Instituto Trabalho Digno
Fonte: Instituto do Trabalho Digno
Data original da publicação: 19/06/2019
Não bastou matar o Ministério do Trabalho. Para os governantes atuais, era preciso esquartejá-lo e salgá-lo, expondo em praça pública os restos para que os trabalhadores não mais sonhem com direitos.
Um dos pedaços particularmente esmagados é a Inspeção do Trabalho, formalmente reduzida a uma subsecretaria sem autonomia e sem voz, a SubSIT, em verdade sob intervenção permanente. Antes, a gestão da Inspeção do Trabalho era feita por um auditor-fiscal do trabalho, mas ao ser rebaixada para subsecretaria, o dirigente real passou a ter indicação exclusivamente política, daí caracterizar-se a intervenção.
O interventor é Bruno Silva Dalcolmo, formado em Relações Internacionais, que atuou na área de aviação civil até ser levado à assessoria da Casa Civil do governo Temer pelo ministro Eliseu Padilha. Por ter colaborado na redação da “Reforma Trabalhista”, foi promovido, pelo governo Bolsonaro, à Secretário do Trabalho.
Como secretário, é quem dirige a Inspeção do Trabalho, retirando qualquer autonomia do subsecretário. Retirou da SubSIT o comando sobre a elaboração das normas regulamentadoras e sobre o julgamento das multas e recursos, restringiu ainda mais o orçamento, decide sobre o e-social, dentre muitas atribuições, até mesmo do processo tripartite de discussão de normas, cada vez mais precarizado.
O Interventor não deixa dúvida também sobre qual é o seu lado. Uma análise da sua agenda oficial do mês de maio de 2019, por exemplo, mostra que deu prioridade à receber dirigentes da Abiarroz (indústria do arroz), CNI (confederação da indústria), Indústria de Parafusos, Indústria Portuária, Indústria de tratores e vagões (Iochpe-Maxion), Conglomerado COSAN, Indústrias Multinacionais, Confederação Nacional do Sistema Financeiro e da Federação Brasileira de Bancos, Banco Santander, Petrobras e Câmara Americana de Comércio. Não houve na sua agenda nenhum representante dos trabalhadores.
O único ponto aparentemente destoante da agenda do Interventor da Inspeção do Trabalho foi o fato de ter recebido, no dia 16/5, Martin Hahn, Diretor do Escritório da Organização Internacional do Trabalho – OIT no Brasil. A OIT, ainda atônita com o desmonte patrocinado pelo empresariado após 2016, solicitou uma reunião para “entender as prioridades do novo governo e discutir áreas de cooperação”.
Dias depois, ante ao fato do Brasil se encontrar sob análise da Comissão de Peritos da OIT desde a violação de direitos promovida pela “Reforma Trabalhista”, o Interventor, ao invés de preocupar-se com o teor das recomendações do organismo internacional em relação à proteção do Trabalho, fez um duro ataque aos peritos da OIT, dizendo que não são “nem imparciais e nem objetivos”.
O mal-estar gerado pelo ataque do Interventor foi tamanho que a União Europeia – UE e seus 28 países saíram em defesa da entidade e de seus peritos. Declararam que “a UE e seus estados apoiam os padrões da OIT, seu mecanismo de supervisão e nos manteremos firmes contra qualquer tentativa de enfraquecer ou minar o sistema”, num recado indireto à estratégia usada pelo preposto do governo Bolsonaro.
O secretário Dalcolmo, todavia, continua firme no propósito de atender os interesses da Indústria. Seguindo fielmente a cartilha da CNI denominada “Modernização previdenciária e da segurança e saúde no trabalho: ações para avançar”, de 2018, ataca prioritariamente o instituto de embargo e interdição, visando mitigar a atuação dos auditores-fiscais do trabalho – AFT.
Segundo o documento da CNI, é necessário “fixar competência e critérios para os atos de interdição e embargos”. Atualmente, por decisão judicial, os AFT, diante de situações de risco grave e iminente à vida, não apenas têm o poder, mas o dever de paralisar as atividades que oferecem risco grave ao trabalhador, tanto de acidente, quanto de doença.
Nesse sentido, o Interventor iniciou o processo que visa alterar radicalmente a Norma Regulamentadora 3 (NR-3) que trata do embargo e interdição. Sob pretexto de incluir “critérios técnicos”, o exige que se inclua uma “matriz de risco”, mecanismo pelo qual as doenças do trabalho e situações grave de risco de acidentes do trabalho, muitas vezes resultando em morte, fiquem isentas à atuação dos AFT.
Todas as NR se encontram sob ataque do governo Bolsonaro, mas a NR-3 é particularmente sensível porque pode paralisar um processo produtivo se este oferece risco à saúde e à vida dos trabalhadores.
O Artigo 13 da Convenção 81 (revogada pela Ditadura Militar e revigorada pelo Decreto nº 95.461, de 11/12/1987) da OIT diz que “1. Os inspetores de trabalho serão autorizados a providenciar medidas destinadas a eliminar defeitos encontrados em uma instalação uma organização ou em métodos de trabalho que eles tenham motivos razoáveis para considerar como ameaça à saúde ou à segurança dos trabalhadores”.
Diz ainda o mesmo artigo da Convenção 81 que os inspetores têm o poder de ordenar ou de fazer ordenar “que sejam tomadas imediatamente medidas executivas no caso de perigo iminente para a saúde e a segurança dos trabalhadores”.
A ameaça atual contra a NR-3 é um caso de VIDA OU MORTE DOS TRABALHADORES. Os que defendem os direitos dos trabalhadores e tem a obrigação legal de atuar por sua proteção não podem se omitir.