Imposto mundial sobre a riqueza pode tirar bilhões da pobreza. Entrevista com Omar Ocampo e Chuck Collins

Embora esteja politicamente fora de alcance, vale a pena pensar em um imposto sobre a riqueza global. Afinal, os acordos fiscais globais já têm precedentes nesse tipo de tratado que já é existente. Mas, ainda mais importante, há percepções críticas a serem colhidas na concepção de tal imposto.

Esses insights são explorados em um novo relatório elaborado por Omar Ocampo e Chuck Collins do Institute for Policy Studies, em colaboração com a Oxfam, Patriotic Millionaires, e a Fight Inequality Alliance. Entre outras coisas, Taxing Extreme Wealth oferece uma análise detalhada dos bilionários e multimilionários do mundo — revelando tanto a extensão de sua riqueza de tirar o fôlego quanto os tipos de iniciativas que poderiam ser financiadas com um imposto sobre a riqueza global.

Luke Savage, da Jacobin, se reuniu com Ocampo e Collins para discutir o relatório e suas conclusões.

Omar Ocampo é pesquisador do Programa Desigualdade e Bem Comum.

Chuck Collins é o diretor do Programa sobre Desigualdade e o Bem Comum no Instituto de Estudos Políticos, onde coedita https://inequality.org. Ele é o autor de The Wealth Hoarders: How Billionaires Pay Millions to Hide Trillions.

Confira a entrevista

LS – O relatório inclui alguns fatos impressionantes sobre a extensão da desigualdade de riqueza – tanto globalmente quanto dentro de cada país. Mas antes de chegarmos as conclusões, gostaria de perguntar sobre os cálculos em si. De onde vieram seus dados e qual foi o escopo de sua análise?

OO – Este relatório é único na medida em que escavamos na camada de riqueza que está abaixo dos bilionários. Sabemos muito sobre a riqueza dos bilionários, nos Estados Unidos e globalmente, graças à Forbes Bloomberg e suas estimativas de riqueza just-in-time. Mas não sabemos tanto sobre o resto do patrimônio líquido da classe alta, aqueles com mais de US$ 5 milhões ou mais de US$ 50 milhões em riqueza.

Por exemplo, estimamos haver mais de 183.000 pessoas no mundo com riqueza superior a US$ 50 milhões que têm uma riqueza combinada de US$ 36,4 trilhões. Aplicamos então um imposto sobre a riqueza semelhante ao defendido por Elizabeth Warren, um imposto progressivo sobre a riqueza com taxas mais altas sobre os bilionários.

O que difere neste relatório é que pegamos os dados da Wealth-X, uma empresa privada de pesquisa patrimonial que construiu um banco de dados global bastante substancial sobre os ricos. Seus principais clientes são pessoas sem fins lucrativos, grandes instituições de caridade que fazem grandes arrecadações de fundos e empresas de luxo que vendem produtos de luxo para multimilionários e bilionários.

LS – Chegando às suas conclusões, o relatório estima que um imposto global sobre a riqueza cobrando dos milionários e bilionários poderia levantar um pouco mais de US$ 2,5 trilhões por ano. Como exatamente você chegou a esse valor e como seria na prática esse imposto sobre a riqueza?

CC – Analisamos dados globais e nos concentramos nos 70 países que representam 98% do PIB global. Há muitos países que não possuem relatórios fiscais ou estimativas da riqueza privada. Mas pensamos incluir a maioria dos multimilionários e bilionários do mundo.

Aplicamos uma série de fórmulas diferentes de impostos sobre a riqueza, mas no relatório, discutimos apenas duas. A primeira aplica uma taxa de imposto anual de 2% sobre a riqueza entre US$ 5 milhões e US$ 50 milhões; 3% sobre a riqueza entre US$ 50 milhões e US$ 1 bilhão; e 5% sobre a riqueza acima de US$ 1 bilhão. Esta é a taxa que arrecadaria US$ 2,5 trilhões.

Uma segunda taxa de imposto sobre a riqueza visa realmente reduzir agressivamente a riqueza dos bilionários, com uma taxa de imposto anual de 10%. Esta taxa se aproximaria dos U$S 3,6 trilhões por ano. Nos Estados Unidos, ela aumentaria U$S 1,34 trilhão. Mas também olhamos para taxas mais altas e o que elas poderiam aumentar.

Algumas outras estatísticas que achamos interessantes são:

  • 3,6 milhões de pessoas no mundo têm individualmente mais de US$ 5 milhões em riqueza, que, somada, dá uma riqueza de US$ 75,3 trilhões.
  • Há 1.436.275 indivíduos com um patrimônio líquido de US$ 5 milhões ou mais, com uma riqueza total de US$ 28 trilhões.
  • Existem 63.505 indivíduos nos EUA com um patrimônio de US$ 50 milhões ou mais, com uma riqueza combinada de US$ 12,8 trilhões.
  • Entre 2016 e 2021, o número de indivíduos norte-americanos com riqueza superior a US$ 50 milhões aumentou de 37.140 para 63.505, com a riqueza combinada aumentando de US$ 8,4 trilhões para US$ 12,8 trilhões, um ganho de 51,84%, ajustado à inflação.

LS – A conclusão mais importante do relatório Tributação da Extrema Riqueza é um roteiro de como funcionaria um imposto sobre a riqueza global. Você pode nos dar um resumo dessas conclusões? Que tipo de coisas poderia uma receita anual de US$ 2,5 trilhões realmente pagar?

OO – Estimamos que U$S 2,5 trilhões são suficientes para tirar 2,3 bilhões de pessoas da pobreza, criar vacinas suficientes para todo o mundo e proporcionar assistência médica e proteção social universal para todos os cidadãos de países de baixa renda — uma estimativa de 3,6 bilhões de pessoas.

De acordo com o Banco Mundial, há 3,3 bilhões de pessoas abaixo da sua linha de pobreza de menos de US$ 5,50 por dia. Custaria, em média, US$ 901 por pessoa para tirá-las da pobreza. Com relação às vacinas, as vacinas de COVID-19 custariam US$ 27,8 bilhões. A proteção social universal e os cuidados com a saúde custariam US$ 440,8 bilhões. Em 2020, a lacuna financeira para alcançar a cobertura universal de proteção social e cuidados de saúde para países de baixa e média renda era de US$ 440,8 bilhões.

Com a Oxfam International e a Fight Inequality Alliance, trabalhamos com países individuais para identificar como a receita poderia ser implantada em seus países, principalmente com o objetivo de expandir os sistemas de saúde pública. O relatório da planilha informativa inclui folhas com muitos detalhes de 44 países.

LS – Evidentemente, este relatório é algo como um exercício de pensamento utópico. O que quer dizer: atualmente nos falta a infraestrutura institucional global para instituir um imposto mundial sobre a riqueza.

No entanto, estes são mais obstáculos políticos do que problemas técnicos. Então, deixando de lado a questão de como realmente chegaríamos lá, vocês dois têm alguma ideia de como um imposto sobre a riqueza global poderia teoricamente funcionar na prática? Que tipo de futura instituição (ou instituições) vocês imaginam que seria necessário para administrá-lo?

CC- Embora não exista uma autoridade fiscal global central, há maneiras dos Estados-nação chegarem a um acordo sobre políticas paralelas. Por exemplo, acabamos de ver 136 países se reunirem e aprovarem um tratado criando um imposto de renda mínimo corporativo global de 15%. Uma vez implementado, isto desencorajará as corporações multinacionais de colocarem os países uns contra os outros em uma corrida para baixar os impostos.

É difícil imaginar países individuais cedendo a uma autoridade tributária global (tente conseguir isso através do Senado dos Estados Unidos!), mas com a crescente pressão global para enfrentar a desigualdade extrema e a evasão fiscal bilionária, você poderia imaginar um processo semelhante ao que levou ao imposto mínimo corporativo global. Um tratado semelhante poderia unificar os países para tributar, em conjunto, concentrações extremas de riqueza e diminuir o abismo entre a riqueza e o poder dos bilionários. O mesmo acordo fiscal internacional deveria fechar o sistema de riqueza oculta, dificultando para a classe bilionária esconder a riqueza sequestrada em trusts, paraísos fiscais, offshore e empresas fantasmas.

Fonte: Jacobin Brasil
Texto: Luke Savage
Tradução: Sofia Schurig
Data original da publicação: 03/02/2022

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