outro mundo é possível, e é capaz de animar mentes, mobilizar corações e resgatar a paixão de lutar.
Clemente Ganz Lúcio é sociólogo, diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES).